quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Mensagem

Entre! - disse Deus pra mim - Então você gostaria de Me entrevistar?
- Se o Senhor tiver um tempinho...
Ele sorriu de forma tranquilo dizendo:
- Meu tempo chama-se eternidade. O que você gostaria de Me perguntar?
- Nada de novo para o Senhor. O que o surpreende mais nos seres humanos?
Nem parou para pensar. Parece que as respostas sempre estiveram lá, esperando por alguém que as quisesse ouvir:
- Que eles se cansam de serem crianças, têm pressa em crescer, mas depois lamentam não serem mais pequenos. Que eles perdem sua saúde para ganhar dinheiro e então perdem seu dinheiro para recuperar a saúde... Que, por tanto pensar em seu futuro, acabam se esquecendo do presente, de tal forma, que não vivem nem no presente ou no futuro. Que eles vivem como se nunca fossem morrer e morrem como se nunca tivessem vivido...
Suas mãos agarraram as minhas e houve silêncio. Ainda pensando em Suas palavras, tomei fôlego e disse:
- Posso perguntar mais uma coisa?
Ele apenas sorriu. Notei, entretanto, que, por trás daquele gesto, havia um quê de desapontamento e tristeza. A imagem era emocionante. Lágrimas podiam ser vistas forçando a saída de Seus profundos olhos. Eu sabia que era responsável por essa situação. Era momento de deixar de ser repórter e virar filho:
- Pai - aos prantos, perguntei: - o que o Senhor pediria que nós, Seus filhos, fizéssemos neste novo ano?
- Que aprendam que não podem fazer com que todos os amem, mas que deixem ser amados. Que aprendam que leva anos para construir a confiança e apenas alguns segundos para destruí-la. Que aprendam que o mais valioso não é o que têm em suas vidas, mas quem têm em suas vidas. Que aprendam que não é bom comparar-se aos outros, pois sempre haverá melhores e piores. Que aprendam que uma pessoa rica não é aquela que tem mais, mas aquela que precisa menos. Que aprendam que devem controlar seus ímpetos, para não serem controlados por eles. Que aprendam que bastam apenas alguns instantes para abrir profundas feridas em quem amamos, mas anos para curá-las. Que aprendam que existem pessoas que os amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar seus sentimentos. Que aprendam que dinheiro compra tudo, menos a felicidade. Que aprendam que, embora tenham o direito de entristecer-se, não têm o direito de entristecer os outros. Que aprendam que grandes sonhos não precisam de asas para serem alcançados, mas de uma pista de pouso para se tornarem realidades. Que aprendam que nem sempre é suficiente ser perdoado pelos outros: vocês precisam perdoar a si mesmos. Que aprendam que são mestres do que possuem e escravos do que dizem. Que aprendam que a verdadeira felicidade não é conquistar seus objetivos, mas estar satisfeito com o que já conquistou. Que aprendam que duas pessoas podem olhar para a mesma coisa e ver algo totalmente diferente. Que aprendam que mesmo que pensem não possuir nada para dar, têm dentro de si o maior dos presentes. Que aprendam que amar é o melhor meio de aproximar as pessoas. Que aprendam que até mesmo a palavra " amar " tem vários significados. Que aprendam que não precisam fazer algo extraordinário para que Eu os ame: Eu simplesmente o faço. Que aprendam que a menor distância que vocês, meus filhos possam estar de mim é... uma prece.

autoria desconhecida

O Escritor e o Suicídio

                                 Luís Fernando Veríssimo

Depois de fazer o laço da forca e colocar uma cadeira embaixo, o escritor sentou-se atrás de sua mesa de trabalho, ligou o computador e digitou: " No fundo, no fundo, os escritores passam o tempo todo redigindo a sua nota suicida. Os que se suicidam mesmo são os que a terminam mais cedo. "

Levantou-se, subiu na cadeira sob a forca e colocou a forca no pescoço. Depois retirou a forca do pescoço, desceu da cadeira, voltou ao computador e apagou o segundo " no fundo " . Ficava mais enxuto. Mais categórico. Releu a nota e achou que estava curta. Pensou um pouco, depois acrescentou:

" Há os que se suicidam antes para escapar da terrível agonia de encontrar um final para a nota. O suicídio substitui o final. O suicídio é o final. "

Levantou-se, subiu na cadeira, colocou a forca no pescoço e ficou pensando. Lembrou-se de uma frase de Borges. Encaixa, pensou, retirando a corda do pescoço descendo da cadeira e voltando ao computador. Digitou: " Borges disse que o escritor publica seus livros para livrar-se deles, senão passaria o resto da vida escrevendo-os. O suicídio substitui a publicação. O suicídio é a publicação. No caso, o livro livra-se do escritor. "

Levantou-se, subiu na cadeira, mas desceu da cadeira antes de colocar a forca no pescoço. Lembrara-se de outra coisa. Voltou ao computador e, entre o penúltimo e o último parágrafo, inseriu: " Há escritores que escrevem um grande livro, ou uma grande nota suicida, e depois nunca mais conseguem escrever outro. Atribuem a um bloqueio, ao medo do fracasso. Não é nada disso. É que escrevem a nota, mas esqueceram-se de suicidar. Passam o resto da vida sabendo que faltou alguma coisa na sua obra e não sabendo o que é. Faltou o suicídio. "

Levantou-se, ficou olhando a tela do computador, depois sentou-se de novo. Digitou: " No fundo, no fundo, a agonia é saber quando se terminou.  Há os que não sabem quando chegaram ao final da sua nota suicida. Geralmente são escritores de uma obra extensa. A crítica elogia a sua prolixidade, a sua experimentação com formas diversas. Não sabe que ele não consegue é terminar a nota. "

Desta vez não se levantou. Ficou olhando a tela, pensando. Depois acrescentou: " É claro que o computador agravou a agonia. Talvez uma nota suicida definitiva só possa ser manuscrita ou datilografada à moda antiga, quando o medo de borrar o papel com correções e deixar uma impressão de desleixo para a posteridade, leva o autor a ser preciso e sucinto. "

Tese: é impossível escrever uma nota de suicídio no computador.

Era isso? Ele releu o que tinha escrito. Apagou o segundo " no fundo ",

Era isso. Por via das dúvidas, guardou o texto na memória do computador. No dia seguinte o revisaria. E foi dormir.

A lenda das três árvores

                             Havia no alto da montanha três árvores que sonhavam o que seria depois de grandes.
                             A primeira, olhando as estrelas, disse: " Eu quero ser o baú mais precioso do mundo, cheio de tesouros ".
                             A segunda, olhando o riacho, suspirou: " Eu quero ser um navio grande para transportar reis e rainhas ".
                              A terceira olhou para o vale e disse: " Quero ficar aqui no alto da montanha e crescer tanto que as pessoas, ao olharem para mim, levantem os olhos e pensem em Deus ". 
                             Muitos anos se passaram e certo dia três lenhadores cortaram as árvores que estavam ansiosas em serem transformadas naquilo que sonhavam. Mas os lenhadores não costumavam ouvir ou entender de sonhos... Que pena!
                              A primeira árvore acabou sendo transformada em um cocho de animais coberto de feno.
                              A segunda virou um simples barco de pesca, carregando pessoas e peixes todos os dias.
                              A terceira foi cortada em grossas vigas e colocadas de lado num depósito.
                              Então, desiludidas e tristes, as três perguntaram: " Por que isso? "
                              Entretanto, uma bela noite, cheia de luz e estrelas, uma jovem mulher colocou seu bebê
recém-nascido naquele cocho de animais. E de repente, a primeira árvore percebeu que continha o maior tesouro do mundo.
                              A segunda árvore estava transportando um homem que acabou por dormir no barco em que se transformara. E quando uma tempestade quase afundou o barco, o homem levantou-se e disse: " Paz ".
                              E, num relance, a segunda árvore entendeu que estava transportando o Rei do céu e da Terra!
                              Tempos mais tarde, numa sexta-feira, a terceira árvore espantou-se quando suas vigas foram unidas em forma de cruz e um homem foi pregado nela.
                               Logo sentiu horrível e cruel. Mas, no domingo seguinte, o mundo vibrou de alegria.
                               E a terceira árvore percebeu que nela havia sido pregado um homem para a salvação da humanidade e que as pessoas sempre se lembrariam de Deus e de seu Filho ao olharem para ela.
                               As árvores haviam tido sonhos e desejos. Mas sua realização foi mil vezes maior do que haviam imaginado.
                               Portanto, não se esqueça: não importa o tamanho do seu sonho! Acreditando nele, sua vida ficará mais bonita e muito melhor de ser vivida!
                             

autoria desconhecida
                              

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Espelho, Espelho Meu

Um historiador de 2092 que se debruçar sobre os jornais, revistas e vídeos de cem anos antes sofrerá a tentação de definir a época atual como a Era de Narciso. Strip-teases de homens musculosos, fotos eróticas como as da cantora Madonna, a proliferação das academias de ginástica - todas essas informações contribuirão para que o estudioso do futuro chegue à conclusão de que os seus antepassados não saíam da frente do espelho e tinham como principal ocupação exibir-se uns para os outros. " Se o final do século XIX foi marcado pelo niilismo ou descrença, os últimos anos do século XX tiveram como característica o narcisismo ", poderia escrever o hipotético pesquisador.

A novidade, porém, é que o narcisismo nem sempre é ruim. " O narcisismo faz parte da personalidade humana e pode existir em vários graus, desde o patológico e negativo até o saudável e positivo ". É o que afirma a psicoterapeuta Raíssa Cavalcanti, chamando a atenção para o fato de que, ao contrário do que se supõe, o narcisista negativo não gosta de si próprio e sofre por causa disso. " Atrás da máscara mostrada socialmente, existe uma pessoa com profundos sentimentos de inferioridade, dependência e fragilidade. Por maior que seja o seu sucesso, alguém assim experimenta a vida como algo vazio, triste e sem significado ", esclarece Raíssa. Entretanto, acrescenta que o narcisismo de um indivíduo pode estar relacionado a condições culturais, pois existem também sociedades narcisistas. " Uma sociedade é narcisista quando é mais valorizado o ter que o ser. Quando a busca da notoriedade substitui a da dignidade ", afirma ela.

adaptado da revista IstoÉ, 23.12.1992.

Cora Coralina

                        Marcelo Barra/Rinaldo Barra

Mulher da terra
 Ao pé da serra
Velha menina
Voa e me ensina a ser passarinho
Que bebe da fonte e volta pro ninho

Cora, da casa da ponte
Dos versos, do tempo
Do rio que leva
Segredos de Ana
Pra algum lugar

Coralina coragem
Coralina coração
Flor do tempo
Força e vontade
Pedra por pedra
Ana por Ana

Cora senhora
No espelho de agora
A ponte, o rio
Os sonhos de outrora
Mulher passarinho
Que bebe da água
E volta pro ninho

Coralina coragem
Coralina coração
Flor do tempo
Força e coragem
Pedra por pedra
Ana por Ana

Crítica Positiva

                           Caco de Paula
                                      Amigo é quem, com compaixão e sabedoria,
                                      ajuda o outro a enxergar melhor a si mesmo.

                                  Amor, meus amigos têm razão. Aqui, por escrito, pareço muito mais amoroso do que quando estou aí ao seu lado, desferindo aqueles golpes verbais, que às vezes machucam. Aqui, pareço mais sensato, espiritual, tranquilo. De corpo presente, às vezes sou hormonal, impulsivo - e quase sempre falo mais do que precisava falar. Aqui, vou me tornando refém deste personagem que se deslumbra com sabedorias. Com você, tropeço na incoerência, torno-me imprevisível, causo desapontamentos. Aqui, por escrito, escolho as palavras, edito meus pensamentos. Aí, sou mais real, às vezes cruel. E nem sempre percebo isso. Que bom é ter amigos que nos mostram como somos humanos, imperfeitos humanos, demasiadamente humanos.
                                  Deveríamos agradecer todos os dias por ter quem discorde de nós e nos critique. Verdadeiros amigos fazem isso. São espelhos reais. Quem não se vê como realmente é flutua por aí, fora de órbita. É muito fácil inflar como um balão e perder o contato com o chão. Conta-se que um grande imperador, quando chegava vitorioso de suas batalhas e era carregado em triunfo pelo povo, fazia-se acompanhar de um escravo, encarregado de dizer-lhe no ouvido algo que o impedisse de ser hipnotizado por toda aquela louvação: " Você é calvo, barrigudo, está envelhecendo e um dia irá morrer ". Esse incisivo choque de realidade funcionava como um eficiente antídoto contra o ego inflado.
                                   Talvez estivesse faltando um pouco desse antídoto para mim. Assim, você haveria de compreender que eu não digo certas coisas por mal. Talvez, como acontece na maioria das vezes, tenha dito apenas para não perder a piada. Insensatez. Quando o que nos domina é a mente afiada, a agilidade verbal, a vaidade de nos sentirmos inteligentes e implacáveis, podemos ser muito cínicos e cruéis. Em alguns ambientes pretensiosamente intelectualizados, esse cinismo chega a ser estimulado e confundido com bom humor - quando na verdade é uma arma afiada pronta pra ferir, demonstrar desprezo, destilar mágoa, explodir em raiva.
                                  Que bom seria se pudéssemos agir mais com o coração. Há um desafio aí, um equilíbrio que nem sempre se consegue manter. E uma oportunidade para entender melhor o que é compaixão. Compaixão não é ter piedade, misericórdia, dar tapinhas nas costas do outro, indulgentemente. Compaixão é sentir o que o outro sente e, às vezes, quando preciso, é dizer ao amigo umas verdades. Como meus amigos já me disseram. Eles também agiram com sabedoria. Apenas a sabedoria, sem compaixão, também seria insuficiente. Ainda que fosse a mesma verdade, ela viria de uma forma cortante, dura e fria. Assim, ouvi o que tinha de ouvir, mas o que me foi dito chegou de maneira amorosa, com coração tocando coração. Espero também poder ser um bom amigo para os amigos. Espero agir com compaixão e sabedoria. Não só aqui, enquanto escrevo estas palavras, mas também aí, quando estiver com você. Talvez eu seja capaz de resistir à piada fácil e à esgrima verbal.

Este texto é Dedicado a Você! Eu sei que você não vai lê-lo pois desconhece este espaço. De qualquer maneira, teria sido o que eu gostaria de dizer, mas que você não quis escutar...

O Samurai

Perto de Tóquio vivia um grande samurai, já idoso, que agora se
dedicava a ensinar o zen aos jovens.
Apesar de sua idade, corria a lenda de que ainda era capaz de derrotar
qualquer adversário.
Certa tarde, um guerreiro conhecido por sua total falta de escrúpulos
apareceu por ali. Era famoso por utilizar a técnica da provocação:
esperava que seu adversário fizesse o primeiro movimento e, dotado de
uma inteligência privilegiada para reparar os erros cometidos, contra-atacava
com velocidade fulminante.
O jovem e impaciente guerreiro jamais havia perdido uma luta.
Conhecendo a reputação do samurai, estava ali para derrotá-lo e
aumentar sua fama.
Todos os estudantes se manifestaram contra a ideia, mas o velho
aceitou o desafio. Foram todos para a praça da cidade e o jovem
começou a insultar o velho mestre.
Chutou algumas pedras em sua direção, cuspiu em seu rosto, gritou
todos os insultos conhecidos, ofendendo inclusive seus ancestrais.
Durante horas fez tudo para provocá-lo, mas o velho permaneceu
impassível.
No final da tarde, sentindo-se já exausto e humilhado, o impetuoso
guerreiro retirou-se.
Desapontados pelo fato de que o mestre aceitou tantos insultos e
provocações, os alunos perguntaram:
- Como o senhor pôde suportar tanta indgnidade? Por que não usou sua
espada, mesmo sabendo que podia perder a luta, ao invés de
mostrar-se covarde diante de todos nós?
- Se alguém chega até você com um presente, e você não o aceita, a quem
pertence o presente? - perguntou o Samurai.
- A quem tentou entregá-lo - respondeu um dos discípulos.
- O mesmo vale para a inveja, a raiva e os insultos - disse o mestre.
- Quando não são aceitos, continuam pertencendo a quem os carregava
consigo. A sua paz interior, depende exclusivamente de você. As
pessoas não podem lhe tirar a calma. Só se você permitir...

O gato é uma lição

                         Artur da Távola


Já viu gato amestrado, de chapeuzinho ridículo, obedecendo às ordens de um pilantra que vive às custas dele? Não! Até o bondoso elefante veste saiote e dança a valsa no circo. O leal cachorro no fundo compreende as agruras do dono e faz a gentileza de ganhar a vida por ele. O leão e o tigre se amesquinham na jaula. Gato não. Ele só aceita uma relação de independência e afeto. E como não cede ao homem, mesmo quando dele dependente, é chamado de arrogante, egoísta, safado, espertalhão ou falso. " Falso ", poruqe não aceita a nossa falsidade com ele e só admite afeto com troca e respeito pela sua individualidade. O gato não gosta de alguém porque precisa gostar para se sentir melhor. Ele gosta pelo amor que lhe é próprio, que é dele e ele o dá se quiser.

Quem não se relaciona bem com o próprio inconsciente não entende o gato. Ele aparece, então, como ameaça, porque representa essa relação precária do homem com o (próprio) mistério. O gato não se relaciona com a aparência do homem. Ele vê além, por dentro e pelo avesso. Relaciona-se com a essência. Se o gesto de carinho é medroso ou substitui inaceitáveis (mas existentes) impulsos secretos de agressão, o gato sabe. E se defende do afago. A relação dele é com o que está oculto, guardado e nem nós queremos, sabemos ou podemos ver. Por isso, quando surge nele um ato de  entrega, de subida no colo ou manifestação de afeto, é algo muito verdadeiro, que não pode ser desdenhado. É um gesto de confiança que honra quem o recebe, pois significa um julgamento.

O homem não sabe ver o gato, mas o gato sabe ver o homem. Se há desarmonia real ou latente, o gato sente. Se há solidão, ele sabe e atenua como pode ( ele que enfrenta a própria solidão de maneira muito mais valente que nós). Se há pessoas agressivas em torno ou carregadas de maus fluidos, ele se afasta.

Lição de saúde sexual e sensualidade. Lição de envolvimento amoroso com dedicação integral de vários dias. Lição de organização familiar e de definição de espaço próprio e território pessoal. Lição de anatomia, equilíbrio, desempenho muscular. Lição de salto. Lição de silêncio. Lição de descanso. Lição de introversão. Lição de contato com o mistério, com o escuro, com a sombra. Lição de religiosidade sem ícones. Lição de alimentação e requinte. Lição de bom gosto e senso de oportunidade. Lição de vida, enfim, a mais completa, diária, silenciosa, educada, sem cobranças, sem veemências, sem exigências.

O gato é uma chance de interiorização e sabedoria posta pelo mistério à disposição do homem.

Portas

                   Içami Tiba

                                Se você abre uma porta: você pode ou não entrar em uma nova sala. Você pode entrar e ficar observando a vida. Mas, se você vence a dúvida, o medo e entra, dá um grande passo.
                                Nesta sala, vive-se... Mas, também, tem um preço...
                                São inúmeras outras portas que você descobre. Às vezes, quebra-se a cara; às vezes curte-se mil e uma... O grande segredo é saber quando e qual porta deve ser aberta. A vida não é rigorosa, ela propicia erros e acertos.
                               Os erros podem ser transformados em acertos, quando com eles se aprende.
                                Não existe a segurança do acerto eterno.
                                A vida é generosa, a cada sala que se vive, descobrem-se tantas outras portas!
                                E a vida enriquece quem se arrisca a abrir novas portas. Ela privilegia quem descobre seus segredos e generosamente oferece afortunadas portas.
                                Mas a vida também pode ser dura e severa. Se você não ultrapassar a porta, terá sempre a mesma porta pela frente.
                                É a repetição perante a criação; é a monotonia de uma só cor perante a multiplicidade das cores; é a estagnação da vida...
                                Para a vida, as portas não são obstáculos, mas...
                                Diferentes paisagens...

Para Repartir Com Todos

                                         Thiago de Mello

Com este canto te chamo
Porque dependo de ti.
Quero encontrar um diamante,
Sei que ele existe e aonde está.
Não me acanho de pedir ajuda
Sei que sozinho nunca vou achar.
Mas desde logo advirto:
Para repartir com todos.
Traz ternura que escondes
Machucada no peito.
Eu levo um resto de infância
Que meu coração guardou.
Vamos precisar de fachos
Para as veredas da noite que oculta,
E, às vezes, defende
O diamante.

Vamos juntos
Traz toda luz que tiveres,
Não te esqueças do arco-íris
Que escondes no porão.
Eu ponho a minha coronga,
De uso na selva, é uma luz
Que se aconchega na sombra.

Não vale desanimar
Nem preferir atalhos
Sedutores que nos perdem,
Pra chegar mais depressa.

Para repartir com todos,
Mesmo com quem não quer vir
Ajudar, falto de sonho.
Com quem preferir ficar
Sozinho bordando de ouro
O seu umbigo engelhado.
Mesmo com quem se fez cego
Ou se encolheu na vergonha
De aparecer procurando
Com quem foi indiferente
E zombou das nossas mãos
Infatigadas na busca,
Mas também com quem tem medo
Do diamante e seu poder,
E até com quem desconfia
Que ele exista mesmo.
E existe:
O diamante se constrói
Quando o procuramos juntos
No meio da nossa vida
E cresce, límpido, cresce,
Na intenção de repartir
O que chamamos de amor.