sábado, 14 de janeiro de 2012

Premunições de Aninha

                             Cora Coralina

Por quê? Você, meu irmão presidiário,
na teia de seu sonho - liberdade - viver além das grades,
paciente, elabora o seu plano de fuga sem o plano consequente
da regeneração?
Dias, meses, noites, o tempo a correr e você, aproveitando
o escasso tempo fugidio.
Paciente, tenaz, ambíguo e dissimulado, ali está roendo
com seus dentes, nervos, ossos e vontade, roendo alicerces, muros e grades.
Afinal, um dia alcança a liberdade desejada.
Por que não partiu para longe, distante, não se engajou
numa frente de trabalho lá na roça, onde ninguém pede documentação,
identidade, e se pôs como trabalhador, a salvo da busca que se faz?
Não, você ficou mesmo perto e de novo voltou à falta, ao erro,
ao crime inicial e de novo a liberdade tolhida, tão penosa de conquistar!
Por quê, meu irmão?

Tempo virá. Uma vacina preventiva de erros e violência se fará.
As prisões se transformarão em escolas e oficinas.
E os homens, imunizados contra o crime, cidadãos de um novo mundo,
contarão às crianças do futuro, histórias absurdas de prisões,
celas, altos muros, de um tempo superado.

Aqueles que acreditam
caminham para a frente
e podem ser chamados
Ludovico, Kubitschek.
Aqueles que duvidam
põem pedras e tropeços nos caminhos dos primeiros.
Jamais constutores.
Capangueiros. Aproveitadores.

pseudônimo da poetisa goiana Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, que nasceu em 1889 e faleceu em 1985.


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