segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Laura

                        Lluis Llach/Diana Pequeno


Hoje lhe escrevo uma canção
Recordo ver você chegar
Com o mistério dos teus olhos
O vulto inquieto, o corpo amigo
Com o sorriso em tuas mãos
Levaste ao longe minha canção
Em cada nota do teu nome, Laura
É tão difícil recordar
Os tantos mundos que vivemos
Nossa amargura por viver
Nossa esperança no amanhã
Em casa com nossos irmãos
Ou em triste exílio além do mar
Nunca faltou o teu alento, Laura
E se acaso longe vás
Que os deuses guardem teu caminho
Que te acompanhem passarinhos
Que te afaguem as estrelas
E num acorde desta voz
Embora nem possas ouvir
Sempre estará tua canção, Laura.


A Laura, a quem aqui presto a homenagem, está hoje no plano espiritual. Só soube da sua partida recentemente e acho até que tenha sido melhor assim! Vou ter sempre a imagem dela sorrindo ao me receber...
Laura não era mais uma mocinha, muito pelo contrário, talvez já tivesse ultrapassado um pouquinho os 80 anos... não sei dizer! Foi ela quem me ensinou muitas coisas que certamente usei depois que eu cresci.
Ela não era a minha avó, mas me considerava seu neto. Não me lembro exatamente quando foi a última vez que nos encontramos. Devo admitir que fiquei muito triste com a notícia... Talvez eu quisesse me despedir dela ainda viva, não sei. Apesar da distância nos últimos anos, senti um grande vazio, pois assim como eu gostava muito dela, ela nutria um grande sentimento por mim. Você vai ficar na saudade, minha senhora... mas vou torcer para você estar em um lugar bem melhor, o Nosso Lar, por exemplo. Sei que onde estiver, estará velando por mim e por aqueles que convivem comigo. Um grande beijo...

Morte e Vida Severina (trecho)

                                      João Cabral de Melo Neto


O meu nome é Severino,
não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria;
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.
Mas isso ainda é pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem fala
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da Serra da Costela,
limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
como nome Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas,
e iguais também porque o sangue
que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
algum roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Como é Grande e Bonita a Natureza

                          Sivuca/Glorinha Gadelha

Andorinha é a presa do picanço
Beija-flor todo dia a flor beija
E a pequena floresta onde eu descanso
É um mundo de fera e de presa
Quero muito zelar pela pureza
Pelo rei, pela fada e pelo santo
Escondendo na mata o meu espanto
Como é grande e bonita a natureza

Eu me chamo João, Joana chama
Pra mostrar verdes olhos. verde queixa
Pra plantar minha crença galopando
Quero sol, quero chuva que despeja
Minha força taí nessa peleja
No rastejo arrastado do meu chão
Vou fazendo do mote o meu refrão
Como é grande e bonita a natureza

O cometa que passa vai passando
E a estrela do norte pestaneja
Zelação pelo céu alumiando
No clarão da manhã a noite fecha
Minha sorte no meio dessa riqueza
Meu desejo, meu sonho, meu sertão
Meu inverno é a promessa de um verão
Como é grande e bonita a natureza

Eu sou feita da força do remanso
A paulada no couro me desfecha
No momento da fome eu me avanço
Pra comer, como tudo que me deixa
A coragem embarcou nessa afoiteza
Minha sede abre a boca num rasgão
Que não sofra por mim o meu irmão
Como é grande e bonita a natureza.

Outra canção de Clara Nunes falando sobre a natureza que foi gravada em seu disco de 1981 intitulado Clara.

Salve o Verde

                            Jorge Ben

Toca a viola, toca a viola, violeiro
Segura o ritmo, segura o ritmo, batuqueiro
Entra na roda, entra na roda, milongueiro
Pois estão chegando
Estão chegando os partideiros
Cantando assim
Salve o verde! Salve o verde!
Deus salve o verde
Que o homem está acabando
E construindo o cinza
Salve o verde! Salve o verde!
Tá faltando grama nesse jardim
Tá faltando árvore nessa cidade
Tá faltando oxigênio nessa atmosfera
O que será, o que será, o que será
O que será da biosfera?
Salve o verde! Salve o verde!

Esta música de Jorge Ben foi gravada pelo Quarteto em Cy do disco Querelas do Brasil de 1978 com uma grande preocupação com o meio ambiente. Ela foi tema de abertura da novela Sinal de Alerta da TV Globo (quando esta fazia algo que prestava...).

As Forças da Natureza

                                 João Nogueira/Paulo César Pinheiro

Quando o sol
Se derramar em toda sua essência
Desafiando o poder da ciência
Pra combater o mal
E o mar com suas águas bravias
Levar consigo o pó dos nossos dias
Vai ser um bom sinal
Os palácios vão desabar
Sob a força de um temporal
E os ventos vão sufocar
O barulho infernal
Os homens vão se rebelar
Dessa farsa descomunal
Vai voltar tudo ao seu lugar
Afinal
Vai resplandecer
Uma chuva de prata do céu vai descer
E o esplendor da mata vai renascer
E o ar de novo vai ser natural
Vai florir
Cada grande cidade o mato vai cobrir
Das ruínas um novo povo vai surgir
E vai cantar, afinal
As pragas e as ervas daninhas
As armas e os homens de mal
Vão desaparecer
Nas cinzas de um carnaval

Música-título do então LP de Clara Nunes gravado em 1977. Já havia uma grande preocupação ambiental...

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O Menino Sonhador

                                Enio Brito

Era uma vez um menino
Que gostava de voar!
Anunciando a liberdade
Para quem soubesse amar!

Ele cantava pelas ruas,
Por becos e povoados,
Um sentimento inquietante,
Que estava sempre do seu lado,

Ele cantava ao mundo inteiro,
num coração desesperado,
Preparando o homem novo,
Para amar e ser amado,

Mas enquanto ele cantava,
Seu coração se entristecia,
Pela ausência de espaços,
Para dizer o que sentia...

E o país era tão grande
Mas a surdez era maior
Até que um dia de repente
Este menino ficou só

Então resolveram calar a sua voz
Então resolveram tombar o seu corpo
Então resolveram tirar-lhe da história
Então resolveram tirar-lhe da glória...
E o menino calou-se no tempo
O sol se entristeceu
A verdade perdeu-se de tudo
Ficou só você e eu...

Menino que anda distante!
Aonde está o seu coração?
Menino eu sou navegante!
Das águas de suas mãos...

Brinquedos Incendiados

                                     Cecília Meireles


                  Uma noite, houve um incêndio num bazar. E no fogo total desapareceram consumidos os seus brinquedos. Nós, crianças, conhecíamos aqueles brinquedos um por um, de  tanto mirá-los nos mostruários - uns, pendentes de longos barbantes; outros, apenas entrevistos em suas caixas. Ah! maravilhosas bonecas louras, de chapéus de seda! pianos cujos sons cheiravam e metal e verniz! carneirinhos lanudos, de guizo ao pescoço! piões zunidores! - e uns bondes com algumas letras escritas ao contrário, coisa que muito nos seduzia - filhotes que éramos, então. de Mr. Jourdain, fazendo a nossa poesia concreta antes do tempo.
                  Às vezes, num aniversário, ou pelo Natal, conseguíamos receber de presente algum bonequinho de celulóide, modestos cavalinhos de lata, bolas de gude, barquinhos sem possibilidades de navegação... - pois aquelas admiráveis bonecas de filó, aqueles batalhões completos de soldados de chumbo, aquelas casas de madeira com portas e janelas, isso não chegávamos a imaginar sequer para onde iria. Amávamos os brinquedos sem esperança nem inveja, sabendo que jamais chegariam às nossas mãos, possuindo-os apenas em sonho, como se para isso, apenas, tivessem sido feitos.
                 Assim, o bando que passava, de casa para a escola e da escola para casa, parava longo tempo a contemplar aqueles brinquedos e lia aqueles nítidos preços, com seus cifrões e zeros, sem muita noção de valor - porque nós, crianças, de bolsos vazios, como os namorados antigos, éramos só renúncia e amor. Bastava-nos levar na memória aquelas imagens, e deixar cravados nelas, como setas, os nossos olhos.
                 Ora, uma noite, correu a notícia de que o bazar incendiara. E foi uma espécie de festa fantástica. O fogo ia muito alto, o céu ficava todo rubro, voavam chispas e labaredas pelo bairro todo. As crianças queriam ver o incêndio de perto, não se contentavam com portas e janelas, fugiam para a rua, onde brilhavam bombeiros entre jorros d'água. A elas não interessavam nada peças de pano, cetins cretones, cobertores, que os adultos lamentavam. Sofriam pelos cavalinhos e bonecas, os trens e palhaços, fechados, sufocados em suas grandes caixas. Brinquedos que jamais teriam possuído, sonho apenas da infância, amor platônico.
                 O incêndio, porém, levou tudo. O bazar ficou sendo um fumoso galpão de cinzas.
                  Felizmente, ninguém tinha morrido - diziam em redor. Como não tinha morrido ninguém? pensavam as crianças. Tinha morrido um mundo e, dentro dele, os olhos amorosos das crianças, ali deixados.
                 E começavamos a pressentir que viriam outros incêndios. Em outras idades. De outros brinquedos. Até que um dia também desaparecêssemos sem socorro, nós, brinquedos que somos, talvez, de anjos distantes!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Mulheres de Atenas

                        Augusto Boal/Chico Buarque

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Vivem pros seus maridos, orgulho e raça de Atenas
Quando amadas se perfumam
Se banham com leite, se arrumam
Suas melenas
Quando fustigadas não choram
Se ajoelham, pedem, imploram
Mais duras penas
Cadenas.

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Sofrem por seus maridos, poder e força de Atenas
Quando eles embarcam, soldados,
Elas tecem longos bordados
Mil quarentenas
E quando eles voltam sedentos
Querem arrancar, violentos,
Carícias plenas,
Obcenas.

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Despem-se pors seus maridos, bravos guerreiros de Atenas
Quando eles se entopem de vinho
Costumam buscar o carinho
De outras falenas
Mas no fim da noite, aos pedaços
Quase sempre voltam pros braços
De suas pequenas
Helenas.

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Geram pros seus maridos os novos filhos de Atenas
Elas não têm gosto ou vontade
Nem defeito nem qualidades
Têm medo apenas
Não têm sonhos, só têm presságios
O seu homem, mares, naufrágios
Lindas sirenas
Morenas.

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Temem por seus maridos, heróis e amantes de Atenas
As jovens viúvas marcadas
E as gestantes abandonadas
Não fazem cenas
Vestem-se de negro, se encolhem
Se conformam e se recolhem
Às suas novenas
Serenas.

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Secam por seus maridos, orgulho e raça de Atenas.

Gravação feita pelo autor em seu disco " Meus Caros Amigos " lançado em 1976. No ano seguinte, as meninas do Quarteto em Cy registraram em seu álbum ao vivo intitulado " Resistindo ".

Mulher Nova, Bonita e Carinhosa Faz o Homem Gemer Sem Sentir Dor

                                 Zé Ramalho/Otacílio Batista

Numa luta de gregos e troianos
Por Helena, a mulher de Menelau
Conta a história que um cavalo de pau
Terminava uma guerra de dez anos
Menelau, o maior dos espartanos
Venceu Páris, o grande sedutor
Humilhando a família de Heitor
Em defesa da honra caprichosa
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor

Alexandre, figura desumana,
Fundador da famosa Alexandria,
Conquistava na Grécia e destruía
Quase toda a população tebana
A beleza atrativa de Roxana
Dominava o maior conquistador
E depois de vencê-la, o vencedor
Entregou-se à pagã mais que formosa.
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor

A mulher tem na face dois brilhantes
Condutores fiéis do seu destino
Quem não ama o sorriso feminino
Desconhece a poesia de Cervantes.
A bravura dos grandes navegantes
Enfrentando a procela em seu furor
Se não fosse a mulher, mimosa flor
A história seria mentirosa.
Mulher nova bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor

Virgulino Ferreira, o lampião
Bandoleiro das selvas nordestinas,
Sem temer a perigo nem ruínas
Foi o rei do cangaço no sertão,
Mas um dia sentiu no coração
O feitiço atrativo do amor
A mulata da terra do condor
Dominava uma fera perigosa.
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor

Faixa-título do disco lançado por Amelinha em 1982. É a primeira gravação feita.

A guerra de Tróia e sua origem

                          Certo dia, no meio de uma festa de núpcias a que compareceram os deuses do Olimpo, Éris, a deusa da Discórdia, despeitada de não ter sido convidada, surgiu inesperadamente e atirou ao chão um fascinante pomo de ouro, dizendo que deveria pertencer à mais bela das deusas. Três delas - Atena, Hera e Afrodite - precipitaram-se para apanhá-lo.
                          Zeus,o pai dos deuses, pressentindo uma tragédia, interveio, mas, não querendo tomar partido em assunto tão delicado, tentou esquivar-se, nomeando outro deus para dirimir a questão. Como nenhum dos escolhidos aceitasse a incumbência por temer o rancor das perdedoras, Zeus, em sua sabedoria, chamou Hermes, o mensageiro do Olimpo, e disse-lhe que submetesse o caso a um mortal.
                          A escolha recaiu em Páris, um príncipe troiano, que foi imediatamente convocado. Cada deusa exibiu os seus predicados e tentou comprar a simpatia do juiz com ofertas irrecusáveis. Hera prometeu torná-lo rei de toda a vasta Ásia. Atena assegurou-lhe o dom da sabedoria e a vitória nos combates. Afrodite garantiu-lhe o amor da mulher mais bela da Terra.
                         Depois de muito refletir, o troiano proferiu a sentença: o pomo cobiçado coube a Afrodite, a deusa do amor.
                         A mais bela mulher, porém, era Helena, esposa de Menelau, rei de Esparta. Páris, mesmo informado disso, não desistiu de seu propósito. Viajou para o sul da Grécia e foi muito bem recebido por Menelau, que de nada suspeitava. Ajudado por Afrodite, conseguiu seduzir a belíssima Helena e levou-a para Tróia, com muitas jóias e objetos de valor.
                         Indignado, Menelau convocou os chefes gregos para a assembleia, onde ficou decidido que a Grécia vingaria o ultraje e marcharia unida contra a poderosa Tróia.
                         Começou, assim, uma guerra sanguinária, que se estendeu por dez longos anos, até que, recorrendo a um hábil estratagema - o célebre cavalo de madeira -, os gregos acabaram por tomar a cidade.
                         Depois de arrasarem todas as casas, não deixando pedra sobre pedra, e de matarem os seus habitantes, os invasores transportaram para as naus o rico saque que haviam recolhido. Agora, só lhes faltava voltar para a pátria distante, onde os aguardavam, ansiosos, os braços das esposas amorosas.

Retirado da adaptação em português para literatura infanto-juvenil do livro " Odisséia " feita por Roberto Lacerda.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Sobre Política e Jardinagem

                                      Rubem Alves

                    De todas as vocações, a política é a mais nobre. " Vocação ", do latim vocare, quer dizer "chamado". Vocação é um chamado interior de amor: chamado de amor por um "fazer". No lugar desse "fazer" o vocacionado quer "fazer amor" com o mundo. Psicologia de amante: faria, mesmo que não ganhasse nada.
                    "Política" vem de polis,"cidade". A cidade era, para os gregos, um espaço seguro, ordenado e manso, onde os homens podiam se dedicar à busca da felicidade. O político seria aquele que cuidaria desse espaço. A vocação política, assim, estaria a serviço da felicidade dos moradores da cidade.
                     Talvez por terem sido nômades no deserto, os hebreus não sonhavam com cidades: sonhavam com jardins. Quem mora no deserto sonha com oásis. Deus não criou uma cidade. Ele criou um jardim. Se perguntássemo a um profeta hebreu: "O que é política?", ele nos responderia: "A arte da jardinagem aplicada às coisas públicas."
                     O político por vocação é um apaixonado pelo grande jardim para todos. Seu amor é tão grande que ele abre mão do pequeno jardim que ele poderia plantar para si mesmo. De que vale um pequeno jardim se à sua volta está um deserto? É preciso que o deserto inteiro se transforme em jardim.
                     Amo a minha vocação, que é escrever. Literatura é uma vocação bela e fraca. O escritor tem amor, mas não tem poder. Mas o político tem. Um político por vocação é um poeta forte: ele tem o poder de transformar poemas sobre jardins em jardins de verdade. A vocação política é transformar sonhos em realidade. É uma vocação tão feliz que Platão sugeriu que os políticos não precisam possuir nada: bastar-lhes-ia o grande jardim para todos. Seria indigno que o jardineiro tivesse um espaço privilegiado, melhor e diferente do espaço ocupado por todos. Conheci e conheço muitos políticos por vocação. Sua vida foi e continua a ser um motivo de esperança.
                     Vocação é diferente de profissão. Na vocação a pessoa encontra a felicidade na própria ação. Na profissão o prazer se encontra não na ação. O prazer está no ganho que dela se deriva. O homem movido pela vocação é um amante. Faz amor com a amada pela alegria de fazer amor. O profissional não ama a mulher. Ele ama o dinheiro que recebe dela. É um gigolô.
                      Todas as vocações podem ser transformadas em profissões. O jardineiro por vocação ama o jardim de todos. O jardineiro por profissão usa o jardim de todos para construir seu jardim privado, ainda que, para que isso aconteça, ao seu redor aumente o deserto e o sofrimento.
                      Assim é a política. São muitos os políticos profissionais. Posso, então, enunciar minha segunda tese: de todas as profissões política é a mais vil. O que explica o desencanto total do povo, em relação à política. Guimarães Rosa, perguntado por Günter Lorenz se ele se considerava político, respondeu:
                     Eu jamais poderia ser político com toda essa charlatanice da realidade... Ao contrário dos "legítimos" políticos, acredito no homem e lhe desejo um futuro. O político pensa apenas em minutos. Sou escritor e penso em eternidades. Eu penso na ressurreição do homem.
                     Quem pensa em minutos não tem paciência para plantar árvores. Uma árvore leva muitos anos para crescer. É mais lucrativo cortá-las.
                     Nosso futuro depende dessa luta entre políticos por vocação e políticos por profissão. O triste é que muitos que sentem o chamado da política não têm coragem de atendê-lo, por medo da vergonha de serem confundidos com gigolôs e de terem de conviver com gigolôs.
                     Escrevo para vocês, jovens, para seduzí-los à vocação política. Talvez haja jardineiros adormecidos dentro de vocês. A escuta da vocação é difícil, porque ela é perturbada pela gritaria das escolhas esperadas, normais: medicina, engenharia, computação, direito, ciência. Todas elas, legítimas, se forem vocação. Mas todas elas afunilantes: vão colocá-los num pequeno canto do jardim, muito distante do lugar onde o destino do jardim é decidido. Não seria muito mais fascinante participar dos destinos do jardim?
                    Celebramos os quinhentos anos do descobrimento do Brasil. Os descobridores, ao chegarem, não encontraram um jardim. Encontraram uma selva. Selva não é jardim. Selvas são cruéis e insensíveis, indiferentes ao sofrimento e à morte. Uma selva é uma parte da natureza ainda não tocada pela mão do homem. Aquela selva poderia ter sido transformada num jardim. Não foi. Os que sobre ela agiram não eram jardineiros. Eram lenhadores e madeireiros. E foi assim que a selva, que poderia ter se tornado jardim para a felicidade de todos, foi sendo transformada em desertos salpicados de luxuriantes jardins privados onde uns poucos encontram vida e prazer.
                     Há descobrimentos de origens. Mais belos são os descobrimentos de destinos. Talvez, então, se os políticos por vocação se apossarem do jardim, poderemos começar a traçar um novo destino. Então, ao invés de desertos e jardins privados, teremos um grande jardim para todos, obra de homens que tiveram o amor e a paciência de plantar árvores à cuja sombra nunca se assentariam.

Os Trabalhos da Mão

                              Alfredo Bosi


                  Parece ser próprio do animal simbólico valer-se de uma só parte do seu organismo para exercer funções diversíssimas. A mão sirva-se de exemplo.
                  A mão arranca da terra a raiz e a erva, colhe da árvore o fruto, descasca-o, leva-o à boca. A mão apanha o objeto, remove-o, achega-o ao corpo, lança-o de si. A mão puxa e empurra, junta e espalha, arrocha e afrouxa, contrai e distende, enrola e desenrola; roça, toca, apalpa, acaricia, belisca, unha, aperta, esbofeteia, esmurra; depois massageia o músculo dorido.
                 A mão tateia com as pontas dos dedos, apalpa e calca com a polpa, raspa, arranha, escarva, escarifica e escarafuncha com as unhas. Com o nó dos dedos, bate.
                 A mão abre a ferida e a pensa. Eriça o pelo e o alisa. Entrança e destrança o cabelo. Enruga e desenruga o papel e o pano. Unge e esconjura, asperge e exorciza.
                 Acusa com o índex, aplaude com as palvas, protege com a concha. Faz viver alçando o polegar; baixando-o, manda matar.
                 Mede com o palmo, sopesa com a palma.
                 Aponta com gestos o eu, o tu, o ele; o aqui, o alí, o aí; o hoje, o ontem, o amanhã; o pouco, o muito, o mais ou menos; o um, o dois, o três, os números até dez e os seus múltiplos e quebrados. O não, o nunca, o nada.
                 É voz do mudo, é voz do surdo, é leitura do cego.
                 Faz levantar a voz, amaina o vozerio, impõe o silêncio. Saúda o amigo balançando, leve ao lado da cabeça e, no mesmo aceno, estira o braço e diz adeus. Urge e manda parar. Traz ao mundo a criança, esgana o inimigo.
                 Ensaboa a roupa, esfrega, torce, enxágua, estende-a ao sol, recolhe-as dos varais, desfaz-lhe as pregas, dobra, guarda-a.
                 A mão prepara o alimento. Debulha o grão, depela o legume, desfolha a verdura, descama o peixe, depena a ave e a desossa. Limpa. Espreme até extrai o suco. Piloa de punho fechado, corta a quina, mistura, amassa, sova, espalma, enrola, amacia, unta, recobre, enfarinha, entrouxa, enforma, desenforma, polvilha, guarnece, afeita, serve.
                A mão joga a bola e apanha, apara e rebate. Soergue-a e deixa-a cair.
                A mão faz som; bate na perna e no peito, marca o compasso, percute o tambor e o pandeiro, batuca, estala as asas das castanholas, dedilha as cordas da harpa e do violão, dedilha as teclas do cravo e do piano, empunha o arco do violino eo violoncelo, empunha o tubo das madeiras e dos metais. Os dedos cerram e abrem o caminho do sopro que sai pelos furos da flauta, do clarim e do oboé. A mão rege a orquestra.
                A mão, portadora do segredo. As mãos postas oram, palma contra palma ou entrelaçados os dedos. Com a mão o fiel se persigna. A mão mistura o sal e a água do batismo e asperge o novo cristão; a mão unge de óleo no crisma, enquanto com a destra o padrinho toca no ombro do afilhado; os noivos estendem as mãos para celebrarem o sacramento do amor e dão-se mutuamente os anulares para receberem o anel da aliança; a mão absolve do pecado o penitente; as mãos servem o pão da eucaristia ao comungante; as mãos consagram o novo sacerdote; as mãos levam a extrema-unção ao que vai morrer; e ao morto, a benção e o voto de paz.
               Para perfazer tantíssimas ações basta-lhe uma breve mas dútil anatomia: oito ossinhos no pulso, cinco no metacarpo e os dedos com as suas falanges, falanginhas e falangetas.
               Mas seria nunca acabar dizer tudo quanto a mão consegue fazer quando prolongam e potenciam os instrumentos que o engenho humano foi inventando na sua contradança de precisões e desejos.
               A mão lavra a terra há pelo menos oito mil anos, quando começou o Neolítico em várias partes do Globo. Com as mãos, desde que criou a agricultura, o homem semeia, poda e colhe. Empunhando o machado e a foice, desbasta a floresta; com a enxada revolve a terra, limpa o mato, abre covas. Com a picareta, escava e desenterroa. Com a pá, estruma. Com o rastelo e o forcado, gradeia, sulca e limpa. Com o regador, água. Desgalha com a faca e o tesourão.
              Manejando o cabo dos utensílios de cozinha, o homem pode talhar a carne, trinchar as aves, espetar os alimentos sólidos e conter os líquidos que escoariam pelas juntas das mãos em concha.
              Morar é possível porque mãos firmes de pele dura amassam o barro, empilham pedras, atam bambus, assentam tijolos, aprumam o fio, trançam ripas, diluem a cal virgem, moldam o concreto, argamassam juntas, desempenam reboco, armam o madeirame, cobrem com telha, goivo ou sapé, pregam ripas no forro, pregam tábuas no assoalho, rejuntam azulejos, abrem portas, recortam janelas, chumbam batentes, dão pintura a última demão.
              A mão do oleiro leva o barro ao fogo: tijolo. A mão do vidreiro faz a bolha de areia, e do sopro nasce o cristal.
              A mão da mulher tem olheiros nas pontas dedos: risca o pano, enfia a agulha, costura, alinhava, pesponta, chuleia, cerze, caseia. Prende o tecido nos aros do bastidor: tece e urde e borda.
              A mão do lenhador brande o machado e racha o tronco. Vem o carpinteiro e da lenha faz o lenho: raspa e desbasta com a plaina, apara com o formão, alisa e desempena com a lixa, penetra com cunha, corta com a serra, entalha com a talhadeira, boleia com o torno, crava pregos com o martelo, marcheta com as tachas, encera e lustra com o feltro.
              O ferreiro malha o ferro na bigorna, com o fogo funde, com o cobre o solda, com a broca o fura, com a lima rói, com a tenaz o verga, torce e arrebita.
              O gravador entalha e chanfra com o cinzel, pule com o buril. O ourives lapida com o diamante, corta com o cinzel, afina com o buril, engasta com a pinça, apura com o esmeril.
              O escultor corta e lavra com o escopro e o formão.
              O pintor, lápis ou pincel na mão, risca, rabisca, alinha, enquadra, traça, esboça, debuxa, mancha, pincela, pontilha, empastela, retoca, remata.
              O escritor garatuja, rascunha, escreve, reescreve, rasura, emenda, cancela, apaga...

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Meu Pai Oxalá

                         Toquinho/Vinícius de Moraes


Atotô Abaluayê
Atotô Babá
Atotô Abaluayê
Atotô Babá

Vem das águas de Oxalá
Essa mágoa que me dá
Ela parecia o dia
A romper da escuridão
Linda no seu manto todo branco
Em meio à procissão
E eu, que ela nem via
Ao Deus pedia amor e proteção

Meu pai Oxalá é o rei
Venha me valer
O velho Omulu
Atotô Abaluayê

Que vontade de chorar
No terreiro de Oxalá
Quando eu dei com a minha ingrata
Que era filha de Iansã
Com a sua espada cor de prata
Em meio à multidão
Cercando Xangô num balanceio
Cheio de paixão

Meu pai Oxalá é o rei
Venha me valer
O velho Omulu
Atotô Abaluayê

Música antiga de Vinícius e Toquinho regravada por Daniela Mercury em seu CD Balé Mulato de 2005

É D'Oxum

                    Gerônimo/Vevé Calazans

Nessa cidade todo mundo é d'Oxum
Homem, menino, menina, mulher
Toda essa gente irradia magia

Presente na água doce
Presente na água salgada
E toda cidade brilha

Seja tenente ou filho de pescador
Ou importante desembargador
Se dar presente é tudo uma coisa só

A moça que mora na água
Não faz distinção de cor
E toda cidade é d'Oxum

Nessa cidade...

É d'Oxum, é d'Oxum, é d'Oxum

Nessa cidade todo mundo é d'Oxum
Homem, menino, menina, mulher
Toda essa gente irradia magia

Presente na água doce
Presente na água salgada
E toda cidade brilha

É d'Oxum, é d'Oxum, é d'Oxum

Eu vou navegar
Eu vou navegar nas ondas do mar
Eu vou navegar

música do primeiro CD da cantora baiana Cátia Guimma gravado em 1998; é a gravação mais bonita...

Iansã

                              Caetano Veloso/Gilberto Gil

e dambure
e dambure mavanjú
e dambure bela oiá

Senhora das nuvens de chumbo
Senhora do mundo dentro de mim
Rainha dos raios, rainha dos raios,

Rainha dos raios, tempo bom, tempo ruim
Senhora das chuvas de junho
Senhora de tudo dentro de mim
Rainha dos raios, rainha dos raios...
Eu sou o céu para as tuas tempestades
Um céu partido ao meio no meio da tarde
Eu sou um céu para as tuas tempestades
Deusa pagã dos relâmpagos
Das chuvas de todo ano
Dentro de mim

aê dindin aê dindá
na matamba de aruê
na matamba de aruá

música do CD Tecnomacumba gravado em 2006 por Rita Ribeiro

A Deusa dos Orixás

                    Toninho/Romildo

o vento bateu na saia de Iansã
o vento bateu pra Iansã rodar

Iansã, cadê Ogum? Foi pro mar
Mas Iansã, cadê Ogum? Foi pro mar
Iansã penteia os seus cabelos macios
Quando a luz da lua cheia
Clareia as águas dos rios
Ogum sonhava com a filha de Nanã
E pensava que as estrelas
Eram os olhos de Iansã
Mas Iansã, cadê Ogum? Foi pro mar
Iansã, cadê Ogum? Foi pro mar
Na terra dos orixás, o amor se dividia
Entre um deus que era de paz
E outro deus que combatia
Como a luta só termina
Quando existe um vencedor
Iansã virou rainha da coroa de Xangô

oiá oiá oiá me
óia matamba me cacurucajo zinguê

a gravação original desta música foi feita por Clara Nunes em 1976 no então LP Claridade e regravada por Rita Ribeiro em seu CD Tecnomacumba de 2006.

São João Xangô Menino

                             Caetano Veloso/Gilberto Gil


Ah, Xangô Xangô menino
Da fogueira de São João
Quero ser sempre o menino Xangô
Da fogueira de São João

Céu de estrela sem destino
De beleza sem razão
Tome conta do destino Xangô
Da beleza e da razão

Viva São João
Viva o milho verde
Viva São João
Viva o brilho verde
Viva São João das matas de Oxossi
Viva São João

Olha pro céu meu amor
Veja como ele está lindo
Noite tão fria de junho Xangô
Canto tanto canto lindo

Fogo fogo de artifício
Quero ser sempre o menino
As estrelas deste mundo Xangô
Ah, São João Xangô menino

Viva São João
Viva o milho verde
Viva São João
Viva o brilho verde
Viva São João
Das matas de Oxossi
Viva São João


meu pai são joão batista é xangô
é dono do meu destino até o fim
se um dia me faltar
a fé em meu senhor
derrube essa pedreira sobre mim
meu pai são joão batista é xangô

(Ponto de Macumba recolhido e adaptado por Eli Camargo)

música do CD Brasileirinho gravado em 2004 por Maria Bethânia

Xangô

                            Chico César/ Suzana Salles


É Xangô que vai chegar
Por Alá canta o corão
Coro Atlântico verão
Acalanto uma canção

Xangô baixou em Shangai
Na pele de um samurai
Em nome da mãe e do pai
Xangô quando entra não sai
Xangô chamou um xamã
Nas terras de Aldebarã
Em nome do irmão, da irmã
Xangô é a luz da manhã

É Xangô que vai chegar
Por Alá canta o corão
Coro Atlântico verão
Acalanto uma canção

Xangô pluma da cultura
O bico da bic futura
Seu nome é a água que fura
Dureza da pedra que dura
Xangô agogô da planície
Xango versos que Xangô disse
O chão, a chã superfície
Me viu antes que eu lhe visse

É Xangô que vai chegar
Por Alá canta o corão
Coro Atlântico verão
Acalanto uma canção

Música do CD As Sílabas da cantora paulistana Suzana Salles gravado em 2001.

sábado, 20 de novembro de 2010

Santa Bárbara

                      Fatima Guedes

Santa Bárbara dos tempos violentos
Vosso rosto me aparece num clarão
Quando um raio rasga
A imensa escuridão

Muitos ventos, muitos ventos
Passam por meu coração
Na carícia quase bruta
Do poder de vossa mão
Senhora, iluminai
Clareai meus pensamentos
Santa Bárbara
Dos tempos violentos

Vejo em vossos elementos
A chuva não vai parar
Até ter deixado limpos
Meu corpo e minha alma
Dona dos meus temporais,
Senhora de olhos cinzentos,
Santa Bárbara dos tempo violentos

música do CD Pra Bom Entendedor... de Fatima Guedes, gravado em 1993
(aliás, um dos mais belos trabalhos já feitos por ela)
Santa Bárbara no sincretismo brasileiro é Iansã

Não Vou Sair

                     Celso Viáfora

A geração da gente
Não teve muita chance
De se afirmar, de arrasar, de ser feliz.
Sem nada pela frente
Pintou aquele lance
De se mudar, de se mandar deste país.

Aí você partiu pro Canadá
Mas eu fiquei no já vou já
Pois quando eu tava me arrumando
Pra ir
Bati com os olhos no luar
A lua foi bater no mar
E eu fui que fui ficando

Distantes tantas milhas
São tristes os invernos
Não vou sair, tá mal aqui, mas vai mudar

Os donos de Brasília não podem ser eternos
Pior que foi, pior que tá, não vai ficar

Não vou sair, melhor você voltar pra cá
Não vou deixar esse lugar
Pois quando eu tava me arrumando
Pra ir
Bati com os olhos no luar
A lua foi bater no mar
e eu fui que fui ficando

Belíssima regravação da cantora Célia em seu CD Louca de Saudade de 1993

Que País É Este?

                        Renato Russo

Nas favelas, no Senado
Sujeira pra todo lado
Ninguém respeita a Constituição
Mas todos acreditam no futuro da nação

Que país é este?

No Amazonas, no Araguaia, na Baixada Fluminense
Mato Grosso, nas Geraes e no Nordeste tudo em paz
Na morte eu descanso mas o sangue anda solto
Manchando papéis, documentos fiéis
Ao descanso do patrão

Que país é este?

Terceiro mundo se for
Piada no exterior
Mas o Brasil vai ficar rico
Vamos faturar um milhão
Quando vendermos todas as almas
Dos nossos índios em um leilão

Que país é este?

faixa-título do então LP do grupo Legião Urbana. Lançado originalmente em 1987.

Minha Alma (A Paz Que Eu Não Quero Ter)

                        Marcelo Yuka/O Rappa

A minha alma está armada
E apontada para a cara
Do sossego
Pois paz sem voz
Não é paz é medo

Às vezes eu falo
Com a vida
Às vezes é ela quem diz

Qual a paz que eu não
Quero conservar
Pra tentar ser feliz

As grades do condomínio
São para trazer proteção
Mas também trazem a dúvida
Se é você que está nessa prisão
Me abrace e me dê um beijo
Faça um filho comigo
Mas não me deixe sentar
Na poltrona no dia de domingo

Procurando novas drogas
De aluguel nesse video
Coagido pela paz
Que eu não quero
Seguir admitindo

Às vezes eu falo com a vida
Às vezes é ela quem diz

música do disco " Lado B Lado A " do grupo O Rappa, lançado em 1999; já foi regravada por Maria Rita, Vânia Abreu e Leila Pinheiro.

Diga Lá, Coração

                   Gonzaguinha

Diga lá, meu coração
Da alegria de rever essa menina
E abraçá-la
E beijá-la

Diga lá, meu coração
Conte as histórias das pessoas
Das estradas
Dessa vida
Chore essa saudade estrangulada
Fale sem você não há mais nada
Olhe bem nos olhos da morena
E veja lá no fundo a luz daquele
Sol de primavera
Durma qual criança no seu colo
Sinta o cheiro forte do teu solo
Passe a mão nos seus cabelos negros
Diga um verso bem bonito
E vá embora

Diga lá, meu coração
Que ela está dentro
Do teu peito
E bem guardada
E que é preciso
Mais que nunca
Prosseguir
Prosseguir

Espere por mim, morena
Espere que eu chego já
O amor por você, morena
Faz a saudade apressar...


Gravação original feita pela cantora Simone em seu disco " Cigarra " lançado em 1978.

Como Nossos Pais

                            Belchior

Não quero lhe falar, meu grande amor
Das coisas que aprendi nos discos
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
E eu sei que o amor é uma coisa boa
Mas também sei que qualquer canto
É menor do que a vida
De qualquer pessoa
Por isso, cuidado, meu bem, há perigo na esquina!
Eles venceram e o sinal está fechado pra nós
Que somos jovens
Para abraçar seu irmão e beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço, o seu lábio e a sua voz
Você me pergunta pela minha paixão
Digo que estou encantado como uma nova invenção
Eu vou ficar nessa cidade
Não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento
O cheiro da nova estação
Eu sei de tudo na ferida viva do meu coração
Já faz tempo eu vi você na rua, cabelo ao vento, gente jovem reunida
Na parede da memória essa lembrança é o quadro que dói mais
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como nossos pais
Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam, não
Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer que eu tô por fora ou então que eu tô inventando
Mas é você que ama o passado e que não vê
Que o novo sempre vem
Hoje eu sei que quem me deu a ideia de uma nova consciência e juventude
Está em casa guardado por Deus contando vil metal
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo, tudo o que fizemos
Nós ainda somos os mesmo e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais

Música do disco " Falso Brilhante " gravado em 1976 por Elis Regina.
É impressionante como esta canção está sempre atual...

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Beija-Flor

                    Um incêndio avançava sobre a floresta destruindo tudo pelo caminho. Os animais, assustados, corriam para se proteger na outra margem do rio.
                    O rei leão procurava por todos os seus amigos: lá estavam os sapos, as cobras, os esquilos, as cabras, coiotes, os macacos, enfim, todos os animais. Com isso, ele sorri satisfeito pensando: " pelo menos estão todos aqui seguros ".
                   Perto dali, o pequenino beija-flor, enchia seu biquinho com água do rio, voava e do alto, soltava aquelas gotinhas sobre o imenso fogo.
                   Depois do quinto mergulho na água, o leão fez a pergunta esperada por todos:
                   - Ô beija-flor, você acha que vai conseguir apagar este incêndio com estas gotinhas?
                   - Não - respondeu a pequenina ave - mas estou fazendo a minha parte!!

História da Águia

                    A águia empurra gentilmente seus filhotes para a beirada do ninho. Seu coração maternal se acelera com as emoções conflitantes, ao mesmo tempo em que ela sente a resistência dos filhotes aos seus persistentes cutucões: " Por que a emoção de voar tem que começar com o medo de cair?! ", ela pensou... Esta questão secular ainda não estava respondida para ela...
                   Como manda a tradição da espécie, o ninho estava localizado bem no alto de um pico rochoso, nas fendas protetoras de um dos lados dessa rocha. Abaixo dele, somente o abismo e o ar para sustentar as asas dos seus filhotes. " E se justamente agora isto não funcionar?! ", ela pensou.
                   Apesar do medo, a águia sabia que aquele era o momento. Sua missão maternal estava prestes a se completar. Restava ainda uma tarefa final... o empurrão!!
                  A águia tomou-se da coragem que vinha de sua sabedoria interior. Enquanto os filhotes não descobrirem suas asas, não haverá propósito para sua vida! Enquanto eles não aprenderem a voar, não compreenderão o privilégio que é nascer uma águia! O empurrão era o maior presente que ela podia oferecer-lhes! Era seu supremo ato de amor...
                 E então, um a um, ela os precipitou para o abismo... e eles voaram pela primeira vez!!

Estrela-do-Mar

                       Um homem, sábio e poeta, costumava fazer longas caminhadas pela praia, antes de escrever.
                       Certo dia, avistou à distância, um vulto que parecia dançar. Ao se aproximar, viu um rapaz que não dançava, mas se abaixava, apanhava algo na areia e, cuidadosamente, atirava ao mar.
                       - Bom dia, meu rapaz, o que está fazendo?
                       - Jogando estrelas-do-mar no oceano.
                       - Por que está fazendo isso?
                       - Preciso aproveitar o tempo. A maré está baixando, o sol está forte e, se eu não as atirar na água morrerão.
                       - Mas, meu jovem, você não percebe que há quilômetros e quilômetros de praias e estrelas-do-mar em todas elas? E que as poucas que você consegue salvar não fazem diferença alguma?
                       O jovem escutou atentamente e, curvando-se, apanhou mais uma estrela-do-mar e atirando-a para lá da arrebentação, disse:
                       - Para esta fez diferença!!
                       No dia seguinte, havia um sábio poeta ajudando um jovem a lançar estrelas-do-mar no oceano...

Vagalume

                      Conta a lenda que uma vez uma serpente começou a perseguir um vagalume.
                      Este fugia rápido, com medo da feroz predadora e a serpente nem pensava em desistir.
                      Fugiu um dia e ela não desistia, dois dias e nada...
                      No terceiro dia, já sem forças, o vagalume parou e disse à cobra:
                      - Posso lhe fazer três perguntas?
                      - Não costumo abrir esse precedente para ninguém, mas já que vou te devorar mesmo, pode perguntar...
                      - Pertenço à sua cadeia alimentar?
                      - Não.
                      - Eu te fiz algum mal?
                      - Não.
                      - Então, por que você quer acabar comigo?
                      - Porque não suporto ver você brilhar...

                                                VAMOS REFLETIR??

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Feliz Aniversário

                      Álvaro de Campos/Fernando Pessoa


No dia em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia mais ter esperanças.
Quando vim a olhar a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto de mim mesmo,
O que fui de coração e parentesco,
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui - ai, meu Deus!, o que só sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a humanidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos de louça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas - doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado -,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Para, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje não faço anos.
Duro.
Somam-se os dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...

FESTIVAIS DA DÉCADA DE 80:

Diverdade - Diana Pequeno

                        Chico Maranhão

Eu sei que você fica preso no ar
Quando eu canto a minha moda,
Meu deserto, a minha trova,
Meu convento violado ou coisa mais

Vivei
Pra ver que sob a porta aberta
Desta escuridão
A luz suave e terna
Vai estender a mão
E a treva em torno toda
Clarear estrela nova
Para acabar com essa ideia
De achar que tudo tem que ter censura
Para acabar com essa mania
De querer tirar das ruas minha juventude

Eu sei que você fica preso no ar
Quando eu canto
Nestas horas de silêncio
A minha história, meus intentos
Com certeza ou coisa mais

Vivei cantando
E cantarei enquanto a voz cantar em mim
Enquanto voz tiver, enquanto for assim
Irei fazendo tudo clarear, estrela nova
Para acabar com essa ideia
De achar que tudo tem que ter censura
Para acabar com essa mania
De querer tirar das ruas minha juventude

Nunca entendi porque esta música não ficou classificada entre as três primeiras colocadas no Festival MPB em 1980... Recentemente, entrei em contato com o seu autor via e-mail e ele me falou o que muitos já sabem: alguns eventos são um jogo de cartas marcadas...

Registrei esta canção no dia do seu aniversário em minha agenda de 2010. Minha homenagem a você!!

Serra do Luar - Walter Franco

Amor
Vim te buscar
Em pensamento
Cheguei agora
... no vento

Amor não chora
De sofrimento
Cheguei agora
... no vento

Eu só voltei
Pra te contar
Viajei
Fui pra Serra do Luar
Mergulhei
Ah! Eu quis voar
Agora vem
Vem pra terra
Descansar

Viver
É afinar o instrumento
De dentro pra fora
De fora pra dentro
A toda hora
A todo momento
De dentro pra fora
De fora pra dentro...

Esta música participou do Festival MPB Shell realizado pela TV Globo em 1981. Dez anos depois, Leila Pinheiro fez uma belíssima regravação com arranjo de Guilherme Arantes em seu CD Outras Caras.

A Massa - Raimundo Sodré

                   Jorge Portugal/Raimundo Sodré

A dor da gente
É dor de menino acanhado
Menino bezerro pisado
No curral do mundo a penar
Que salta aos olhos
Igual ao gemido calado
A sombra do mal assombrado
É dor de nem poder chorar

Moinho de homens
Que nem jerimuns amassados
Mansos meninos domados
Passados medos iguais
Amassando a massa
A mão que amassa a comida
Esculpe, modela e castiga
Massa dos homens normais

Quando eu lembro da massa da mandioca, mãe
Da massa
Quando eu lembro da massa da mandioca, mãe
Da massa

Lelé, meu amor lelé
Lelé, meu amor lelé
No cabo da minha enxada
Não conheço um coroné

Eu quero, mas não quero, camará
" Mulé " minha na fusão, camará
Tá livre de um abraço, camará
Mas num tá de beliscão

Torna a repetir oi z'amor
Ai, ai, ai
Torna a repetir oi z'amor
Ai, ai, ai

É que o guarda-civil não quer a roupa no quarador
O guarda-civil não quer a roupa no quarador
Meu Deus onde vai quarar
Quarar essa massa
Meu Deus onde vai rolar
Rolar essa massa
Mas o trem corre é por cima da linha
O trem corre é por cima da linha

canção participante do Festival MPB realizado pela TV Globo em 1980. Tânia Alves e Elba Ramalho regravaram a música anos mais tarde...

Planeta Água - Guilherme Arantes

Água que nasce na fonte serena do mundo
E que abre um profundo grotão
Água que faz inocente riacho
E desagua na corrente do ribeirão
Águas escuras dos rios
Que levam a fertilidade ao sertão
Águas que banham aldeias
E matam a sede da população
Águas que caem das pedras
No veu das cascatas, ronco de trovão
E depois dormem tranquilas
No leito dos lagos, no leito dos lagos
Água dos igarapés, onde Iara, mãe-d'água
É misteriosa canção
Água que o sol evapora,
Pro céu vai embora
Virar nuvens de algodão
Gotas de água da chuva,
Alegre arco-iris sobre a plantação
Gotas de água da chuva, tão tristes
São lágrimas da inundação
Águas que movem moinhas
São as mesmas águas que encharcam o chão
E sempre voltam humildes
Pro fundo da terra
Pro fundo da terra
Terra, planeta água

Canção vencedora do Festival MPB Shell  realizado em 1981 pela TV Globo. No ano seguinte, a cantora espanhola Ana Belen fez uma linda regravação da música em espanhol.

Estrelas - José Alexandre

                   Oswaldo Montenegro

Pela marca que nos deixa
A ausência de som que emana das estrelas
Pela falta que nos faz a nossa própria luz
A nos orientar
Doido corpo que se move
É a solidão dos bares que
A gente frequenta,
Pela mágica do dia
Que independeria da gente pensar
Não me fale do teu medo
Ah! Eu conheço inteira a tua fantasia
E é como se fosse pouca e a tua alegria
Não fosse bastar
Quando eu não estiver por perto
Canta aquela música
Que a gente ria,
É tudo que eu cantaria
E quando eu for embora
Você cantará

Foi Deus Que Fez Você - Amelinha

                              Luis Ramalho

Foi Deus que fez o céu
O rancho das estrelas
Fez também um seresteiro para conversar com elas
Fez a lua que prateia minha estrada de sorrisos
E a serpente que expulsou mais de um milhão do paraíso

Foi Deus que fez você
Foi Deus que fez o amor
Fez nascer a eternidade num momento de carinho
Fez até o anonimato dos afetos escondidos
E a saudade dos amores que já foram destruídos
Foi Deus

Foi Deus que fez o vento
Que sopra os seus cabelos
Foi Deus que fez o orvalho
Que molha o seu olhar, teu olhar
Foi Deus que fez a noite
E o violão plangente
Foi Deus que fez a gente
Somente para amar
Só para amar

Amelinha ficou em 2º lugar com esta música no Festival MPB realizado em 1980 pela TV Globo. Perla e Margareth Menezes fizeram belas regravações da canção.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Como cada signo diz " Eu Te Amo "

Áries:
Preciso lhe dizer que amo você e decidir como resolveremos isso...

Touro:
Tá, é verdade, eu te amo... mas não tô cobrando nada! Sei lá, depende de você...

Gêmeos:
Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo...

Câncer:
Você sabe que eu te amo, não sabe??

Leão:
Quando é que você vai perceber que eu te amo?!

Virgem:
Há muito tempo que eu estava para falar como eu amo você...

Libra:
Eu te amo muito... Apesar, é claro, das nossas diferenças...

Escorpião:
Será que eu estou falando grego?! Eu te amo, caramba!!

Sagitário:
Eu amo você, mas entenderei perfeitamente se não for recíproco...

Capricórnio:
Bom, eu te amo, como já deve notar. Pense nisso que depois conversaremos...

Aquário:
Antes de mais nada, eu amo você...

Peixes:
Oh, meu amor... minha vida... como te quero... como te amo...

Ossos do Ofício

                  Uma senhora pega um táxi e indica a direção do hotel onde está hospedada.
                  O taxista, por incrível que pareça, nada disse durante todo o percurso, até que a senhora resolveu fazer-lhe uma pergunta e tocou levemente seu ombro.
                   Ele gritou, perdeu o controle do carro e, por pouco, não provocou um acidente de terríveis proporções!
                   - Francamente... como é que eu ia saber que você dirige tão displicentemente ao ponto de quase ter um treco por conta de um simples toque no ombro?!
                    - Não me leve a mal, senhora, mas... é que esse é o meu primeiro dia como taxista!
                    - E o que o senhor fazia antes disso? - perguntou ela.
                    - Eu, por 25 anos, fui motorista de carro funerário...

Causo

                   Certo dia, eu estava na estrada com meu 147, e como era de se esperar, a jabiraca quebrou. Então, encostei o podrão  no acostamento e fiquei esperando alguém passar. Apareceu um Porsche Boxter bi-turbo, a 170 km/h.
                   Nisso, o cara do Porsche dá marcha ré e volta até o Fiat. Ele se oferece para rebocar a porra do Fiat, e eu aceitei a ajuda, mas pedi para não correr muito senão a jabiraca desmontava (óbvio!). E combinei que piscaria o farol toda vez que o Porsche estivesse correndo demais.
                   Então, o Porsche começou a rebocar a jabiraca e toda vez que passava de 60 km/h, eu fazia sinal com o farol (no singular mesmo!), porque para variar um deles estava em curto e não funcionava. E o cara do Porsche ia puxando a batedeira a 60 km/h no máximo, morrendo de tédio... Então aparece um Mitsubishi 3000 GT, que intima o Porsche. Este, não deixa barato e vai pro pau! 120, 130, 150, 190, 210, 240 km/h.
                    Eu já tava desesperado, piscando o farol que nem um louco e os dois alinhados...
                    Os caras passaram por um Posto Policial, mas nem veem o radar, que registra impressionantes 240 km/h!!
                    Então, o policial avisa pelo rádio o próximo Posto:
                    - " Atenção, um Porsche vermelho e um Mitsubishi preto disputando racha a mais de 240 km/h
na estrada, e juro pela minha mãezinha... um Fiat 147  atrás deles dando sinal de luz para ultrapassar... "

Puculando...

                  Desesperado, o chefe olha para o relógio e já não acreditando que um funcionário chegaria a tempo de fornecer uma informação importantíssima para uma reunião que estava começando, liga para o dito cujo:
                  - Alô - atende uma voz de criança, quase sussurrando.
                  - Alô, seu pai está?
                  - Tá... - ainda sussurrando.
                  - Posso falar com ele?
                  - Não - disse a criança bem baixinho.
                  Meio sem graça, o chefe tenta falar com algum outro adulto:
                  - E a sua mamãe? Ela está aí?
                  - Tá...
                  - Ela pode falar comigo?
                  - Não. Ela tá ocupada.
                  - Tem mais alguém aí??
                  - Tem... - sussurra.
                  - Quem?
                  - A puliça...
                  Um pouco surpreso, o chefe continua:
                  - O que ele tá fazendo aí?
                  - Ele tá conversando com o papai, com a mamãe e com o bombelo...
                  Ouvindo um grande barulho do outro lado da linha, o chefe pergunta assustado:
                  - Que barulho é esse?
                  - É o licópito...
                  - Um helicóptero?!
                  - É. Ele tloce uma equipe de busca!
                  - Minha nossa! O que está acontecendo por aí? - o chefe pergunta, já desesperado.
                  E a voz sussurra com um risinho safado:
                  - Eles tão me puculando...

sábado, 6 de novembro de 2010

Super-Homem - a canção

                                                                  Gilberto Gil

Um dia
Vivi a ilusão de que ser homem bastaria
Que o mundo masculino tudo me daria
Do que eu quisesse ter
Que nada
Minha porção mulher que até então se resguardara
É a porção melhor que trago em mim agora
E que me faz viver
Quem dera
Pudesse todo o homem compreender
Ó mãe, quem dera,
Ser o verão, o apogeu da primavera
E só por ela ser
Quem sabe
O super-homem venha nos restituir a glória
Mudando como um deus o curso da história
Por causa de mulher

Se eu não estiver enganado, o primeiro filme da série Super-Homem foi em 1978. Quase no final, um terremoto em um local deserto, engole o carro da jornalista que era a paixão do personagem. Como ele vai
salvar algumas pessoas, chega tarde na região onde está a garota. Não me lembro se ela grita ou ele vê ou sente alguma coisa, o certo é que, chegando mais próximo ele percebe que o carro está totalmente destruído e a mulher já sem vida. Transtornado com a cena, ele sobe e sai da Terra. Desesperado, ele velozmente gira
em movimento contrário e faz o tempo voltar para salvar a doce amada... Acredito que Gil inspirou-se nesse final para também finalizar sua música, alíás, sua bela poesia!!


Porta do Sol

                    Flávio Eduardo

Somos a porta do sol
Deste país tropical
Somos a mata verde, a esperança
Somos o sol do extremo oriental

A lua fez um poema
Nas palhas do coqueiral
Eu escrevi seu nome nas areias
No coração do extremo oriental

A luz do interior
Brilhou lá na capital
E clareou o céu na Borborema
No Cariri do extremo oriental

Salve o sertão, o brejo, a Borborema
Que vem saudar o extremo oriental
O calor do verão chegou pra te abraçar
Essa alegria é beira de mar

música de abertura do segundo disco da cantora Renata Arruda; o cd é lindo...

Estrada de Canindé

                  Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira


Ai, ai, que bom
Que bom
Que bom que é
Uma estrada e uma cabocla
Como a gente andando a pé

Ai, ai, que bom
Que bom
Que bom que é
Uma estrada e a lua branca
No sertão de Canindé
Automóvel lá nem se sabe
Se é homem ou se é mulher
Quem é rico anda em burrico
E quem é pobre anda a pé

Mas o pobre vê nas estradas
O orvalho beijando a flor
Vê de perto o galo campina
Que quando canta muda de cor
Vai molhando os pés no riacho
Que água fresca,
Nosso Senhor!
Vai olhando coisa a granel
Coisas que pra mó de vê
Um cristão tem que andar a pé

bonita gravação da cantora Carmélia Alves

Filho de Santa Maria

                   Itamar Assumpção/Paulo Leminski

Hoje eu saí lá fora
Como se tudo já tivesse havido
Já tivesse havido a guerra
A festa
Já tivesse havido
E eu, e eu, e eu
Fosse puro espírito
E eu, e eu, e eu
Fosse puro espírito

Aqui tô eu pra te proteger
Dos perigos da noite, do dia
Sou fogo, sou terra, sou água, sou gente
Eu também sou filho de Santa Maria

Se Dona Maria soubesse
Que o filho pecava e pecava tão lindo
Pegava o pecado e jogava de lado
E fazia da Terra uma estrela
Sorrindo

música da CD " Mais Simples ", de 1996, da cantora Zizi Possi

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Boa Resposta

         Aconteceu na PUC-RS:
         Uma professora universitária estava acabando de dar as últimas
orientações para os alunos acerca da prova final que ocorreria no dia seguinte.
         Finalizou alertando que não haveria desculpas para a falta de nenhum aluno,
com exceção de um grave ferimento, doença ou morte de algum parente próximo.
         Um engraçadinho que sentava no fundo da classe, perguntou com aquele velho ar de cinismo:
         - Dentre esses motivos justificados, podemos incluir o de extremo cansaço por atividade
sexual??
         A classe explodiu em gargalhadas, com a professora aguardando pacientemente que o silêncio
fosse restabelecido. Tão logo isso ocorreu, ela olhou para o palhaço e respondeu:
        - Isto não é motivo justificado. Como a prova será em forma de múltipla escolha, você pode
vir para a classe e escrever com a outra mão... ou, se não puder sentar-se, pode respondê-la
em pé...

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

" Esselentíssimo Juiz "

Certa vez, ao transitar pelos corredores do fórum, fui chamado
por um dos juízes ao seu gabinete.
- Olha só que erro ortográfico grosseiro temos nessa petição!!!
Estampado logo na primeira linha do petitório lia-se:
" esselentíssimo juiz ".
Gargalhando, o magistrado perguntou:
- Por acaso esse advogado foi seu aluno na Faculdade?
- Foi sim - reconheci.
Mas onde está o erro ortográfico a que o senhor se refere?
O juiz pareceu surpreso:
- Ora meu caro, acaso você não sabe como se escreve a palavra
excelentíssimo?
Então expliquei-me:
- Acredito que a expressão pode significar duas coisas
diferentes. Se o colega desejava se referir
à excelência dos seus serviços,
o erro ortográfico efetivamente é grosseiro. Entretanto, se fazia
alusão à morosidade da prestação jurisdicional, o equívoco
reside apenas na junção inapropriada de duas palavras.
O certo, então, seria dizer " esse lentíssimo juiz ".
Depois disso, aquele magistrado nunca mais aceitou com
naturalidade, o tratamento de excelentíssimo juiz.
Sempre pergunta:
- Devo receber a expressão como extremo de excelência
ou como superlativo de lento?


Significação Múltipla

O uso do vocábulo merda é uma questão de educação. Ninguém pode negar que o utilizamos para múltiplas circunstâncias relacionadas com muitíssimas coisas. Por exemplo:
1- Orientação geográfica:
" vá à merda! "
2- Adjetivo qualificativo:
" você é um merda! "
3- Momento de ceticismo:
" não acredito em merda nenhuma! "
4- Desejo de vingança:
" vou fazê-lo virar merda! "
5- Acidente:
" fez merda, né?! "
6- Efeito visual:
" não se enxerga merda nenhuma! "
7- Sensação olfativa:
" cheira a merda... "
8- Dúvida na despedida:
" por que você não vai à merda? "
9- Especulação de conhecimento:
" que merda é será isto? "
10- Momento de surpresa:
" merda!! "
11- Atitude de ressentimento:
" não me deu merda nenhuma de presente! "
12- Sensação gustativa:
" isto tem gosto de merda! "
13- Admiração:
" puta merda! "
14- Ato de impotência:
" esta merda não fica dura! "
15- Desejo de ânimo:
" rápido com essa merda! "
16- Situação de desordem:
" tudo está uma merda! "
17- Rejeição, despeito:
" o que ele pensa, essa merda? "
18- Situação alquimista:
" tudo o que ele toca vira merda! "
19- Crise das 18 horas:
" ainda bem que estou indo embora dessa merda!! "

" Vendedô Ezemplá "

O gerente de vendas recebeu o seguinte fax de um dos seus novos vendedores:
" Seo Gomis, o criente de belzonte pidiu mais cuatrucenta pessa. Faz favor toma as
providenssa, Abrasso, Nirso. "
Aproximadamente uma hora depois, recebeu outro:
" Seo Gomis, os relatorio di venda vai xega atrazado proque to fexando umas venda. Temo
que manda treis mil pessa. Amanha to xegando Abrasso, Nirso."
No dia seguinte:
" Seo Gomis, num xeguei pucausa de que vendi maiz deis miu em Beraba.
To indo pra Brazilha. Abrasso, Nirso ".
No outro:
" Seo Gomis, Brazilha fexo 20 miu. Vo pra Frolinopolis e de lá pra Sum Paulo no vinhão das
cete hora. Abrasso, Nirso ".
E assim foi o mês inteiro.
O gerente, muito preocupado com a imagem da empresa, levou ao presidente as mensagens que
recebeu do vendedor.
O presidente, um homem muito preocupado com o desenvolvimento da empresa e com a cultura dos
funcionários, escutou atentamente o gerente e disse:
- Deixa comigo, que eu tomo as providências necessárias. E tomou.
Redigiu de próprio punho um aviso e afixou no mural da empresa, juntamente com os faxes do vendedor:
" A parti de oje tudo vamo fazê feito o Nirso. Si priocupá menos em iscrevê serto, mode vendê
maiz. Acinado, O prizidenti. "

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

trecho de Erich Fromm

 

As ideias não influenciam o homem
profundamente quando são apenas ensinadas como
ideias e pensamentos. Usualmente, quando
apresentadas de tal maneira, modificam outras ideias;
novos pensamentos assumem o lugar de antigos
pensamentos, novas palavras tomam o lugar de velhas
palavras. Mas tudo o que aconteceu foi uma mudança
de conceitos e nas palavras. Por que seria diferente?
É extremamente difícil para o homem ser mobilizado
por ideias e apreender uma verdade. Para fazê-lo, ele
precisa superar as resistências profundamente
enraizadas da inércia, o medo de estar errado ou de
afastar-se do rebanho. O simples travar
conhecimentos com outras ideias, não é o bastante,
embora essas ideias, em si mesmas, sejam corretas e
poderosas. Mas as ideias só têm, realmente, um efeito
sobre o homem quando vividas por aquele que as
ensina, quando são personificadas pelo professor,
quando a ideia aparece encarnada. Se um homem
expressa a ideia de humildade, aqueles que o escutam
Compreenderão o que é a humildade. Não apenas
compreenderão, como também acreditarão que ele
está falando de uma realidade e não apenas
proferindo palavras. O mesmo se aplica a todas as
ideias que um homem, um filósofo ou um mestre
religioso possam tentar transmitir.

Esse Moço

                    Joanna/Fátima Leão/Elias Muniz

Deus, eu quero ver aquele moço
Bem mais perto de mim
Teus olhos têm o verde
Bem mais verde do que o verde capim
Quando eu lhe vejo
Até pareço um beija-flor de manhã
Sobrevoando os campos
Pra beijar a doce flor da maçã
Deus, por esse moço eu me arrasto
Feito cobra no chão
Escondo meu veneno e me entrego
Com amor e paixão
Sem ele eu me perco
Fico feito sabiá sem laranjeira
Sem ele sou bom dia de ressaca
Em dia de segunda-feira
Sem ele sou alguém pela metade
Sou um grito de saudade
Sufocado e sem razão, sem ele
Sem ele, eu me sinto uma cidade
Destruída na maldade
Pela força de um vulcão
Com ele posso ser um colibri
Canarinho e bem-te-vi
Preso ou livre mundo afora
Com ele sou visita inesperada
Que não tem hora marcada
E nem pressa de ir embora

Esta música pertence ao CD " Alma, Coração e Vida ", gravado pela cantora Joanna em 1993.
Durante muitos anos, tive uma história de amor mal resolvida, platônica, digamos assim, porque o jovem em questão, o tal dos olhos verdes, desapareceu sem deixar sinais. Fiquei com esse sentimento guardado durante muito tempo, sem saber o que fazer com ele (o sentimento). Eu ilustrava com músicas ou poemas para não enlouquecer. Ainda bem que consegui sobreviver!! Recentemente, descobri a pessoa e conversamos muito sobre tudo o que aconteceu... Não sei se consegui resolver , mas pelo menos, pude falar com ele sobre ele (o sentimento) e descobri que era recíproco. Uma pena que não conseguimos viver a história de amor naquele tempo (início dos anos 90), porque hoje somos pessoas diferentes e não seria a mesma coisa...

Iolanda

                 Pablo Milanés & Chico Buarque


Esta canção
Não é mais que mais uma canção
Quem dera fosse uma declaração de amor
Romântica
Sem procurar a justa forma
Do que me vem de forma assim tão caudalosa
Te amo, te amo
Eternamente te amo

Se me faltares
Nem por isso eu morro
Se é pra morrer
Quero morrer contigo
Minha solidão
Se sente acompanhada
Por isso às vezes sei que necessito
Teu colo, teu colo
Eternamente teu colo

Quando te vi
Eu bem que estava certo
De que me sentiria descoberto
A minha pele
Vais se despindo aos poucos
Me abres o peito quando me acumulas
De amores, de amores
Eternamente de amores

Se alguma vez
Me sinto derrotado
Eu abro mão do sol de cada dia
Rezando o credo
Que tu me ensinaste
Olho teu rosto e digo à ventania
Iolanda, Iolanda
Eternamente Iolanda
Iolanda
Eternamente Iolanda
Eternamente Iolanda

Esta música é lindíssima e tem uma história especial pra mim. Quero dedicar a duas pessoas que não estão mais nesse Plano... Espero que estejam no Nosso Lar!!

Mulheres do Brasil

                             Joyce

No tempo em que a maçã foi inventada
Antes da pólvora, da roda e do jornal
A mulher passou a ser culpada
Pelos deslizes do pecado original
Guardiã de todas as virtudes
Santas e megeras, pecadoras e donzelas
Filhas de Maria ou deusas lá de Hollywood
São irmãs porque a mãe natureza fez todas tão belas
Tão belas...
Ó mãe, ó mãe,
Nossa mãe
Abre teu colo generoso
Parir, gerar, criar e provar nosso destino valoroso,
São donas de casa, professoras, bailarinas,
Moças, operárias, prostitutas, meninas
Lá do breu das brumas vem chegando a bandeira
Saúda o povo e pede passagem à mulher brasileira.

Música do disco " Maria " de Maria Bethânia, gravado em 1988

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Quem Te Viu, Quem Te Vê

                            Chico Buarque


Você era a mais bonita das cabrochas dessa ala
Você era a favorita onde eu era meste-sala
Hoje a gente nem se fala, mas a festa continua
Suas noites são de gala, nosso samba ainda é na rua

Hoje o samba saiu procurando você
Quem te viu, quem te vê
Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
Quem jamais a esquece não pode reconhecer

Quando o samba começava, você era a mais brilhante
E se a gente se cansava, você só, seguia adiante
Hoje a gente anda distante do calor do seu gingado
Você só dá chá dançante, onde eu não sou convidado

O meu samba se marcava na cadência dos seus passos
O meu sono se embalava no carinho dos seus braços
Hoje de teimoso eu passo bem em frente ao seu portão
Pra lembrar que sobra espaço no barraco e no cordão

Todo ano eu lhe fazia uma cabrocha de alta classe
De dourado eu lhe vestia pra que o povo admirasse
Eu não sei bem com certeza por que foi que um belo dia
Quem brincava de princesa acostumou na fantasia

Uma das músicas mais bonitas do Chico. Observe as rimas internas e externas.
Coisa de gênio... Demais!!

Tá Combinado

                      Caetano Veloso


Então tá combinado, é quase nada
É tudo somente sexo e amizade
Não tem nenhum engano, nem mistério
É tudo só brincadeira e verdade.
Podermos ver o mundo juntos,
Sermos dois e sermos muitos
Nos sabermos sós sem estarmos sós.
Abrirmos a cabeça
Para que afinal floresça
O mais que humano em nós.
Então tá tudo dito
E é tão bonito
E eu acredito
Num claro futuro
De música, ternura e aventura
Pro equilibrista em cima do muro.

Mas e se o amor pra nós chegar
De nós, de algum lugar
Com todo o seu tenebroso esplendor?
Mas e se o amor já está,
Se há muito tempo que chegou
E só nos enganou?
Então não fale nada,
Apague a estrada
Que seu caminhar já desenhou
Porque toda razão, toda palavra
Vale nada quando chega o amor.

Música do disco " Maria " de Maria Bethânia, lançado em 1988.

Espanhola

                   Flávio Venturini & Guttemberg Guarabyra

Por tantas vezes
Eu andei mentindo
Só por não poder
Te ver chorando

Te amo Espanhola
Te amo Espanhola
Se for chorar
Te amo

Sempre assim
Cai o dia e é assim
Cai a noite e é assim
Essa lua sobre mim
Essa fruta sobre o meu paladar

Nunca mais
Quero ver você me olhar
Sem me entender em mim
Eu preciso lhe falar
Eu preciso eu tenho que lhe contar

Esta música dispensa comentários. Desde novo, eu a ouço constantemente...
Uma das muitas ouvidas nos bares da minha cidade!!