domingo, 5 de março de 2023

Sobreviverás

Multimilenária questão perturbadora, ela permanece na ceifa dos corpos, espalhando angústias, mutilando aspirações, levando ao desvario.

Muitas vezes, paradoxal, adentra-se no lar e rouba o ser saudável, deixando o enfermo; recolhe o jovem, olvidando o ancião, sem qualquer respeito pelas afeições e anelos humanos.

Sorrateira, decepa alegrias, ou violenta, interrompe os planos de vida, assinalando sua passagem com o luto e a dor.

Para entendê-la, surgiram correntes filosóficas que se multiplicaram, debatendo sua realidade, sem conclusão definitiva.

A morte continua, apesar das admiráveis conquistas do pensamento e da inteligência, ameaçando os seres e assinalando-os com os ferretes da frustração, quando se acerca e toma nas mãos alguém que aspirava a continuar na vida física.

Em mecanismos escapistas, a sociedade vestiu-a de aparatos e adornou-a de rituais, em vãs tentativas de modificar-lhe o impacto ou diminuir-lhe o choque.

Solenidades e cerimoniais, longos quão inúteis, são apresentados para anular-lhe o efeito, ou servirem de recurso consolador em memória daqueles que foram arrebatados.

A morte, no entanto, dispensa todas as conceituações pessimistas dos que a consideram como o fim da vida, bem assim as roupagens com que procuram disfarçá-la, brindando com regalias os que seguem na sua barca.

Morrer é somente interromper o ciclo biológico, permanecendo na vida.

O Espírito, que vitaliza a matéria, preexiste e sobrevive a ela, sendo-lhe a causa, a força que a aciona e lhe dá espontaneidade.

A sobrevivência do ser à disjunção molecular pela morte é incontestável.

Em toda parte, e em tudo, ocorrem transformações sem aniquilamento. Da mesma forma, o ser humano, enquanto sua indumentária carnal se modifica sob a ação da adaga da morte, prossegue no rumo do Grande Lar de onde veio.

Pensa com frequência no fenômeno da morte, a fim de te habituares com a ideia e não seres surpreendido, quando a depares em alguém amado ou a enfrentes.

Fatalidade biológica, ela virá, hoje ou mais tarde, e terás que te submeteres ao seu imperativo.

Vive de tal forma, que a qualquer momento te encontres em condições de aceitar-lhe a presença.

A morte liberta aquele que está encarcerado no corpo, cuja existência digna credencia-o à felicidade.

Da mesma forma, conserva aprisionado quem se deixou intoxicar pelos vapores da delinquência, derrapando no crime e na insensatez.

Cada qual sobrevive ao corpo conforme nele se conduziu.

Desse modo, a plenitude futura deve ser exercitada desde a viagem carnal, mediante a conduta mental, moral e vivencial a que se entrega o indivíduo.

Não temas a morte, nem lamentes os que partiram.

Evita a rebeldia e a mágoa diante dela, considerando que somente há vida, embora em níveis vibratórios diferentes e faixas diferenciadas de evolução.

Recorda que o momento culminante da vida de Jesus Cristo foi o da Sua ressurreição, somente possível porque, antes, houve a morte.

Assim, vive, cada instante, libertando-te das paixões primitivas, até ocorrer a tua morte, certo, porém, de que sobreviverás


Retirado do livro Momentos Enriquecedores; Divaldo Franco pelo Espírito Joanna de Ângelis, Livraria Espírita Alvorada Editora, Salvador, 2ª Edição, 2015.

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