sábado, 1 de abril de 2023

Lesão da Cruz

Ainda hoje, o cristão decidido encontra dificuldades de vária ordem, a fim de manter pulcro o ideal esposado.

Incompreendido, repentinamente se vê qual ilha solitária no tumulto das multidões aturdidas.

A sua conduta é vista sob suspeição e suas palavras padecem interpretação incorreta, que se deriva de má vontade geral.

São falseados os seus propósitos, e uma conspiração quase generalizada busca  bloquear-lhe os passos.

Mesmo entre os coidealistas, experimenta desafios na área do relacionamento fraternal.

Se é coerente com a mensagem de que se faz beneficiário, é tido por intransigente.

Se acata as opiniões diferentes, embora sem concordar com elas, é considerado pusilânime.

Se fala com sinceridade, expressando o que pensa, é chancelado de rude.

Se silencia e observa, é posto na conta de covarde ou de conivente.

Não há, por enquanto, lugar na Terra para o discípulo fiel do Evangelho.

As suas provas, decorrentes do passado, constituem-lhe espinho cravado no cerne da alma.

Ao seu lado, os acúleos-tentação afligem-no, ameaçando, a cada passo, a sua marcha ascensional.

A dor é-lhe companheira constante, mutilando-lhe as asas da ilusão, o que lhe resulta em benefícios excepcionais. Todavia, a sua é uma busca profunda, na qual são dispensáveis os atavios e engodos das fantasias.

Tido, às vezes, como masoquista, não foge do sofrimento, mas, igualmente, não o busca.

Encara-o com naturalidade, na condição de instrumento de libertação do ego, das emoções e paixões perturbadoras, que lhe constituem retentiva no processo de iluminação pessoal.

Afirmou Jesus, sem margem a interpretação dúbia: - Quem quiser vir comigo, tome a sua cruz e siga-me.

O convite descarta as habituais evasivas da comodidade e as justificativas do desculpismo tradicional.

A cruz, posta sobre os ombros e conduzida, dilacera as carnes em que se apoia.

Se for retirada antes do tempo e da chegada ao Calvário, a ulceração ficará exposta.

Geradora da ferida, é, também, a sua cicatrizadora, encarregada de recompor os tecidos dilacerados.

A lesão provocada pela cruz, mais tarde torna-se estrela a fulgir, apontando o rumo.

Nunca recues ante a dificuldade.

Não esmoreças, defrontando a dor.

Conduze, confiante, a tua cruz até o monte libertador.

Quem a deixa no caminho, buscando poupar-se ao sofrimento retornará a buscá-la, pois que, sem ela, ficará interrompido o acesso ao reino da consciência tranquila.

Diante de alguém sobrecarregado, sê-lhe cireneu, emulando-o à condução ditosa.

Não o iludas com a necessidade de liberar-se antes do tempo. Encoraja-o a seguir adiante.

Jesus, que não tinha qualquer dívida a ressarcir, sob o peso da cruz, aceitou a ajuda do estranho, no entanto levou-a, Ele próprio, ao topo da subida, onde a plantou, deixando-se nela imolar para ensinar-nos coragem e libertação.


Retirado do livro Momentos de Iluminação; Divaldo Franco pelo Espírito Joanna de Ângelis, Livraria Espírita Alvorada Editora, Salvador, 4ª Edição, 2015.

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