quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Um Cofre Valioso

     Juca e Joca eram dois irmãos. Tinham lá suas diferenças, pois, afinal, cada um é cada um e ninguém é igualzinho a ninguém. No caso dos dois, um era esperto e o outro também.

    O avô deles era um sujeito bigodudo, que passou a vida inteira juntando dinheiro para comprar coisas. Por isso, quando quis dar um presente para os netos, a única coisa que apareceu na sua memória foi um cofre. Vai daí que, um dia, cada um ganhou do avô um cofre, para guardar seu rico dinheirinho ganhado e juntado.

    - Lugar de dinheiro é no cofre! - disse solenemente o avô ao entregar os presentes mal e porcamente embrulhados.

    O cofre de Juca era um porquinho barrigudo, cara de comilão. Ele pegou o porquinho-cofre e correu para o quarto. O cofre de Joca era um elefante, também barrigudo, cara de morto de fome. Ele também correu para o quarto, após ter pego seu cofre-elefante.

    O tempo foi passando e com ele coisas diferentes foram acontecendo. O cofre do Joca, pobre elefante barrigudo e morto de fome, acabou quebrado e jogado num canto qualquer da casa. O cofre do Juca, belo porquinho comilão, tinha uma fome insaciável e estava sempre a querer mais e mais dinheiro. Barrigudinho, o porquinho, cada vez mais cheio, estava sempre na estante. O dinheiro do Joca ia no sorvete, no gibi, no doce... O dinheiro do Juca... ah! esse ninguém via, ninguém sabia.

    Certa vez, Joca apareceu em casa com um álbum de figurinhas de super-heróis completinho. Não faltava nenhunzinho, nem mesmo He Man. Valia uma nota, completinho daquele jeito. Juca, logo que viu o álbum apresentado pelo irmão, encheu os olhos de vontade e foi logo negociando:

    - Quer vender esse álbum pra mim?

    Joca fez cara de importante, dono de ricos tesouros, e respondeu, depois de fingir que não entendera a pergunta:

    - O que você disse?

    Juca, sem perder tempo, foi de novo propondo:

    - Quer vender o álbum?

    - Bem... quanto você me dá por ele?

    Juca pensou, fez cálculos, meteu a mão no bolso e mandou:

    - Te dou duzentos cruzados.

    Joca esbravejou:

    - Você está brincando! Duzentos pelo Super-Homem, pelo Homem-Aranha, pelo He Man... Sabe quando? Nunquinha!

    Ele sumiu com o álbum e, durante alguns dias, os dois não falaram mais sobre o rico tesouro. Até que o Joca, sabe-se lá por quê, propôs:

    - Encontrei um jeito de vender o álbum pra você.

    - Que jeito? - perguntou o Juca, todo interessado na proposta do irmão.

    - Quero o seu cofrinho. Você me dá o cofre-porquinho e está certo.

    Juca espantou-se:

    O meu cofrinho? Mas ele...

    Joca cortou a resposta decidido.

    - É pegar ou largar!

    - Mas o meu cofrinho...

    - É pegar ou largar!

    - Mas o meu cofrinho... ele não...

    - É pegar ou largar!

    - Está bem... eu aceito.

    Joca ficou com o cofrinho e Juca com o álbum. Apenas alguns minutinhos, até Joca voltar gritando e esbravejando:

    - Você me enganou! Você não disse que seu cofrinho estava cheio de palitos de sorvete em vez de dinheiro! - berrou Joca por tudo quanto foi buraco do corpo.

    - Você não me deixou explicar, ora bolas! Eu tentei falar e você não me deixou.

    - Quero meu álbum de volta.

    - Nada disso! Negócio é negócio. Negócio feito não pode ser desfeito.

    Eles ainda trocaram argumentos, palavrões e explicações por alguns momentos, mas depois cada qual seguiu seu caminho.

    A história não terminou aqui: pois não é que dentro do cofrinho havia um palito de sorvete premiado!? E o prêmio... bem, o prêmio... o prêmio era um livro ilustrado, cheinho de fotografias e desenhos de super-heroínas: Mulher Maravilha, Batgirl, Poderosa Isis, She-Ra...

    Sabe o que aconteceu depois? Bem... isso é história para outro história.


Conto de Edson Gabriel Garcia retirado do livro Treze Contos, série Conte Outra Vez, Atual Editora, São Paulo, 1988, 14ª Edição.

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