sábado, 26 de novembro de 2022

Ouvir com Atenção

    Uma das dificuldades, no inter-relacionamento pessoal, é constituída pela falta de cuidado nas conversações.

    As criatura, dominadas pelos conflitos, perdem, a pouco e pouco, a habilidade para bem ouvir.

    Todos desejam falar, atropeladamente, impondo ideias, discutindo temas não pensados, oferecendo informações sem substância, num afã de apresentar-se, de dominar a situação, de tornar-se o centro de interesse geral.

    Os resultados são os desastres nas relações humanas.

    Surgem, então, técnicas que preparam o homem para relacionar-se com o seu próximo; contudo, se ele não se capacita ao esforço de ouvir com serenidade, malogram as belas formulações.

    Ouvir é uma arte como outra qualquer que exige interesse e propõe cuidados.

    Pode-se ouvir, indiscriminadamente, ruídos, tumultos, sem assimilação de conteúdo.

    Os sons ferem os tímpanos, todavia a arte de ouvir as conversas impõe o respeito por quem está falando.

    Sem consideração pelo interlocutor, quaisquer assuntos perdem a importância, quando não geram polêmicas inúteis, desagradáveis.

    Ouve, sem tensão; mas, com atenção.

    Abre-te à conversação sincera, deixando que o outro fale, sem interrupção.

    Quando chegar a tua vez, sê conciso, claro e cortês.

    A palavra que abençoa, também pode ferir. Sê, pois, zeloso.

    Procura ouvir sem preconceito; porém, com respeito.

    O que ouças, deve ser digerido, a fim de ser bem assimilado.

    Evita ouvir, discutindo mentalmente, recusando-te, julgando, protestando.

    Dominado pelo emocional, perderás o melhor da palavra, confundindo o raciocínio.

    Ouve, desse modo, sem ansiedade, sem rebeldia interior.

    Quando não entendas o pensamento, pede para que seja repetido; se te não surge clara a ideia, propõe esclarecimento.

    O homem fala para melhor entender o seu próximo. Ouvindo-o com equilíbrio, pode dirimir os equívocos e aprender tudo quanto esteja ao alcance.

    Convidado a ouvir, despe-te dos pontos de vista a que te entregas, a fim de poderes absorver o conteúdo dos pensamentos que te sejam apresentados.

    Lentamente perceberás que, ouvindo, redescobrirás mil melodias, palavras e mensagens a que já não davas importância, perdidas no tumulto do que eliminaste por automatismo, deixando de escutá-las.

    Quem ouve bem, aprende, entesoura e renova-se, sabendo selecionar o que lhe é útil, daquilo que deve ser racionalmente dispensado.

    Ouve, portanto, sem perturbação, a fim de lograres precisão


Texto retirado do livro Momentos de Harmonia; Divaldo Franco pelo Espírito Joanna de Ângelis; Livraria Espírita Alvorada Editora, Salvador, 3ª Edição, 2014.

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Exageros/ Exagerado

 1.

No Polo Norte faz um frio enorme,

um frio polar,

que não é brincadeira.

Por isso, pra se esquentar,

o pinguim dorme 

dentro da geladeira.


2.

Noite escura.

Completo negrume.

Até parece que puseram fraldas

nos vaga-lumes.


3.

D. Pedro I resolveu subir

à montanha mais alta do mundo.

Tanto tempo demorou subindo,

que quando chegou lá em cima

já era D. Pedro II.


4.

Colombo o seu ovo afamado

pôs de pé. Eu, nem sentado.


5.

O homem olha o micróbio

pelo microscópio.

O micróbio olha o homem

pelo telescópio.


Amor da minha vida

Daqui até a eternidade

Nossos destinos foram traçados

Na maternidade


Paixão cruel desenfreada

Te trago mil rosas roubadas

Pra desculpar minhas mentiras

Minhas mancadas


Exagerado

Jogado aos teus pés

Eu sou mesmo exagerado

Adoro um amor inventado


Eu nunca mais vou respirar

Se você não me notar

Eu posso até morrer de fome

Se você não me amar


Que por você eu largo tudo

Vou mendigar, roubar, matar

Até nas coisas mais banais

Pra mim é tudo ou nada


Exagerado

Jogado aos teus pés

Eu sou mesmo exagerado

Adoro um amor inventado


Que por você eu largo tudo

Carreira, dinheiro, canudo

Até nas coisas mais banais

Pra mim é tudo ou nunca mais


Poema de José Paulo Paes retirado do livro Palavras de Encantamento, série Literatura em minha casa - Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.


Música Exagerado, de Leoni/ Cazuza/ Ezequiel Neves gravada no então 1º LP de Cazuza lançado pela Gravadora Som Livre em 1985; relançado posteriormente em CD.

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Ficção Científica

Depois de uma viagem

pelo espaço sideral,

o astronauta chegou

ao seu destino final:


Um planeta diferente

cujo em-cima estava em-baixo

e o atrás ficava na frente.


Um planeta tão estranho

que a sujeira era limpa

e a água tomava banho.


Um planeta mesmo louco

onde o muito era nada

e o tudo muito pouco.


Um planeta dos mais raros:

o seu ouro era de graça,

o lixo custava caro.


O astronauta não gostou

e foi-se embora. Quando

pensou estar muito longe,

viu-se outra vez chegando


num planeta onde, aliás,

o em-baixo ficava em-cima

e o frente estava por trás...


Poema de José Paulo Paes retirado do livro Palavras de Encantamento, da série Literatura em minha casa - Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Mistérios do Passado

 Quando Cabral o descobriu,

será que o Brasil sentiu frio?


Diz a História que os índios comeram o bispo Sardinha.

Mas como foi que eles conseguiram abrir a latinha?


Qual o mais velho, diga num segundo:

D. Pedro I ou D. Pedro II?


De que cor era mesmo (eu nunca decoro)

o cavalo branco do Marechal Deodoro?


Poema de José Paulo Paes retirado do livro Palavras de Encantamento, série Literatura em minha casa - Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.

terça-feira, 22 de novembro de 2022

Quem Eu Sou?/Sou Eu

 Eu às vezes não entendo!

As pessoas têm um jeito

de falar de todo mundo

que não deve ser direito.


Em cada lugar que eu vou,

na escola, na rua também,

ouço dizerem assim,

quando se fala de alguém:

- Você conhece Fulano,

que chegou de uma viagem?

- O pai dele é muito rico,

tem dois carros na garagem!

- E o Maneco, lá do clube?

Pensa que é rico também?

Precisa ver que horrível

é o tênis que ele tem!


Aí eu fico pensando

que isso não está bem.

As pessoas são quem são,

ou são o que elas têm?


Eu queria que comigo

fosse tudo diferente.

Se alguém pensasse em mim,

soubesse que eu sou gente.

Falasse do que eu penso,

lembrasse do que eu falo,

pensasse no que eu faço,

soubesse por que calo!


Porque eu não sou o que visto.

Eu sou do jeito que estou!

Não sou também o que eu tenho.

Eu sou mesmo quem eu sou!


Pedi pro sol me responder o que é o amor

Ele me falou é um grande fogo

Procurei nos búzios e tornei a perguntar

Eles me disseram o amor é um jogo

Lembrei que a lua tinha muito pra contar

Ela se abriu pra mim

Disse que o amor usa tantas fases

E uma luz que não tem fim


Eu pedi pro vento que soprasse o que é o amor

Ele garantiu é tempestade

Bandos de estrelas me contaram sem piscar

O amor é pura eternidade

Sem saber direito perguntei pro coração

Que sem medo respondeu

O amor é fogo, água, céu e terra

Sente o amor sou eu


Sou eu quem gera esse energia que conduz

Seu coração a essa estrada, essa luz

O amor é fogo, água, céu e terra

Sente o amor sou eu


Sou eu quem salva o teu caminho da ilusão

Eu que te consagro repetiu meu coração

O amor é fogo, água, céu e terra

Sente o amor sou eu


Poema de Pedro Bandeira retirado do livro Palavras de Encantamento, da série Literatura em minha casa - Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.


Música Sou Eu de Isolda e Eduardo Dusek gravada por Simone em seu CD de 1993. A canção deu título ao disco lançado pela Gravadora CBS, hoje Sony Music.

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Vai já pra dentro, menino!

 Vai já pra dentro, menino!

Vai já pra dentro estudar!

É sempre essa lengalenga

quando o que eu quero é brincar...


Eu sei que aprendo nos livros,

eu sei que aprendo no estudo,

mas o mundo é variado

e eu preciso saber tudo!


Há tanto pra conhecer,

há tanto pra explorar!

Basta os olhos abrir,

e com o ouvido escutar.


Aprende-se o tempo todo,

dentro, fora, pelo avesso,

começando pelo fim,

terminando no começo


Se me fecho lá em casa,

numa tarde de calor,

como eu vou ver uma abelha

a catar pólen na flor?


Como eu vou saber da chuva,

se eu nunca me molhar?

Como eu vou sentir o sol,

se eu nunca me queimar?


Como eu vou saber da terra,

se eu nunca me sujar?

Como eu vou saber da gentes,

sem aprender a gostar?


Quero ver com os meus olhos,

quero a vida até o fundo,

quero ter barro nos pés,

eu quero aprender o mundo!


Poema de Pedro Bandeira retirado do livro Palavras de Encantamento, da série Literatura em minha casa - Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.

domingo, 20 de novembro de 2022

Lições de Céu

 VÊNUS

Madrugadinha

Vênus machuca

o coração da gente

de solidão azul


CRESPÚSCULO

Na hora em que o dia

não é mais dia,

em que a noite

não é noite ainda,

tudo é magia

e o céu parece

veludo furta-cor

escorrendo

das mãos vazias.


ANÉIS DE SATURNO

Que os mortos viram fantasmas

todo mundo já sabe,

mas que vão namorar escondido

nos vãos dos anéis de Saturno,

por essa ninguém esperava.


AMIGO

No rumo certo do vento

amigo é nau de se chegar

em lugar azul.

Amigo é esquina

onde o tempo para

e a Terra não gira,

antes paira em doçura

contínua.

Oceano tramando sal,

mel inventando fruta,

no rumo certo do vento,

amigo é estrela sempre.


BURACO NEGRO

Essa coisa esquisita

que às vezes

a gente sente,

como se faltasse

um pedaço,

essa vontade que se tem

de não se sabe o quê,

esses abismos que nascem

repentinamente,

esses buracos negros do céu

dentro da alma da gente.


SONHO

Um dia os homens acordaram

e estava tudo diferente:

das armas atômicas nem sinal havia

e todos falavam a mesma língua,

falavam poesia.

Quem visse a Terra do alto

nem reconheceria,

eram campos e campos de trigo

e corações de puro mel.

E foi uma felicidade tamanha,

nos jornais nem um só crime,

que contando ninguém acreditaria.


Poema de Roseana Murray retirado do livro Palavras de Encantamento, série Literatura em minha casa, Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.

sábado, 19 de novembro de 2022

Porvir Inexorável

    O indivíduo senciente deve manter como objetivo primacial da existência física a conquista dos valores eternos. Não obstante a consideração pelas conquistas contemporâneas, torna-se-lhe indispensável a compreensão da transitoriedade desses recursos e realizações.

    O acúmulo de riquezas materiais proporciona-lhe conforto, não, porém, felicidade. Esta é decorrente natural do autoencontro responsável, graças ao qual se entrega à conquista de diferentes bens, por enquanto, desdenhados.

    Somente através da reencarnação, compreendida e aplicada à vivência lúcida, é que poderá considerar o vazio da existência corporal, período este para a aprendizagem iluminativa e libertadora.

    Assim considerada, a existência material deixa de ser sucessão de sofrimentos e incertezas para proporcionar os investimentos duradouros, que se transferem de uma para outra forma, no corpo ou além dele, porquanto, em qualquer circunstância, ninguém se apresentará fora da Vida.

    A vida física se caracteriza pela busca do prazer, no entanto, este sempre se expressa acompanhado de sofrimento. Isto, porque, o próprio prazer gera o medo da sua descontinuidade, o que se transforma em aflição.

    A manutenção do prazer estimula o egoísmo, a ambição, a arbitrariedade e seus sequazes criminosos.

    Cultivando com acendrado interesse a ignorância, o homem distrai-se no relacionamento com amigos; armazena joias e dinheiro, víveres e trajes; multiplica habitações e veículos, embora o seu corpo somente os possa usar um a um. Demais, advindo a morte, que é inevitável, vê-se constrangido a deixar tudo, levando apenas a si mesmo e com ele os atos impressos nos painéis da consciência.

    Ninguém te condena por seres previdente; porém, a tua consciência te reprocha a ganância.

    Pessoa alguma te fiscaliza a conduta gozadora; mas, a tua consciência te diz que isto não te basta.

    Deus não te proíbe fruir dos bens, nem da vida; todavia, tua consciência, apesar de anestesiada, vez que outra desperta, assinalando a tua ilusão...

    Descoberta a causa do sofrimento do senciente, que é a ignorância,o seu antídoto é, de logo, a sabedoria.

    Clareia-te, assim, com as luzes da reencarnação e saberás conduzir a vida sem apego, sem desconsideração, descobrindo-lhe o vazio do mediano e aplicando parte do teu tempo na preparação do teu provir eterno, que te espreita, e para o qual marchas inexoravelmente, quer o queiras ou não.


Texto retirado do livro Momentos de Felicidade; Divaldo Franco pelo Espírito Joanna de Ângelis, Livraria Espírita Alvorada Editora, Salvador, 5ª Edição, 2014.

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Segredinhos de Amor/Todas as cartas de amor são ridículas

Gosto muito de vocês,

muito mesmo,

mas não me peçam explicação,

pois não vai dar pra contar

o que vai morrer comigo,

o que já fechei no meu poço.


Vocês sabem como são 

os segredinhos de amor...

Todo mundo tem os seus

e pobre de quem não tem...


Sei, de fato,

entre amigos há sempre um pacto,

um elo belo,

mas não vale tal fato

pros segredinhos de amor.


Não, não é medo do ridículo.

Nem é o meu segredo um conflito.

Pode até ser coisa infantil

e até meio boba,

mas segredo é segredo, 

coisa guardada a medo

pra alegria e tortura

só da gente.


E em segredo é muito mais segredo

se for um segredinho de amor!


Todas as cartas de amor são

Ridículas.

Não seriam cartas de amor se não fossem

Ridículas.


Também escrevi em meu tempo cartas de amor,

Como as outras,

Ridículas


As cartas de amor, se há amor,

Têm de ser 

Ridículas.


Mas, afinal,

Só as criaturas que nunca escreveram

Cartas de amor

É que são

Ridículas.


Quem me dera no tempo em que escrevia

Sem dar por isso

Cartas de amor

Ridículas.


A verdade é que hoje

As minhas memórias

Dessas cartas de amor

É que são ridículas.


(Todas as palavras esdrúxulas,

Como os sentimentos esdrúxulos,

São naturalmente

Ridículas).


Poema de Elias José retirado do livro Palavras de Encantamento, da série Literatura em minha casa - Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.


Poema Todas as cartas de amor são ridículas, de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa, FTD Editora, São Paulo, 1992. 

quinta-feira, 17 de novembro de 2022

O medo do menino

 Que barulho estranho,

vem lá de fora,

vem lá de dentro?!...


Que barulho medonho

no forro,

no porão,

na cozinha,

ou na despensa!...


Será fantasma

ou alma penada?

Será bicho furioso

ou barulhinho de nada?


E o menino olha

na escura escada

e não vê nada.


E olha na vidraça

e uma sombra o ameaça.


Quem se esconde

Esconde onde?


Se vem alguém passo a passo

na rua deserta

o medo aumenta.

Passos de gente da casa

encolhe o medo.

Se somem vozes e passos

de gente da casa, 

no ato, no quarto,

vem o arrepio.


E o menino encolhe, 

fica todo enroladinho.

E se embrulha nas cobertas,

enfia a cabeça no travesseiro

e devagar, devagarinho,

sem segredo,

vem o sono

e some o medo.


Poema de Elias José retirado do livro Palavras de Encantamento, série Literatura em minha casa - Volume 1 - Poesias, Editora Moderna, São Paulo, 2001.