sexta-feira, 20 de junho de 2025

Formas de sentir-se sozinho (3)

Foi dito que o sentir-se sozinho pode ser uma característica tanto da solidão quanto do isolamento. Entretanto, assume, num e noutro casos, significados diferentes.

No isolamento, o indivíduo pode ser sozinho e: (1º) não perceber que está, quando, por exemplo, se encontra absorto numa tarefa que está fazendo; (2º) perceber e gostar, como acontece, por exemplo, com o homem religioso que prazerosamente se afasta dos outros para fazer sua oração; (3º) perceber e não gostar, como se dá com alguém que, por exemplo, se vê rejeitado do convívio de outras pessoas. Já na solidão, a consciência de estar sozinho persegue insistentemente o indivíduo, e ele vivencia com sentimentos marcantes de insatisfação e desagrado.

O sentir-se sozinho do isolamento é um dado objetivo, isto é, constitui um fato de realidade capaz de ser percebido, pelo menos por um observador que esteja atento. Deste modo, é possível verificar se uma pessoa está isolada ou não, mesmo que ela nada queira dizer sobre o assunto. Já o sentir-se sozinho da solidão não é um dado objetivo mas um estado de alma, que só pode ser conhecido adequadamente se a pessoa solitária nos comunicar e à medida em que fizer isso.

Embora sendo diferentes, o sentir-se sozinho do isolamento e o da solidão podem estar juntos e confundirem-se na mesma pessoa. Com frequência, o primeiro gera o segundo. Mas pode-se encontrar alguém que esteja isolado sem estar solitário, ou que esteja solitário sem estar isolado.

Para quebrar o isolamento, basta, pelo menos em tese (mas na prática pode não ser tão simples), haver algum contato com alguém. O pensamento e o desejo de quem vive isolado pode ser enunciado, talvez, esquematicamente, da seguinte maneira: "Não quero mais ficar sozinho. Por isso, preciso ver gente e procurar alguém para conversar e conviver". Provavelmente, está é a lógica contida nos apelos feitos por obras assistenciais para que as pessoas visitem crianças (em orfanatos), idosos (em casas de repouso), doentes (em hospitais) etc., pois, mesmo que não lhes levem qualquer presente, o simples fato de manifestarem interesse e de conversarem com eles é suficiente para quebrar o isolamento em que vivem.

Mas, quanto à solidão, só a companhia de alguém não é suficiente para vencê-la. De fato, a experiência nos prova que uma pessoa pode estar em relacionamento constante com outras e, no entanto, sentir-se profundamente sozinha. Podemos imaginar, por exemplo, o caso hipotético de um marido e sua mulher que, juntos, sentam-se à mesa para as refeições, conversam muitas vezes durante o dia e até dormem na mesma cama etc. e, apesar disso, pode um deles (ou os dois) afirmar que vive em permanente solidão. Ou, também, o caso de um religioso, que permanece solitário, embora vivendo cercado pelos irmãos de sua comunidade. Ou, finalmente, todos já ouvimos falar da solidão na multidão, em que o indivíduo, embora vivendo cercado de gente numa grande cidade, sente-se, no entanto, profundamente solitário.


Texto de Franz Victor Rúdio retirado do livro Compreensão Humana e Ajuda ao Outro, Editora Vozes, Petrópolis, 1991.

Conferência de abertura do II Encontro de Psicologia do Vale do Paraíba, realizado na Faculdade Salesiana de Filosofia, Ciências e Letras de Lorena, São Paulo. 

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