sábado, 10 de outubro de 2020

A Religião e o Indivíduo

 O conceito de Freud quanto à religião, afirmando que ela é, por si, uma neurose compulsiva, exprime uma reação dogmática negativa, absurda.

A religião oferece métodos de integração da consciência individual e coletiva na Realidade Cósmica, como opção realizadora para o homem mediante a conquista de objetivos mais elevados.

Tivesse razão o nobre psicanalista vienense e se poderia afirmar também que a ausência dela, por si mesma, seria igualmente, o resultado de uma compulsão neurótica.

Não é a religião que impõe freio, dependência, fuga à liberdade e à capacidade de o homem ser responsável. Porém, os esquemas propostos por alguns religiosos, que elaboram doutrinas castradoras, que proíbem, impõem, cassam os direitos dos seus fiéis, aprisionando-os na urdidura dos seus limites.

Da mesma forma que o homem busca a fé religiosa como processo de certeza, de segurança, o faz em relação à ciência, nela procurando refúgio, apoio à sua fragilidade, proteção ao seu estado infantil.

A religião propicia amadurecimento psicológico, graças às propostas desafiadoras com que se apresenta.

O crente que se conscientiza dos postulados religiosos que abraça, entrega-se a uma dinâmica de maturidade e realização que o propele a conquistas novas: ampliação das aptidões, capacidade de amar, força de trabalho, alegria na luta, compensação emocional diante da dor, espírito de combatividade, calma nas atitudes...

A ansiedade cede-lhe passo à harmonia interior, e, sem transferir responsabilidades para Deus, confia no futuro e no seu poder de triunfo.

Há indivíduos que se entregam à vontade de Deus, porque resolvem acomodar-se, fugindo à responsabilidade dos acontecimentos que lhes cumpre conduzir. Este é, sem dúvida, um estado de alienação neurótica.

Sucessos e fracassos, mais insucessos certamente, lhes ocorrem porque, dizem, Deus assim o quer, quando tudo os convida à realização dinâmica e produtiva do bem com saldos favoráveis para a sua realização.

Outros existem, que permanecem aguardando milagres capazes de lhes alterar o destino, sem a contribuição do seu esforço.

Diversos, portadores de sentimentos de culpa, buscam a fuga religiosa como processo escapista para o enfrentamento com a consciência.

Não falta, da mesma forma, quem procure transferir suas responsabilidades para Deus, utilizando-se do processo infantil de ser cuidado por alguém...

Esses crentes são portadores de conflitos, sem dúvida, mas a culpa não é da religião que abraçam, e sim deles próprios.

A religião deve possuir recursos terapêuticos de otimismo, de afirmação para o indivíduo e de identificação pessoal com a vida.

Não se impondo a ninguém, ajuda a discernir quais as melhores metas existenciais e como consegui-las.

Apoiando-se no raciocínio, liberta o homem do totens e tabus atávicos, facilmente aplicando-lhe as regras éticas de conduta que o tornam seguro e calmo no processo de crescimento íntimo.

Abandonando a ideia de um Deus-homem ou um homem-Deus, o crente assimila o conteúdo da definição do Dr. Paul Tillich, célebre religioso contemporâneo: "É tão ateu afirmar a existência de Deus, como negá-lo. Deus é o próprio ser, não um ser."

A crença em Deus é, também, uma forma de dar sentido, dar significado à vida. Desse modo, a atitude religiosa é uma maneira de o homem encontrar motivos superiores para viver, para dignificar a vida e até mesmo para dar a existência por eles, qual ocorre em outras áreas do comportamento humano.

A religião é também responsável por inúmeros impulsos criativos e realizadores, o que a torna essencial à vida.


Texto retirado do livro Momentos de Iluminação, Divaldo Franco pelo espírito Joanna de Ângelis, Livraria Espírita Alvorada Editora, Salvador, 4ª edição, 2015.

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

A Periferia e o Centro

 O berço da Modernidade talvez resida, não no Renascimento italiano ou na Reforma protestante, e sim, na aventura marítima de Cristóvão Colombo, desembarcando no Novo Mundo em 12 de outubro de 1492. A chegada das caravelas espanholas ao nosso continente alterou profundamente a vida e a história dos povos que aqui viviam; astecas, maias, quechuas e aymaras. Contudo, assim como o corruptor faz o corrupto e a mentira instaura o mentiroso, o efeito da conquista mudou radicalmente o perfil do conquistador.

Até 1492 as histórias dos povos eram regionais. Nenhum povo trazia a experiência da mundialidade da História. Quando muito, conhecia expansões mediterrâneas e asiáticas, que, no entanto, não tornava gregos, romanos ou mongóis centro de um orbe inculturado pelo dominador. Ao quebrar, no século 15, as barreiras que lhe haviam sido impostas pelo domínio muçulmano desde 711, a Península Ibérica impregna a Europa da consciência de ser o centro do espaço mundial. Os portugueses lançam a ponte entre o continente europeu e a Ásia oriental, enquanto os espanhóis estendem o arco que se abre da América às Filipinas.

A centralidade europeia, instaurada em 1492, induz o conquistador a confundir sua particularidade com a universalidade. Já não se admitem fenômenos como o deslocamento do polo cultural da dominação grega, que se transfere do centro para a periferia - da Academia de Atenas para a Biblioteca de Alexandria - ou a pluralidade religiosa do império romano, tolerante com as crenças judaicas. Agora, o conquistador se julga modelo e modelador. "Europeu" torna-se sinônimo de humano e civilizado, enquanto os habitantes da periferia, por não residirem no centro, são tidos como seres inferiores, cuja salvação depende da submissão. Suprime-se, assim, a diversidade planetária. A partir de então, colonialismo e neocolonialismo fortalecem vínculos de dependência que nos fazem habitantes de um mundo que se define Terceiro em relação ao Primeiro...

Passados 500 anos, os povos da "periferia" americana tomam consciência de seu atávico mimetismo, ao mesmo tempo que empreendem a luta pelo resgate de sua identidade. Indígenas e negros descobrem-se, agora,  com os próprios olhos, talvez estranhando esses brancos que afagam gatos e cães e pensam que têm um corpo que lhes oprime a alma, sem consciência de que são um corpo pleno de espírito. E, do outro lado do oceano, o "centro" se dá conta de que não é homogêneo. A liberdade traz à tona a diversidade de raças e etnias, religiões e nações, que exigem espaço e reconhecimento próprios. À porta de sua integração a Europa se desmembra e seus países se desintegram. E se pergunta se foi mesmo um genovês instruído em Portugal e financiado pela Espanha quem "descobriu" a América, convencido de que chegara às costas da Ásia...


Texto de Frei Betto retirado do livro Cotidiano & Mistério, Editora Olho D'água, 2ª Edição, São Paulo, 2003.

terça-feira, 6 de outubro de 2020

Ícaro

Que nem um Ícaro
Aquele herói que se iludiu
Com o sol e a quem o sol sorriu
E então caiu no mar

Pois foi dos píncaros
Que aquele anjo do céu surgiu
Aquele anjo, aquele ardil
Que eu não quis evitar

Vertical, direto, certo e reto
Na minha direção
Seta absoluta que caiu do céu
No meu coração

Música de Fred Martins e Marcelo Diniz gravada por Carlos Navas em seu CD Tanto Silêncio - Acústico, lançado em 2003.

Si mis manos pudieran deshojar

Yo pronuncio tu nombre
en las noches oscuras,
cuando vienen los astros
a beber en la luna
y duermen los ramajes
de las frondas ocultas.
Y yo me siento hueco
de pasión y de música.
Loco reloj que canta
muertas horas antiguas.

Yo pronuncio tu nombre,
en esta noche oscura,
y tu nombre me suena
más lejano que nunca.
Más lejano que todas las estrellas
y más doliente que la mansa lluvia.

?Te querré como entonces
alguna vez? ?Qué culpa
tiene mi corazon?
Si la niebla se esfuma,
?qué otra pasión me espera?
?Será tranquila y pura?
!!Si mis dedos pudieran
deshojar a la luna!!

Poema de Garcia Lorca retirado do livro Obra Poética Completa, Editora Martins Fontes/Editora Universidade de Brasília, 1989.

domingo, 4 de outubro de 2020

O Juiz

 Foi em pleno julgamento do filho do Prefeito que o Juiz teve um ataque cardíaco e virou presunto.

Com o julgamento adiado, o Prefeito não se conteve:

- Justo agora o desgraçado teve que empacotar! Gastei uma dinheirama para garantir a inocência do meu filho e o sujeito desmonta daquele jeito!

E a pequena cidade estava em véspera de festa. A comemoração da emancipação era no fim-de-semana. Até mesmo um futebolzinho estava programado para o domingo. Era contra a cidade vizinha, um verdadeiro clássico! Mas agora o Prefeito estava preocupado, seu filho teria que ser libertado antes da comemoração, uma questão política. Um novo Juiz chegaria nos próximos dias e o Prefeito teria que usar do mesmo procedimento.

- Será que vai ser fácil comprar o homem? falou o Prefeito, passando a mão pelo farto bigode.

Dois dias antes da festa o Juiz apareceu. O Prefeito na estação rodoviária foi recebê-lo:

- O senhor é o Juiz?

- Sou sim, senhor. Estou um pouco cansado da viagem, mas estarei pronto para atuar.

- Ótimo, seu Juiz, ótimo!

No caminho até o hotel, o Prefeito explicou a situação ao Juiz e de cara foi logo oferecendo o dinheiro. O Juiz ficou sem entender, quis explicar, tentou dizer algo, mas o Prefeito não permitiu:

- O dobro, seu Juiz, o dobro!

Era muito dinheiro, o Juiz não resistiu:

- Pagamento imediato?

O Prefeito limpou os cofres da Prefeitura e conseguiu o dinheiro. O Juiz ainda teve a petulância de conferir:

- Está certo, seu Prefeito! Então está combinado. Pode ficar tranquilo.

Na manhã seguinte, o Juiz acordou cedinho. Tomou o primeiro ônibus e desapareceu do mapa.

Naquele mesmo dia chegava à cidade o Juiz de Direito. Na Prefeitura, encontrou-se com o Prefeito.

- Senhor Prefeito? Sou o Juiz.

- Como vai o senhor? Não o esperava tão cedo. O jogo de futebol é só no domingo!

- Futebol? Que futebol?

- Uai, o senhor não veio apitar o clássico de domingo?!


Crônica de Alexandre Azevedo retirado do livro Que Azar, Godofredo!, Atual Editora, Série Transas e Tramas, São Paulo, 13ª Edição, 1989.

sábado, 3 de outubro de 2020

Recorre à Meditação

 O homem que busca a realização pessoal, inevitavelmente é impelido à interiorização.

Seu pensamento deve manter firmeza no ideal que o fascina, e a fé, de que logrará o êxito, impulsiona-o a não se intimidar diante dos impedimentos que o assaltam na execução do programa ao qual se propõe.

A meditação torna-se-lhe o meio eficaz para disciplinar a vontade, exercitando a paciência com que vencerá cada dia as tendências inferiores nas quais se agrilhoa.

Meditar é uma necessidade imperiosa que se impõe antes de qualquer realização.

Com essa atitude, acalma-se a emoção e aclara-se o discernimento, harmonizando-se os sentimentos.

Não se torna indispensável que haja uma alienação, em fuga dos compromissos que lhe cumpre atender, em face das responsabilidades humanas e sociais. Mas, que reserve alguns espaços mentais e de tempo, a fim de lograr o cometimento.

Começa o teu treinamento, meditando diariamente num pensamento do Cristo, fixando-o pela repetição e aplicando-o na conduta através da ação.

Aumenta, a pouco e pouco, o tempo que lhe dediques, treinando o inquieto corcel mental e aquietando o corpo desacostumado.

Sensações e continuadas comichões que surgem, atende-as com calma, a mente ligada à ideia central, até conseguires superá-las.

A meditação deve ser atenta, mas não tensa, rígida.

Concentra-te, assentado comodamente, não porém, o suficiente para amolentar-te e  conduzir-te ao sono.

Envida esforços para vencer os desejos inferiores e as más inclinações.

Escolhe um lugar asseado, agradável, se possível, que se te faça habitual, enriquecendo-lhe a psicosfera com a qualidade superior dos teus anelos.

Reserva-te uma hora calma, em que estejas repousado.

Invade o desconhecido país da tua mente, a princípio reflexionando sem censurar, nem julgar, qual observador equilibrado diante de acontecimentos que não pode evitar.

Respira, calmamente, sentindo o ar que te abençoa a vida.

Procura a companhia de pessoas moralmente sadias e sábias, que te harmonizem.

Dias haverá mais difíceis para o exercício. O treinamento, entretanto, se responsabilizará pelos resultados eficazes.

Não lutes contra os pensamentos. Conquista-os com paciência.

Tão natural se te tornará a realização que diante de qualquer desafio ou problema, serás conduzido à ideia predominante em ti, portanto, a de tranquilidade, de discernimento.

Gandhi jejuava em paz, por vários dias, sem sofrer distúrbios mentais, porque se habituara à meditação, à qual se entregava nessas oportunidades.

E Jesus, durante os quarenta dias de jejum, manteve-se em ligação com o Pai, prenunciando o testemunho no Getsêmani, quando entregue, em meditação profunda, na qual orava, deixou-se arrastar pelas mãos da injustiça para o grande testemunho que viera oferecer à Humanidade.


Texto retirado do livro Momentos de Meditação; Divaldo Franco pelo espírito Joanna de Ângelis, Livraria Espírita Alvorada Editora, Salvador, 3ª Edição, 2014.

terça-feira, 29 de setembro de 2020

Os Urubus e Sabiás

 Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam... Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para o canto, decidiram que, mesmo contra a natureza eles haveriam de se tornar grandes cantores. E para isto fundaram escolas e importaram professores, gargarejaram do-ré-mi-fá, mandaram imprimir diplomas, e fizeram competições entre si, para ver quais deles seriam os mais importantes e teriam a permissão para mandar nos outros. Foi assim que eles organizaram concursos e se deram nomes pomposos, e o sonho de cada urubuzinho, instrutor em início de carreira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem todos chamam por Vossa Excelência. Tudo ia muito bem até que a doce tranquilidade da hierarquia dos urubus foi estremecida. A floresta foi invadida por bandos de pintassilgos tagarelas, que brincavam com os canários e faziam serenatas com os sabiás... Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa, eles convocaram pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito ' - Onde estão os documentos dos seus concursos? ' E as pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem. Não haviam passado por escolas de canto, porque o canto nascera com elas. E nunca apresentaram um diploma para provar que sabiam cantar, mas cantavam, simplesmente...

- Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um desrespeito à ordem.

E os urubus, em uníssono, expulsaram da floresta os passarinhos que cantavam sem alvarás..."

MORAL: Em terra de urubus diplomados não se ouve canto de sabiá.


Texto de Rubem Alves retirado do livro Estórias de quem gosta de ensinar, Cortez Editora, 10ª Edição, Coleção Polêmicas do Nosso Tempo, São Paulo, 1987.

domingo, 27 de setembro de 2020

Paulo Freire: a leitura do mundo

 "Ivo viu a uva", ensinavam os manuais de alfabetização. Mas o professor Paulo Freire com seu método de alfabetizar conscientizando, fez adultos e crianças, no Brasil e na Guiné-Bissau, na Índia e na Nicarágua, descobrirem que Ivo não viu apenas com os olhos. Viu também com a mente e se perguntou se uva é natureza ou cultura.

Ivo viu que a fruta não resulta do trabalho humano. É criação, é natureza. Paulo Freire ensinou a Ivo que semear uva é ação humana na e sobre a natureza. É a mão, multiferramenta, despertando as potencialidades do fruto. Assim como o próprio ser humano foi semeado pela natureza em anos e anos de evolução do Cosmo.

Colher a uva, esmagá-la e transformá-la em vinho é cultura, assinalou Paulo Freire. O trabalho humaniza a natureza e, ao realizá-lo, o homem e a mulher se humanizam. Trabalho que instaura o nó de relações, a vida social. Graças ao professor, que iniciou sua pedagogia revolucionária com trabalhadores do Sesi de Pernambuco, Ivo viu também que a uva é colhida por boias-frias, que ganham pouco, e comercializada por atravessadores, que ganham melhor.

Ivo aprendeu com Paulo que, mesmo sem ainda saber ler, ele não é uma pessoa ignorante. Antes de aprender as letras, Ivo sabia erguer uma casa, tijolo a tijolo. O médico, o advogado ou o dentista, com todo o seu estudo, não era capaz de construir como Ivo. Paulo Freire ensinou a Ivo que não existe ninguém mais culto que o outro, existem culturas paralelas, distintas, que se complementam na vida social.

Ivo viu a uva e Paulo mostrou-lhe os cachos, a parreira, a plantação inteira. Ensinou a Ivo que a leitura de um texto é tanto melhor compreendida quanto mais se insere o texto no contexto do autor e do leitor. É dessa relação dialógica entre texto e contexto que Ivo extrai o pretexto para agir. No início e no fim do aprendizado é a práxis de Ivo que importa. Práxis-teoria-práxis, num processo indutivo que torna o educando sujeito histórico.

Ivo viu a uva e não viu a ave que, de cima, enxerga a parreira e não vê a uva. O que Ivo vê é diferente do que vê a ave. Assim, Paulo Freire ensinou a Ivo um princípio fundamental da epistemologia: a cabeça pensa onde os pés pisam. O mundo desigual pode ser lido pela ótica do opressor ou pela ótica do oprimido. Resulta uma leitura tão diferente uma da outra como entre a visão de Ptolomeu, ao observar o sistema solar com os pés na Terra, e a de Copérnico, ao imaginar-se com os pés no Sol.

Agora Ivo vê a uva, a parreira e todas as relações sociais que fazem do fruto festa no cálice de vinho, mas já não vê Paulo Freire, que mergulhou no Amor na manhã de 2 de maio de 1997. Deixa-nos uma obra inestimável e um testemunho admirável de competência e coerência.

Paulo deveria estar em Cuba, onde receberia o título de Doutor Honoris Causa, da Universidade de Havana. Ao sentir dolorido seu coração que tanto amou, pediu que eu fosse representá-lo. De passagem marcada para Israel, não me foi possível atendê-lo. Contudo, antes de embarcar fui rezar com Nita, sua mulher, e os filhos, em torno de seu semblante tranquilo: Paulo via Deus.


Texto de Frei Betto.

sábado, 26 de setembro de 2020

A Porta de Entrada

O processo de reencarnação tem, no berço, a sua porta de entrada, aureolada pelas bênçãos do amor de Deus.

Aí prosseguem os compromissos e cuidados de todo um projeto que teve início antes da fecundação e que não se acabará quando ocorrer a morte do corpo.

Através desse admirável mecanismo - o do renascimento - o berço passa a ensejar aos recomeçantes da experiência carnal: crescimento intelecto-moral; reparação de faltas que lhes pesam na economia espiritual; refazimento do caminho, antes percorrido com insensatez; edificação de propósitos superiores no mundo íntimo; esquecimento do mal, a fim de adaptar-se ao bem; aprendizado das leis de amor que lhe vigem no imo, ainda desconsideradas; aproximação dos adversários para a ampliação da comunidade fraternal; conquista da família-provação ou missão, de acordo com os títulos de enobrecimento ou de débito que se possuam; testes de paciência, de modo a compreender-se a grandeza do tempo sem limite; desdobramento de recursos que jazem adormecidos, e que, diante dos ensinamentos humanos, desatam ramos carregados com os tesouros de sabedoria e de luz...

A porta de entrada é a resposta da Vida, em misericórdia aos náufragos da vida.

O espírito foi criado pelo Amor para a  glória estelar.

O trânsito pelas vias do progresso enseja-lhe a explosão de todos os germes que lhe dormem, inatos, aguardando o momento para a fecundação.

Cabe ao homem inteligente investir no berço os seus mais valiosos esforços, de maneira a formar uma família equilibrada e sábia.

Esta representa a célula fundamental do organismo social, que se torna a consequência natural desse conglomerado de unidades que se necessitam...

Em tal cometimento, o amor, o conhecimento das suas finalidades, a responsabilidade e o respeito entre os seus membros tornam-se de vital importância para que sejam logrados os objetivos para os quais é constituída.

Mais do que o lugar para a permuta de hormônios e prazeres, de ternuras e afetos dos cônjuges, é o reduto-santuário-escola para os filhos, que devem tornar-se a meta primeira da união conjugal.

Quando o lar se engrandece com a presença dos filhos, a família educada no bem, e esclarecida, programa, por automatismo, a sociedade e o futuro melhor da Humanidade...

Para que se consigam os resultados opimos, a educação desempenha papel de primacial importância, conscientizando os indivíduos sobre as razões pelas quais se encontram na Terra e preparando-os para  as realizações do lar, da família, seu pequeno mundo, preparatório do Mundo Maior.

Em uma manjedoura, que soube honrar, Jesus encontrou a porta de entrada para conquistar os corações e cantar as glórias do Pai, ensinando o inconfundível poema do amor que liberta e felicita.

Santifica, deste modo, essa porta, a fim de que esplenda, rica de luz, mimetizando, com a majestade da sua realização, todos quantos por ela passem em direção à vida física.

Enobrece o berço hoje, para que, antes do túmulo, amanhã, a criatura em jornada te bendiga.

Recorda, por fim, que, se o berço é a  excelente porta de entrada para a reencarnação, o túmulo é a porta de saída, pela desencarnação, após o que a tua consciência e a Divina Justiça te chamarão a contas.


Texto retirado do livro Momentos de Coragem; Divaldo Franco pelo espírito Joanna de Ângelis, Livraria Espírita Alvorada Editora, Salvador, 2014, 8ª Edição.

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Árvore dos Amigos

 Existem pessoas em nossas vidas que nos deixam felizes pelo simples fato de terem cruzado o nosso caminho. Algumas percorrem ao nosso lado, vendo muitas luas passarem, mas outras apenas vemos entre um passo e outro.

A todas elas chamamos de amigo. Há muitos tipos de amigos, talvez cada folha de uma árvore caracterize um deles. O primeiro que nasce do broto é o amigo pai e a amiga mãe que mostram o que é ver a vida. Depois vem o amigo irmão, com quem dividimos o nosso espaço para que ele floresça como nós. Passamos a conhecer toda a família de folhas, a qual respeitamos e desejamos o bem.

Mas, o destino nos apresenta outros amigos do peito, do coração, aqueles que são sinceros e verdadeiros, sabem quando não estamos bem e o que nos faz feliz...

Às vezes, um desses amigos do peito instala em nosso coração e, então, é chamado de amigo namorado, que dá brilho aos nossos olhos, música aos nossos lábios e pulos aos nossos pés. Mas há também aqueles amigos por um tempo, talvez umas férias, um dia ou uma hora... Eles costumam colocar muitos sorrisos em nossa face durante o tempo em que estamos por perto.

Falando em perto, encontramos aqueles que, ao contrário, não estão tão perto assim... Não podemos nos esquecer dos amigos distantes, aqueles que ficam nas pontas dos galhos, mas quando o vento sopra, sempre aparecem novamente entre uma folha ou outra.

O tempo passa, o verão se vai, o outono se aproxima e perdemos algumas de nossas folhas, algumas nascem na primavera, e outros permanecem por muitas estações. Mas o que nos deixa mais feliz é que as folhas que caíram continuam por perto alimentando a nossa raiz com alegria e lembranças dos momentos maravilhosos que cruzou o nosso caminho.

Desejo a vocês, folhas da minha árvore, Paz, Amor, Saúde, Sucesso, Prosperidade... Hoje e  sempre, porque simplesmente cada pessoa que passa em nossa vida é única e sempre deixa um pouco de si... E leva um pouco de nós! Há os que levam muito, mas não há os que não deixam nada. Esta é a maior responsabilidade de nossa vida, é a prova evidente de que duas almas não se encontram por acaso...


Autoria desconhecida...