sábado, 15 de fevereiro de 2025

Discípulos (58)

 "E qualquer que não levar a sua cruz, e não vier após mim, não pode ser meu discípulo." - Jesus. (LUCAS, 14:27.)


Os círculos cristãos de todos os matizes permanecem repletos de estudantes que se classificam no discipulado de Jesus, com inexcedível entusiasmo verbal, como se a ligação legítima com o Mestre estivesse circunscrita a problema de palavras.

Na realidade, porém, o Evangelho não deixa dúvidas a esse respeito.

A vida de cada criatura consciente é um conjunto de deveres para consigo mesma, para com a família de corações que se agrupam em torno dos seus sentimentos e para com a Humanidade inteira.

E não é tão fácil desempenhar todas essas obrigações com aprovação plena das diretrizes evangélicas.

Imprescindível se faz eliminar as arestas do próprio temperamento, garantindo o equilíbrio que nos é particular, contribuir com eficiência em favor de quantos nos cercam o caminho, dando a cada um o que lhe pertence, e servir à comunidade, de cujo quadro fazemos parte.

Sem que nos retifiquemos, não corrigiremos o roteiro em que marchamos.

Árvores tortas não protejam imagens irrepreensíveis.

Se buscamos a sublimação com o Cristo, ouçamos os ensinamentos divinos. Para sermos discípulos dele é necessário nos disponhamos com firmeza a conduzir a cruz de nossos testemunhos de assimilação do bem, acompanhando-lhes os passos.

Aprendizes existem que levam consigo o madeiro das provas salvadoras, mas não seguem o Senhor por se confiarem à revolta através do endurecimento e da fuga.

Outros aparecem, seguindo o Mestre nas frases bem-feitas, mas não carregam a cruz que lhes toca, abandonando-a à porta de vizinhos e companheiros.

Dever e renovação.

Serviço e aprimoramento.

Ação e progresso.

Responsabilidade e crescimento espiritual.

Aceitação dos impositivos do bem e obediência aos padrões do Senhor.

Somente depois de semelhantes aquisições é que atingiremos a verdadeira comunhão com o Divino Mestre.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

Apóstolos (57)

 "Porque tenho para mim que Deus a nós, apóstolos, nos pôs por últimos, como condenados à morte; pois somos feitos espetáculo ao mundo, aos anjos e aos homens." - Paulo. (I CORÍNTIOS, 4:9.)


O apóstolo é o educador por excelência. Nele residem a improvisação de trabalho e o sacrifício de si mesmo para que a mente dos discípulos se transforme e se ilumine, rumo à esfera superior.

O legislador formula decretos que determinam o equilíbrio e a justiça na zona externa do campo social.

O administrador dispõe dos recursos materiais e humanos, acionando a máquina dos serviços terrestres.

O sacerdote ensina ao povo as maneiras da fé em manifestações primárias.

O artista embeleza o caminho da inteligência, acordando o coração para as mensagens edificantes que o mundo encerra em seu conteúdo de espiritualidade.

O cientista surpreende as realidades da Sabedoria Divina criadas para a evolução da criatura e revela-lhes a expressão visível ou perceptível ao conhecimento popular.

O pensador interroga, sondando os fenômenos passageiros.

O médico socorre a carne enfermiça.

O guerreiro disciplina a multidão e estabelece a ordem.

O operário é o ativo menestrel das formas, aperfeiçoando os vasos destinados à preservação da vida.

Os apóstolos, porém, são os condutores do espírito.

Em todas as grandes causas da Humanidade, são instituições vivas do exemplo revelador, respirando no mundo das causas e dos efeitos, oferecendo em si mesmos a essência do que ensinam, a verdade que demonstram e a claridade que acendem ao redor dos outros. Interferem na elaboração dos pensamentos dos sábios e dos ignorantes, dos ricos e dos pobres, dos grandes e dos humildes, renovando-lhes o modo de crer e de ser, a fim de que o mundo se engrandeça e se santifique. 

Nelas surge a equação dos fatos e das ideias, de que se constituem pioneiros ou defensores, através da doação total de si próprios a benefício de todos. Por isso, passam na Terra, trabalhando e lutando, sofrendo e crescendo sem descanso, com etapas numerosas pelas cruzes da incompreensão e da dor. 

Representando, em si, o fermento espiritual que leveda a massa do progresso e do aprimoramento, transitam no mundo, conforme a definição de Paulo de Tarso, como se estivessem colocados pela Providência Divina nos últimos lugares da experiência humana, à maneira de condenados a incessante sofrimento, pois neles estão condensadas a demonstração positiva do bem para o mundo, a possibilidade de atuação para os Espíritos Superiores e a fonte de benefícios imperecíveis para a Humanidade inteira.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

35 - 36 - 37: Três Mitos de Gênero

35. "PRESIDENTA" É UMA INVENÇÃO DA DILMA

A palavra "presidenta é usada em Português ao menos desde 1872. Foi usada por Machado de Assis em 1880, no romance Memórias Póstumas de Brás Cubas. E abonada no Vocabulário Ortográfico e Ortoépico da Língua Portuguesa, de Gonçalves Viana (Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1909)


36. GÊNERO = SEXO

"Gênero" é distinção gramatical; "sexo" é distinção semântica. Um nome do gênero masculino pode designar alguém do sexo feminino, como, por exemplo, "mulherão" (que, aliás, embora masculino, designa uma mulher extremamente feminina). Há nomes ("sobrecomuns") do gênero masculino que designam pessoas tanto do sexo masculino quanto do feminino (como o cônjuge, o apóstolo, o algoz). Também há nomes ("sobrecomuns") do gênero feminino que designam pessoas tanto do sexo masculino quanto do sexo feminino (como, por exemplo, a vítima, a testemunha, a pessoa). O gênero existe mesmo quando não há motivação sexual, como o gênero das coisas (mesa, casa, algodão, álcool...)


37. O GÊNERO DA PALAVRA "GRAMA" É MASCULINO

Não há razão para ensinar que o gênero da palavra "grama" é, obrigatoriamente, masculino. Diz-se hoje, também, "duzentas gramas", porque esse é o uso majoritário entre as pessoas cultas.


Texto de Francisco S. Borba; professor do Curso de pós-graduação em Linguística da UNESP - Campus de Araraquara e pesquisador 1A do CNPq.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

34. Diminutivo só serve "para diminuir"?

A definição usual da flexão em grau é a da categoria que indica, no substantivo, proporção menor ou maior ante um ponto de referência "normal".

Os graus aumentativo ou diminutivo podem ser assinalados por sufixos grudados ao substantivo (processo sintético: bonequinha, casarão) ou pela companhia de adjetivos (processo analítico: boneca pequena, casa grande). Mas a Língua admite sufixos aumentativos ou diminutivos não relacionados à ideia de tamanho, mas ao sentido afetivo ou pejorativo. Daí "sujeitinho covarde" e "amigão".

Usamos adjetivos com flexão típica do diminutivo, mas função superlativa: "bolsa cheíinha" é a  superlotada e "prato limpinho", o muito limpo. "Café quentinho" tem o máximo calor possível e "menino bonzinho" é um poço de bondade. A "cerveja geladinha" está no limite do congelamento.


Texto de Francisco S. Borba; professor do Curso de pós-graduação em Linguística da UNESP - Campus de Araraquara e pesquisador 1A do CNPq.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

33. O significado das palavras não muda

Em todas as Línguas, as palavras mudam de significado ao longo do tempo. "Folia" significava "loucura" no Português do século 16. Em Português antigo, "amigo" era o mesmo que "namorado" (em Francês, a tradução direta para ami também pode ser "namorado"). "Abrigo" vem do latim aprire, originalmente "estar exposto ao sol".


Texto de Francisco S. Borba; professor do Curso de pós-graduação em Linguística da UNESP - Campus de Araraquara e pesquisador 1A do CNPq.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

sábado, 25 de janeiro de 2025

Renasce Agora (56)

 "Aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus." - Jesus. (JOÃO, 3:3.)


A própria natureza apresenta preciosas lições, nesse particular. Sucedem-se os anos com matemática precisão, mas os dias são sempre novos. Dispondo, assim, de trezentas e sessenta e cinco ocasiões de aprendizado e recomeço, anualmente, quantas oportunidades de renovação moral encontrará a criatura, no abençoado período de uma existência?

Conserva do passado o que for bom e justo, belo e nobre, mas não guardes do pretérito os detritos e as sombras, ainda mesmo quando mascarados de encantador revestimento.

Faze por ti mesmo, nos domínios da tua iniciativa pela aplicação da fraternidade real, o trabalho que a tua negligência atirará fatalmente sobre os ombros de teus benfeitores e amigos espirituais.

Cada hora que surge pode ser portadora de reajustamento.

Se é possível, não deixes para depois os laços de amor e paz que podes criar agora, em substituição às pesadas algemas de desafeto.

Não é fácil quebrar antigos preceitos do mundo ou desenovelar o coração, a favor daqueles que nos ferem. Entretanto, o melhor antídoto contra os tóxicos da aversão é a nossa boa-vontade, a benefício daqueles que nos odeiam ou que ainda não nos compreendem.

Enquanto nos demoramos na fortaleza defensiva, o adversário cogita de enriquecer as munições, mas se descemos à praça, desassombrados e serenos, mostrando novas disposições na luta, a ideia de acordo substitui, dentro de nós e em torno de nossos passos, a escura fermentação da guerra.

Alguém te magoa? Reinicia o esforço da boa compreensão

Alguém te não entende? Persevera em demonstrar os intentos mais nobres.

Deixa-te reviver, cada dia, na corrente cristalina e incessante do bem.

Não olvides a assertiva do Mestre: - "Aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus".

Renasce agora em teus propósitos, deliberações e atitudes, trabalhando para superar os obstáculos que te cercam e alcançando a antecipação da vitória sobre ti mesmo, no tempo...

Mais vale auxiliar, ainda hoje, que ser auxiliado amanhã.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

29 - 30 - 31 - 32: Quatro mitos do plural

29. O plural de DVD é DVDs?

Na verdade, as siglas não têm plural.

30. "Bastante" não vai para o plural?

Se "bastante" for um advérbio, não; mas se for adjetivo, é flexionado: "Há bastantes dicas na revista".

31. Prefixos têm plural?

Prefixos, prefixoides ou pseudoprefixos não se flexionam nunca, nem quando estão distantes da palavra primitiva: "os pré e pós-operatórios"; as micro e pequenas empresas". Isso porque tais morfemas não são adjetivos.

32. Número tem plural?

Gramáticos recomendam que se deva dizer "anos vintes", com flexão do numeral, sob a alegação de que a dezena se repete a cada ano (1920, 1921, 1922, etc.). O argumento não convence. O numeral cardinal pode flexionar-se quando é substantivo (Os quatros que ele desenhou pareciam cadeiras viradas.") Mas, posposto ao substantivo, o cardinal não se flexiona em nenhuma das Línguas Neolatinas.


Texto de Francisco S. Borba; professor do Curso de pós-graduação em Linguística da UNESP - Campus de Araraquara e pesquisador 1A do CNPq.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

28. Se não se "entrega à casa", não há "entrega a domicílio"

A gramática tradicional sacraliza a expressão "entrega a domicílio". Mas o raciocínio tende a rejeitar a expressão ao imaginar o equivalente "entrega à casa", que soa ambíguo ante "entrega em casa", daí a preferência por "entrega em domicílio", que é condenado pelos gramáticos normativos. Na mesma linha é a ideia de que dizemos "monta a cavalo" e não "monta à burro", "monta à égua". Sob o mesmo princípio, como se diz "andar a cavalo", dever-se-ia dizer "andar a ônibus", "andar a trem".


Texto de Francisco S. Borba; professor do Curso de pós-graduação em Linguística da UNESP - Campus de Araraquara e pesquisador 1A do CNPq.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

27. Se fora do dicionário, a palavra não existe

Qualquer bom dicionário deve registrar como a Língua está sendo usada, principalmente em sua forma escrita. Acontece que ela está sempre em movimento, certos usos - palavras ou construções - tomam o lugar de outros, de tal forma que o dicionário está sempre para trás em relação ao uso real e atual. O dicionário não decide nada - quem decide é quem fala.

O que o dicionário pode e deve fazer é orientar o uso no sentido da clareza, adequação e economia. Por isso, ele seleciona aquilo que é mais adequado e condizente com o próprio espírito da Língua, deixando de lado brincadeiras verbais, construções francamente empasteladas, aberrações, enfim.

Quando as formas são equivalentes, o dicionário deve registrá-las, e, quando muito, assinalar qual está sendo a preferência: a rigor/em rigor; às pressas/à pressa; a nível de/no nível de; sito à rua/na rua; ao invés de/em vez de; entrega a domicílio/em domicílio; TV a cores/em cores etc.

Não se encontram nos dicionários todas as palavras usadas numa Língua. Os dicionários registram as palavras que são matrizes do Idioma e só algumas das várias outras que podem ser delas derivadas. Por isso é que não se vê dicionarizado nenhum advérbio em "mente", pois se sabe que para formar "admiravelmente", por exemplo, basta conhecer o adjetivo "admirável".


Texto de Francisco S. Borba; professor do Curso de pós-graduação em Linguística da UNESP - Campus de Araraquara e pesquisador 1A do CNPq.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

26. O certo é "risco de morte", não "de vida"

Embora a atividade linguística seja inventiva e criadora, aqui, no caso, não se trata de propriamente de invenções, mas de inovações devidas ao próprio mecanismo da Língua, que é uma entidade dinâmica sempre em movimento. As inovações internas aparecem pela propriedade que têm os itens léxicos de se associarem em diversas maneiras e, associados, podem transformar uma construção em outra equivalente.

Por exemplo, diz-se "arriscar a vida = pôr em risco a vida", que se nominalizando passa a "risco de vida". Foi essa a  construção que os jornais se incumbiram de espalhar. A partir de um certo momento houve quem achasse que a expressão não era adequada. E propôs "risco de morte". Mas esta expressão é a transformada de "arriscar-se a morrer > correr o risco de morrer > risco de morte". Por aí se vê que as duas são legítimas; só que esta última tem frequência bem menor no mesmo jornal.


Texto de Francisco S. Borba; professor do Curso de pós-graduação em Linguística da UNESP - Campus de Araraquara e pesquisador 1A do CNPq.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.