sábado, 19 de julho de 2025

Primavera ao correr da máquina

Os primeiros calores da nova estação, tão antigos como um primeiro sopro. E que me faz não poder deixar de sorrir. Sem me olhar ao espelho, é um sorriso que tem a idiotice dos anjos.

Muito antes de vir a nova estação já havia o prenúncio: inesperadamente uma tepidez de vento, as primeiras doçuras do ar. Impossível! Impossível que essa doçura de ar não traga outras! Diz o coração se quebrando.

Impossível, diz em eco a mornidão ainda tão mordente e fresca da primavera. Impossível que esse ar não traga o amor do mundo! Repete o coração que parte sua secura crestada num sorriso. E nem sequer reconhece que já o trouxe, que aquilo é amor. Esse primeiro calor ainda fresco traz: tudo. Apenas isso, e indiviso: tudo.

E tudo é muito para um coração de repente enfraquecido que só suporta o menos, só pode querer o pouco a aos poucos. Sinto hoje, e também mordente, uma espécie de lembrança ainda vindoura do dia de hoje. E dizer que nunca, nunca dei isto que estou sentindo a ninguém e a nada. Dei a mim mesma? Só dei na medida em que a pungência do que é bom cabe dentro de nervos tão frágeis, de mortes tão suaves. Ah, como quero morrer. Nunca ainda experimentei morrer - que abertura de caminho tenho ainda à frente. Morrer terá a mesma pungência indivisível do bom. A quem darei a minha morte? Que será como os primeiros calores frescos de uma nova estação. Ah, como a dor é mais suportável e compreensível que essa promessa de frígida e líquida alegria da primavera. É com tal pudor que espero morrer: a pungência do bom. Mas nunca morrer antes de realmente morrer: pois é tão bom prolongar essa promessa. Quero prolongá-la com tal finura. Eu me banho, nutro-me da vida melhor e mais fina, pois nada é bom demais para me preparar para o instante dessa nova estação. Quero os melhores óleos e perfumes, quero a vida da melhor espécie, quero as esperas as mais delicadas, quero as melhores carnes finas e também as pesadas para comer, quero a quebra de minha carne em espírito e do espírito e do espírito se quebrando em carne, quero essas finas misturas - tudo o que secretamente me adestrará para aqueles primeiros momentos que virão. Iniciada, pressinto a mudança de estação. E desejo a vida mais cheia de um fruto enorme. Dentro desse fruto que em mim se prepara, dentro desse fruto que é suculento, há lugar para a mais leve das insônias que é a minha sabedoria de bicho acordado: um véu de alerteza, esperta apenas o bastante para apenas pressentir. Ah, pressentir é mais amenos do que o intolerável agudo do bom. E que eu não esqueça, nessa minha fina luta travada, que o mais difícil de se entender é a alegria. Que eu não esqueça que a subida mais escarpada, e mais à mercê dos ventos, é sorrir de alegria. E que por isso e aquilo é que menos tem cabido em mim: a delicadeza infinita da alegria. Pois quando me demoro demais nela e procuro me apoderar de sua levíssima vastidão, lágrimas de cansaço me vêm aos olhos: sou fraca diante da beleza do que existe e do que vai existir. E não consigo, nesse adestramento contínuo, me apoderar do primeiro regozijo da vida.

Conseguirei captar o regozijo infinitamente doce de morrer? Ah, como me inquieta não conseguir viver o melhor, e assim poder enfim morrer o melhor. Como me inquieta que alguém possa não compreender que morrerei numa ida para uma tonta felicidade de primavera. Mas não apressarei de um instante a vida dessa felicidade - pois esperá-la vivendo é a minha vigília de vestal. Dia e noite não deixo apagar-se a vela - para prolongá-la na melhor das esperas. Os primeiros calores da primavera... Mas isso é amor! A felicidade me deixa com um sorriso de filha. Estou toda bem penteada. Só que a espera quase já não cabe mais em mim. É tão bom que corro o risco de me ultrapassar, de vir a perder a minha primeira morte primaveril, e, no suor de tanta espera tépida, morrer antes. Por curiosidade, morrer antes: pois já quero saber como é a nova estação.

Mas vou esperar. Vou esperar comendo com delicadeza e recato e avidez controlada cada mínima migalha de tudo, quero tudo pois nada é bom demais para a minha morte que é a minha vida tão eterna que hoje mesmo ela já existe e já é.


Crônica de Clarice Lispector retirada do livro A Descoberta do Mundo, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1999.

A Candeia Viva (81)

 "Ninguém acende a candeia e a coloca debaixo do módio, mas no velador, e assim alumia a todos os que estão na casa." - Jesus. (MATEUS, 5:15)


Muitos aprendizes interpretaram semelhante palavras do Mestre como apelo à pregação sistemática, e desvairaram-se através de veementes discursos em toda parte. Outros admitiram que o Senhor lhes impunha a obrigação de violentar os vizinhos, através de propaganda compulsória da crença, segundo o ponto de vista que lhes é particular.

Em verdade o sermão edificante e o auxílio fraterno são indispensáveis na extensão dos benefícios divinos da fé.

Sem a palavra, é quase impossível a distribuição do conhecimento. Sem o amparo irmão, a fraternidade não se concretizará no mundo.

A assertiva de Jesus, todavia, atinge mais além.

Atentemos para o símbolo da candeia. A claridade na lâmpada consome força ou combustível.

Sem o sacrifício da energia ou do óleo não há luz.

Para nós, aqui, o material de manutenção é a possibilidade, o recurso, a vida.

Nossa existência é a candeia viva.

É um erro lamentável despender nossas forças, sem proveito para ninguém, sob a medida de nosso egoísmo, de nossa vaidade ou de nossa limitação pessoal.

Coloquemos nossas possibilidades ao dispor dos semelhantes.

Ninguém deve amealhar as vantagens da experiência terrestre somente para si. Cada espírito provisoriamente encarnado, no círculo humano, goza de imensas prerrogativas, quanto à difusão do bem, se persevera na observância do Amor Universal.

Prega, pois, as revelações do Alto, fazendo-as mais formosas e brilhantes em teus lábios; insta com parentes e amigos para que aceitem as verdades imperecíveis; mas não olvides que a candeia viva da iluminação espiritual é a perfeita imagem de ti mesmo.

Transforma as tuas energias em bondade e compreensão redentoras para toda gente, gastando, para isso, o óleo de tua boa-vontade, na renúncia e no sacrifício, e a tua vida, em Cristo, passará realmente a brilhar.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.

quarta-feira, 16 de julho de 2025

Brincar de Pensar

A arte de pensar sem riscos. Não fossem os caminhos de emoção a que leva o pensamento, pensar já teria sido catalogado como um dos modos de se divertir. Não se convidam amigos para o jogo por causa da cerimônia que se tem em pensar. O melhor modo é convidar apenas para uma visita, e, como quem não quer nada, pensa-se junto, no disfarçado das palavras.

Isso, enquanto jogo leve. Pois para pensar fundo - que é o grau máximo do hobby - é preciso estar sozinho. Porque entregar-se a pensar é uma grande emoção, e só se tem coragem de pensar na frente de outrem quando a confiança é grande a ponto de não haver constrangimento em usar, se necessário, a palavra outrem. Além do mais exige-se muito de quem nos assiste pensar: que tenha um coração grande, amor, carinho, e a experiência de também se ter dado ao pensar. Exige-se tanto de quem ouve as palavras e os silêncios - como se exigiria para sentir. Não, não é verdade. Para sentir exige-se mais.

Bom, mas, quanto a pensar como divertimento, a ausência de riscos o põe ao alcance de todos. Algum risco tem, é claro. Brinca-se e pode-se sair de coração pesado. Mas de um modo geral, uma vez tomados os cuidados intuitivos, não tem perigo.

Como hobby, apresenta a vantagem de ser por excelência transportável. Embora no seio do ar ainda seja melhor, segundo eu. Em certas da tarde, por exemplo, em que a casa cheia de luz mais parece esvaziada pela luz, enquanto a cidade inteira estremece trabalhando e só nós trabalhamos em casa mas ninguém sabe - nessas horas em que a dignidade se refaria se tivéssemos uma oficina de consertos ou uma sala de costuras - nessas horas: pensa-se. Assim: começa-se do ponto exato em que se estiver, mesmo que não seja de tarde; só de noite é que não aconselho.

Uma vez por exemplo - no tempo em que mandávamos roupa para lavar fora - eu estava fazendo o rol. Talvez por hábito de dar título ou por súbita vontade de ter caderno limpo como em escola, escrevi:  rol de... E foi nesse instante que a vontade de não ser séria chegou. Este é o primeiro sinal do animus brincandi, em matéria de pensar - como - hobby. E escrevi esperta: rol de sentimentos. O que eu queria dizer com isto tive que deixar para ver depois - outro sinal de se estar em caminho certo é o de não ficar aflita por não entender; a atitude deve ser: não se perde por esperar, não se perde por não entender.

Então comecei uma listinha de sentimentos dos quais não sei o nome. Se recebo um presente dado com carinho por pessoa de quem não gosto - como se chama o que sinto? A saudade que se tem de pessoa de quem a gente não gosta mais, essa mágoa e esse rancor - como se chama? Estar ocupada - e de repente parar por ter sido tomada por uma súbita desocupação desanuviadora e beata, como se uma luz de milagre tivesse entrado na sala: como se chama o que se sentiu?

Mas devo avisar. Às vezes começa-se a brincar de pensar, e eis que inesperadamente o brinquedo é que começa a brincar conosco. Não é bom. É apenas frutífero.


Crônica de Clarice Lispector retirada do livro A Descoberta do Mundo, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1999.

Quando Chorar

Há um tipo de choro bom e há outro ruim. O ruim é aquele em que as lágrimas correm sem parar e, no entanto, não dão alívio. Só esgotam e exaurem. Uma amiga perguntou-me, então, se não seria esse choro como o de uma criança com a angústia da fome. Era. Quando se está perto desse tipo de choro, é melhor procurar conter-se: não vai adiantar. É melhor tentar fazer-se de forte, e enfrentar. É difícil, mas ainda menos do que ir-se tornando exangue a ponto de empalidecer.

Mas nem sempre é necessário tornar-se forte. Temos que respeitar a nossa fraqueza. Então, são lágrimas suaves, de uma tristeza legítima à qual temos direito. Elas correm devagar e quando passam pelos lábios sente-se aquele gosto salgado, límpido, produto de nossa dor mais profunda.

Homem chorar comove. Ele, o lutador, reconheceu sua luta às vezes inútil. Respeito muito o home que chora. Eu já vi homem chorar.


Crônica de Clarice Lispector retirada do livro A Descoberta do Mundo, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 1999.

sábado, 12 de julho de 2025

Se Você Aparecer

 Nunca vi o amor

No formato que ele tem

Ele mesmo em si

Não é ninguém

Não tem pai nem mãe

Não tem filho nem avó

Ele é tão sozinho

Que dá dó


Ai, amor, não chore não

Penso muito em você

Posso até lhe dar a mão

Se você aparecer


Nunca vi o amor

E não é curiosidade

Gosto dele desde que nasci

Acho que é invisível

Só por discrição

Não é convencido

Isso não

Sei que ele tem sido

Muito bem lembrado

Sempre nessas horas

De aflição


Nunca vi o amor

Do jeitinho que ele é

Eu não sei se é homem

Ou se é mulher

Não sei se já tem

Ou terá um amor qualquer

Ou se está sozinho

Porque quer


Ai, amor, não chore não

Penso muito em você

Posso até lhe dar a mão

Se você aparecer

Nunca vi o amor


Música de Ná Ozzetti e Luiz Tatit gravada no CD De Lua lançado em 2024 pela Circus Produções Culturais e Fonográficas.

Corações Cevados (80)

 "Cevastes os vossos corações, como num dia de matança." - (TIAGO, 5:5.)


Pela prosperidade e aperfeiçoamento do mundo, trabalha o Sol, que é a suprema expressão da Divindade Vital no firmamento terrestre.

Colabora o verme na intimidade do solo, preparando ninho adequado às sementes.

Contribui a aragem, permutando o pólen das flores.

Esforça-se a água, incessantemente, entretendo a vida física e purificando-a.

Serve a árvore, florindo, frutificando e regenerando a atmosfera.

Coopera o animal, ajudando as realizações humanas, suando e morrendo para que haja vida normal no domínio da inteligência superior.

Indefectível lei de trabalho rege o Universo.

O movimento e a ordem, na constância dos benefícios, constituem-lhe as características essenciais.

Há, porém, milhões de pessoas que se sentem exoneradas da glória de servir.

Para semelhantes criaturas, em cujo cérebro a razão dorme embotada e vazia, trabalho significa degredo e humilhação, inferno e sofrimento. Perseguem as facilidades delituosas, com o mesmo instinto de novidades da mosca em busca de detritos. Conseguida a solução de ordem inferior que buscavam, circunscrevem as horas e as possibilidades ao desenfreado apego de si mesmas, imitando o poço de águas estagnadas que se envenena facilmente.

No fundo, são "corações cevados", de acordo com a feliz expressão do apóstolo. Criam teias densas de ódio e egoísmo, indiferença e vaidade, orgulho e indolência sobre si próprios, e gravitam para baixo. Descendo, descendo, pelas pesadas vibrações a que se acolhem, rolam vagarosamente para o seio das vidas inferiores, onde é natural que encontrem a exigência de muitos, que se aproveitam deles, à maneira do homem comum que se vale dos animais gordos para a matança.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.

domingo, 29 de junho de 2025

Um Homem Público

Até que ponto terá sido compreensível para ele mesmo o seu próprio ato? Mal posso imaginar o seu desarvoramento solitário. Quando um ato irracional provoca monstruoso eco, o homem provavelmente se sente quase inocentado diante daquilo que seu grito provocou: de vibração em vibração, o desabar da avalanche. A verdade ele mesmo não sabe, talvez nunca saiba, pois já se afogou sob os pretextos. Ele foi "pessoal", o que é crime num homem público. O sacrifício de um líder ou de um santo ou de um artista - que chegaram àquilo que são exatamente por terem sido pessoais - é o de não o serem mais. A cruz de um homem é esquecer-se de sua própria dor. É nesse esquecer-se que acontece então o fato mais essencialmente humano, aquele que faz de um homem a humanidade: a dor própria adquire uma vastidão em que os outros todos cabem e onde se abrigam, são compreendidos; pelo que há de amor na renúncia da própria dor, os quase mortos se levantam. O verdadeiro sentido de Cristo seria a imitação de Cristo. O próprio Cristo foi a imitação de Cristo.

O Brasil inteiro poderia ter subido através do sofrimento daquele homem, através do que ele em si mesmo sabia sobre o medo, a ambição, e sobre a própria tendência ao desatino. Assim como a transcendência da vontade de matar está em, por se conhecer esse abismo, impedir que os outros matem. Mas aquele homem público se restringiu a si mesmo. Da grandeza dos defeitos humanos ele fez defeitos pequenos. Criminoso por pequenez. Era homem a ser ajudado, não a ajudar.


Crônica de Clarice Lispector retirada do livro Para Não Esquecer, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 2020.

Conversa com filho

- Sabe, eu tinha vontade, mamãe, de experimentar às vezes ficar doido.

- Mas pra quê? (Eu sei, eu sei o que você vai dizer, sei porque em mim o meu bisavô deve ter dito o mesmo, eu sei que é através de quinze gerações que uma só pessoa se forma, e que essa pessoa futura me usou para me atravessar como a uma ponte e está usando meu filho e usará o filho de meu filho, assim como um pássaro pousado numa seta que vagarosamente avança.)

- Pra me libertar, assim eu ficava livre...

(Mas haverá a liberdade sem a prévia permissão da loucura. Nós ainda não podemos: somos apenas os gradativos passos dela, dessa pessoa que vem.)


Crônica de Clarice Lispector retirada do livro Para Não Esquecer, Editora Rocco, Rio de Janeiro, 2020.

sábado, 28 de junho de 2025

Conclusão (6)

Podemos dizer, de modo geral e simples, que o isolamento é a falta de companhia dos outros e que na solidão o indivíduo adota a si mesmo como companhia (independentemente de já possuir ou não outra companhia).

Quando uma pessoa diz que ficou sozinha (no isolamento), está indicando uma vivência que pode ter sido prazerosa ou não. Mas, quando afirma: senti solidão, está sempre dizendo que passou por uma experiência que, sob algum aspecto pelo menos, lhe foi desagradável.

Como já foi dito, o que desagrada, na solidão, é este procedimento costumeiro, que tem a pessoa humana, de ficar escarafunchando a sua própria vida para se criticar. E, como isso é expressão de sua finitude, jamais terá um ponto final.

Consequentemente, é ilusório supor que em algum momento de sua vida o homem se encontrará num estado de alma paradisíaco em que não encontrará pelo menos alguns instantes de solidão. Neste caso, a solução do problema consiste em prevenir ou atenuar seu aguçamento e saber como conviver com ela nos momentos de crise.

Para alcançar este objetivo, o indivíduo pode se utilizar dos expedientes mais variados: fugir do ensimesmamento, dedicar-se a atividades úteis, procurar o diálogo com outras pessoas e com Deus etc. Entretanto, a solução que parece mais eficaz consiste no indivíduo realizar em si mesmo um trabalho de aperfeiçoamento pessoal, tornando-se mais coerente consigo. Crescendo, assim, em autenticidade, elevar-se-á inevitavelmente a sua autoestima. E gostando de si, tornará a sua companhia agradável e compensadora para si mesmo.


Texto de Franz Victor Rúdio retirado do livro Compreensão Humana e Ajuda ao Outro, Editora Vozes, Petrópolis, 1991.

Conferência de abertura do II Encontro de Psicologia do Vale do Paraíba, realizado na Faculdade Salesiana de Filosofia, Ciências e Letras de Lorena, São Paulo. 

Sigamos a Paz (79)

 "Busque a paz e siga-a." - Pedro. (I PEDRO, 3:11.)


Há muita gente que busca a paz; raras pessoas, porém, tentam segui-la.

Companheiros existem que desejam a tranquilidade por todos os meios e suspiram por ela, situando-a em diversas posições da vida, contudo, expulsam-na de si mesmos, tão logo lhes confere o Senhor as dádivas solicitadas.

Esse pede a fortuna material, acreditando seja a portadora da paz ambicionada, todavia, com o aparecimento do dinheiro farto, tortura-se em mil problemas, por não saber distribuir, ajudar, administrar e gastar com simplicidade.

Outro roga a bênção do casamento, mas, quando o Céu lha concede, não sabe ser irmão da companheira que o Pai lhe confiou, perdendo-se através das exasperações de toda sorte.

Outro, ainda, reclama títulos especiais de confiança em expressivas tarefas de utilidade pública, mas, em se vendo honrado com a popularidade e com a expectativa de muitos, repele as bênçãos do trabalho e recua espavorido.

Paz não é indolência do corpo. É saúde e alegria do espírito.

Se é verdade que toda criatura a busca, a seu modo, é imperioso reconhecer, no entanto, que a paz legítima resulta do equilíbrio entre os nossos desejos e os propósitos do Senhor, na posição em que nos encontramos.

Recebido o trabalho que a Confiança Celeste nos permite efetuar, é imprescindível saibamos usar a oportunidade em favor de nossa elevação e aprimoramento.

Disse Pedro - "Busque a paz e siga-a."

Todavia, não existe tranquilidade real sem Cristo em nós, dentro de qualquer situação em que estejamos situados, e a fórmula de integração da nossa alma com Jesus é invariável: - "Negue cada um a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me." Sem essa adaptação do nosso esforço de aprendizes humanos ao impulso renovador do Mestre Divino, ao invés de paz, teremos sempre renovada guerra, dentro do coração.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.