quinta-feira, 1 de maio de 2014

Aguenta Coração

    Prêntice/Ed Wilson/Paulo Sérgio Valle


Coração, diz pra mim
Porque é que fico sempre desse jeito
Coração, não faz assim
Você se apaixona e a dor é no meu peito

Pra quê que você foi se entregar
Se na verdade eu só queria uma aventura
Por que você não para de sonhar?
Era um desejo e nada mais

E agora o que é que eu faço
Pra esquecer tanta doçura
Isso ainda vai virar loucura
Não é justo entrar na minha vida
Não é certo não deixar saída
Não é não

Agora aguenta coração
Já que inventou essa paixão
Eu te falei que eu tinha medo
Amar não é nenhum brinquedo

Agora aguenta coração
Você não tem mais salvação
Você apronta e esquece que você sou eu

Música que abria o então LP de José Augusto lançado em 1990.

domingo, 27 de abril de 2014

Oswald de Andrade


Pronominais

" Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro "

O Gramático 

" Os negros discutiam
Que o cavalo sipantou
Mas o que mais sabia
Disse que era
Sipantarrou "

Vício na Fala 

" Pra dizerem milho dizem mio
Para melhor dizem mió
Para pior pió
Para telha dizem teia
Para telhado dizem teiado
E vão fazendo telhados "

Amor

" humor "



quinta-feira, 17 de abril de 2014

Pra Rua Me Levar

     Ana Carolina/Totonho Villeroy

Não vou viver
Como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho onde eu vou
Às vezes ando só trocando passos com a solidão
Momentos que são meus e que não abro mão

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você

É, mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas talvez você nem queira ouvir

Música do CD " Estampado ", lançado em 2003.

Encostar na Tua

        Ana Carolina

Eu quero te roubar pra mim
Eu que não sei pedir nada
Meu caminho é meio perdido 
Mas que perder seja o melhor destino

Agora não vou mais mudar
Minha procura por si só
Já era o que eu queria achar
Quando você chama meu nome
Eu que também não sei aonde estou
Pra mim que tudo era saudade
Agora seja lá o que for

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

E saiba que forte eu sei chegar
Mesmo se eu perder o rumo
E saiba que forte eu sei chegar
Se for preciso eu sumo

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

Música do CD " Estampado ", lançado em 2003.

Travessia

            Frei Betto

Lá vamos nós, ávidos pelos feriados que se avizinham, na busca frenética da casa de praia, do sítio, do hotel, da montanha, um lugar que nos distancie da cidade e nos faça merecer descanso, ausência de agenda de trabalho, telefonemas, dificuldades e inseguranças. Tudo cessa. A Bolsa de Valores, as intrigas políticas, o relógio que escraviza. Ainda que estrada durma sob nossos pneus imóveis e os ônibus viajem entupidos e os aeroportos se transformem numa feira oriental, vale a ilusão de que haverá sol, as crianças se comportarão como anjos, não faltarão a mesa farta e os copos repletos. Sobretudo paz, fruto espiritual que insistimos em procurar alhures.

Nada mais profano em nossa sociedade que a Semana Santa, exceto o Carnaval. Eis a Modernidade iconoclasta, dessacralizando hábitos e calendários. Outrora, não havia janelas eletrônicas e as novelas eram transmitidas ao vivo nas ruas atulhadas de romeiros e procissões. Na igreja, a cerimônia do lava-pés sobressaindo-se à instituição da eucaristia. Na Sexta-Feira da Paixão, a música clássica das rádios compungidas, as imagens cobertas de roxo, o Senhor morto desfilando sobre os nossos pecados. Jejum e abstinência para uns, peixes e crustáceos para os mais abastados. No sábado, a espera da noite de Aleluia, que resgatava a alegria da Páscoa. Jesus ressuscitou! Domingo de missa alva e o alívio por saber que Ele venceu a morte.

Páscoa significa " passagem ", da opressão à libertação (a travessia do Mar Vermelho, no Êxodo) e da morte à vida (Jesus). Ainda que nada disso diga respeito ao nosso universo pessoal, tão centrado no próprio umbigo, orbitando na tríade família-trabalho-consumo, somos trespassados pela expectativa de uma travessia. Misteriosa espera de algo ou alguém que nos conduza da mediocridade ao meritório, do vazio à plenitude, da rotina ao sentido, do desencanto ao fascínio. O anjo selou-nos com a fome de transcendência. No mais íntimo, sabemos que do lado de fora de nosso ser nada pode aplacar essa sede de plenitude, exceto o amor e o mergulho despojado no silêncio interior, lá onde um Outro resgata a nossa verdadeira identidade.

Um dia um homem peregrinou pela Palestina revelando o que Deus gostaria de nos dizer. Muitos não fizeram caso, a própria família desconfiou de que ficara louco e o poder vigente condenou-o à morte na cruz para que não perturbasse a ordem do Império. Foi crucificado. Em seguida, apareceu vivo a seus discípulos, que nos transmitiram a fé em sua ressurreição.

José Lezama Lima, autor do belo e enigmático Paradiso, fez-se cristão por causa dessa afirmação de Tertuliano: " O filho de Deus foi crucificado: não é vergonhoso porque é infame; o filho de Deus morreu: é ainda mais digno de fé porque é incrível; e depois de morto, ressuscitou: é verdade porque é impossível ".

E, para nós, é vergonhoso crucificar ambições que nos roubam de nós mesmos, acreditar no mistério que ultrapassa a razão e renascer à vida interior e à solidariedade que instaura justiça? O caminho se faz ao caminhar, preveniu-nos Antônio Machado. Talvez renascer no decorrer da vida seja mais atemorizador do que a própria morte. É o lamento de Fernando Pessoa: " Fui o que não sou ". A Páscoa sinaliza que ainda há tempo. Contudo, é preciso não ter medo de ficar descalço, como na Quinta-Feira Santa, e de atravessar a noite escura da Sexta-Feira da Paixão. Então, conheceremos a verdade e a  verdade nos libertará, assegura Aquele que é o paradigma.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Eu, caçador de mim...

(O adolescente em busca de identidade)
             Vanessa Canabarro Dios
 
Para que eu possa falar sobre a construção da identidade no adolescente é necessário que se discuta o conceito de adolescência. A adolescência não é uma fase, ou apenas uma passagem da vida infantil para a adulta. Para nós a adolescência é um momento em si. Não é passagem, não é uma fase, pois vistas como tal deixam de merecer nossa atenção, pois são passageiras... A adolescência é comumente vista por diversos autores da área como um período de turbulência e de crise. Contrapondo-se a esta visão, baseamo-nos na teoria sistêmica que trabalha com família para afirmar, ao invés de trazer crise e turbulência, pode ser promotora de mudanças e transformações no meio familiar. É uma oportunidade de crescimento que pode ser vivenciada por toda a família para que se repensem valores, regras, relações, comunicações, etc.
 
Essa possibilidade de mudança liberta o adolescente de rótulos rígidos e de mudanças preestabelecidas: o adolescente pode apresentar diversos comportamentos que venham a caracterizar a sua adolescência.
 
Talvez o mais importante a ser realçado é que existem diversas adolescências, pois não se pode determinar características básicas da adolescência pelas quais todos os adolescentes deveriam passar. Da mesma forma, a adolescência não pode ser limitada por uma faixa cronológica. Neste sentido, estamos falando de adolescências e não mais de adolescência. Reconhece-se a pluralidade da adolescência e não a sua universalidade. A adolescência, portanto, é definida por aquele que a olha e pela realidade externa, social, por tudo aquilo que está ao redor. A depender de quem olha pensa-se em uma adolescência diferente. As definições de adolescência, neste sentido, não são certas ou erradas. Apenas exemplificam um olhar específico para um lado do fenômeno adolescência. Sempre haverá adolescentes para se encaixarem em nossas definições. Porém, é preciso deixar claro que as definições podem rotular, estigmatizar e limitar a visão que temos da pessoa adolescente.
 
Nenhum fenômeno da adolescência pode ser visto de maneira estanque. Todas as transformações merecem ser observadas dentro de sua complexidade. Da mesma forma a construção da identidade do adolescente só é possível quando avaliada dentro de um contexto maior: a família, a escola, o grupo de pares.
 
O adolescente busca sua identidade por meio de dois processos aparentemente antagônicos: pertencer e individualizar. O comportamento de se individualizar está intrinsecamente relacionado ao de pertencer e vice-versa. Para que haja individuação é necessário que o adolescente sinta-se pertencendo a alguma coisa. Portanto, para que haja independência e para que se construa uma identidade, é fundamental que o adolescente esteja pertencendo a um grupos relacional.
 
Outro fator importante é que, quando se fala em identidade, deve-se ter claro que não só o adolescente busca sua identidade, mas a própria família precisa buscar. É necessária uma definição da família de pais de crianças, para a família de pais de adolescentes, estruturando uma nova fase para a família e uma nova identidade. Desta forma, tanto o adolescente, quanto a família sofrem inúmeras transformações. A família também precisa buscar uma nova identidade. É necessário redefinir padrões de relacionamento: mudança de pais de crianças, para pais de adolescentes...

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Amanhecer

      Gilvan de Oliveira/Fernando Brant


O sol chegou
nem licença pediu
me acordou
com um tapa de luz

Porta não há
que me possa abrigar
tô no tempo
o tempo é meu lar

Hora de levantar
hora de se lavar
hora de despertar
para o dia

Hora de alimentar para poder brincar
nós temos de enfrentar
mais um dia.

do CD O Negócio é Amar, de Anna Lemgruber, gravado em 1998.                   
 

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

O Último Discurso

                      Charles Chaplin

Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar - se possível - judeus, o gentio... negros... brancos...

Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a felicidade do próximo - não para o seu infortúnio. Por que havemos de odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover a todas as nossas necessidades.

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... E tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios... Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis.

Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.

A aviação e o rádio aproximaram-nos muito mais. A própria natureza dessas coisas é um apelo eloquente à bondade do homem... Um apelo à fraternidade universal... à união de todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhares de pessoas pelo mundo afora... Milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas... Vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera inocentes.

Aos que podem me ouvir eu digo: " não desespereis "! A desgraça que tem caído sobre nós não é mais do que produto da cobiça em agonia... Da amargura de homens que temem o avanço do progresso humano. Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem homens, a liberdade nunca perecerá.

Soldados! Não vos entregueis a esses brutais... que vos desprezam... Que vos escravizam... que arregimentam vossas vidas... Que ditam os vossos atos, as vossas ideias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como gado humano e que vos utilizam como bucha de canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar... Os que não se fazem amar e os inumanos! 

Soldados! Não batalheis pela escravidão! Lutai pela liberdade! No décimo sétimo capítulo de São Lucas está escrito que o Reino de Deus está dentro do homem. Não de um só homem ou grupo de homens, mas de todos os homens! Está em vós! Vós, o povo, tendes o poder - o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela... De fazê-la uma aventura maravilhosa. Portanto - em nome da democracia - usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo... Um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.

É pela promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder. Mas, só mistificam! Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais. Dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura de todos nós. Soldados! Em nome da democracia, unamo-nos!