quarta-feira, 21 de março de 2012

Sentado à beira do caminho

                            Roberto/Erasmo

Eu não posso mais ficar aqui a esperar
Que um dia, de repente, você volte para mim
Vejo caminhões e carros apressados a passar por mim
Estou sentado à beira de um caminho que não tem mais fim
Meu olhar se perde na poeira dessa estrada triste
Onde a tristeza e a saudade de você ainda existem
Esse sol que queima no meu rosto um resto de esperança
De ao menos ver de perto o seu olhar que eu trago na lembrança

Preciso acabar logo com isso
Preciso lembrar que eu existo
Eu existo, eu existo

Vem a chuva e molha o meu rosto e então eu choro tanto
Minhas lágrimas e os pingos dessa chuva
Se confundem com meu pranto
Olho pra mim mesmo, me procuro e não encontro nada
Sou um pobre resto de esperança à beira de uma estrada

Preciso acabar logo com isso
Preciso lembrar que eu existo
Eu existo, eu existo

Carros, caminhões, poeira, estrada, tudo, tudo
Se confunde em minha mente
Minha sombra me acompanha 
E vê que eu estou morrendo lentamente
Só você não vê que eu não posso mais ficar aqui sozinho
Esperando a vida inteira por você
Sentado à beira do caminho

Preciso acabar logo com isso
Preciso lembrar que eu existo
Eu existo, eu existo

Esta música já é um clássico da MPB; gosto de todas as gravações feitas até hoje (que eu conheço).
Retirei do CD Na Ponta da Língua, de Leila Pinheiro, gravado em 1998. A gravação original é a da dupla de autores em um belo dueto. Além da Leila, outras cantoras também regravaram lindamente a canção: Rosana, Wanderléa e, recentemente, Zizi Possi em um dos DVD's comemorativos dos seus 30 anos de carreira intitulado Cantos e Contos.


ela é um recado...

terça-feira, 20 de março de 2012

Trecho 1 (Livro do Desassossego)

                     Fernando Pessoa

Nasci em um tempo em que a maioria dos jovens havia perdido a crença em Deus, pela mesma razão que os maiores a haviam tido - sem saber porquê. E então, porque o espírito humano tende naturalmente para criticar porque sente, e não porque pensa, a maioria desses jovens escolheu a Humanidade para sucedâneo de Deus. Pertenço, porém, àquela espécie de homens que estão sempre na margem daquilo a que pertencem, nem veem só a multidão de que são, senão também os grandes espaços que há ao lado. Por isso nem abandonei Deus tão amplamente como eles, nem aceitei nunca a Humanidade. Considerei que Deus, sendo improvável, poderia ser, podendo pois dever ser adorado; mas que a Humanidade, sendo uma mera ideia biológica, e não significando mais que a espécie animal humana, não era mais digna de adoração do que qualquer outra espécie animal. Este culto da Humanidade, com seus ritos de Liberdade e Igualdade, pareceu-me sempre uma revivescência dos cultos antigos, em que animais eram como deuses, ou os deuses tinham cabeças de animais.

Assim, não sabendo crer em Deus, e não podendo crer numa soma de animais, fiquei, como outros da orla das gentes, naquela distância de tudo a que comumente se chama a Decadência. A Decadência é a perda total da inconsciência; porque a inconsciência é o fundamento da vida. O coração, se pudesse pensar, pararia.

A quem, como eu, assim, vivendo não sabe ter vida, que resta senão, como a meus poucos pares, a renúncia por modo e a contemplação por destino? Não sabendo o que é a vida religiosa, nem podendo sabê-lo, porque se não tem fé com a razão; não podendo ter fé na abstração do homem, nem sabendo mesmo que fazer dela perante nós, ficava-nos, como motivo de ter alma, a contemplação estética da vida. E, assim, alheios à solenidade de todos os mundos, indiferentes ao divino e desprezadores do humano, entregamo-nos futilmente à sensação sem propósito, cultivada num epicurismo subtilizado, como convém aos nossos nervos cerebrais.

Retendo, da ciência, somente aquele seu preceito central, de que tudo é sujeito às leis fatais, contra as quais se não reage independentemente, porque reagir é elas terem feito que reagíssemos; e verificando como esse preceito se ajusta ao outro, mais antigo, da divina fatalidade das coisas, abdicamos do esforço como os débeis do entretimento dos atletas, e curvamo-nos sobre o livro das sensações com um grande escrúpulo de erudição sentida.

Não tomando nada a sério, nem considerando que nos fosse dada, por certa, outra realidade que não as nossas sensações, nelas nos abrigamos, e a elas exploramos como a grandes países desconhecidos. E, se nos empregamos assiduamente, não só na contemplação estética mas também na expressão dos seus modos e resultados, é que a prosa ou o verso que escrevemos, destituídos de vontade de querer convencer o alheio entendimento ou mover a alheia vontade, é apenas como o falar alto de quem lê, feito para dar plena objetividade ao prazer subjetivo da leitura.

Sabemos bem que toda a obra tem que ser imperfeita, e que a menos segura das nossas contemplações estéticas será a daquilo que escrevemos. Mas imperfeito é tudo, nem há poente tão belo que o não pudesse ser mais, ou brisa leve que nos dê sono que não pudesse dar-nos um sono mais calmo ainda. E assim, contempladores iguais das montanhas e das estátuas, gozando os dias como os livros, sonhando tudo, sobretudo, para o converter na nossa íntima substância, faremos também as descrições e análises, que, uma vez feitas, passarão a ser coisas alheias, que podemos gozar como se viessem na tarde.

Não é este o conceito dos pessimistas, como aquele de Vigny, para quem a vida é uma cadeia, onde ele tecia palha para se distrair. Ser pessimista é tomar qualquer coisa como trágico, e essa atitude é um exagero e um incômodo. Não temos, é certo, um conceito de valia que apliquemos à obra que produzimos. Produzimo-la, é certo, para nos distrair, porém não como o preso que tece a palha, para se distrair do Destino, senão da menina que borda almofadas, para de distrair, sem mais nada.

Considero a vida uma estalagem onde tenho que me demorar até que chegue a diligência do abismo. Não sei onde ela me levará, porque não sei nada. Poderia considerar esta estalagem uma prisão, porque estou compelido a aguardar nela; poderia considerá-la um lugar de sociáveis, porque aqui me encontro com outros. Não sou, porém, nem impaciente nem comum. Deixo ao que são os que se fecham no quarto, deitados moles na cama onde esperam sem sono; deixo ao que fazem os que conversam nas salas, de onde as músicas e as vozes chegam cômodas até mim. Sento-me à porta e embebo meus olhos e ouvidos nas cores e nos sons da paisagem, e canto lento, para mim só, vagos cantos que componho enquanto espero.

Para todos nós descerá a noite e chegará a diligência. Gozo a brisa que me dão e a alma que me deram para gozá-la, e não interrogo mais nem procuro. Se o que deixar escrito no livro dos viajantes puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também.


Os signos e a lâmpada

Quantos arianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Apenas um, mas serão necessários muitas lâmpadas.

Quantos taurinos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Nenhum: taurinos não gostam de mudar nada.

Quantos geminianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Dois (é claro). Vai durar o fim de semana inteiro, mas quando estiver pronto, a lâmpada vai fazer o serviço da casa, falar francês e ficar da cor que você quiser.

Quantos cancerianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Somente um, mas levará três anos para um terapeuta ajudá-lo a passar pelo processo.

Quantos leoninos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Um leonino não troca lâmpadas, a não ser que ele segure a lâmpada e o mundo gire em torno dele.

Quantos virginianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Vamos ver: um para girar a lâmpada, um para anotar quando a lâmpada queimou e a data em que ela foi comprada; outro para decidir de quem foi a culpa da lâmpada ter sido queimada e perguntar; dez para decidir como remodelar a casa enquanto o resto troca a lâmpada...

Quantos librianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Bom, na realidade, eu não sei. Acho que depende de quando a lâmpada foi queimada. Talvez só um, se for uma lâmpada comum, mas talvez dois se a pessoa não souber onde encontrar uma lâmpada, ou...

Quantos escorpianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Mas quem quer saber? Por que " você " quer saber? Você é policial?

Quantos sagitarianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- O sol está brilhando, está cedo, nós temos a vida inteira pela frente e você está preocupado em trocar uma lâmpada estúpida?

Quantos capricornianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Nenhum. Capricornianos não trocam lâmpadas - a não ser que seja um negócio lucrativo.

Quantos aquarianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- Vão aparecer centenas, todos competindo para ver quem será o único a trazer a luz ao mundo.

Quantos piscianos são necessários para trocar uma lâmpada?
- O quê? A luz está apagada?

segunda-feira, 19 de março de 2012

Angel of the morning

                                    Chip Taylor


There'll be no strings to bind your hands
not if my love can't bind your heart.
And there's no need to take a stand
for it was I who chose to start.
I see no need to take me home,
I'm old enough to face the dawn.

Just call me angel of the morning, angel
just touch my cheek before you leave me, baby.
Just call me angel of the morning, angel
then slowly turn away from me.

Maybe the sun's light will be dim
and it won't matter anyhow.
If morning's echo says we vw sinned,
well, it was what I wanted now.
And if we're the victims of the nignt,
I won't be blinded by light.

Just call me angel of the morning, angel
just touch my cheek before you leave me, baby.
Just call me angel of the morning, angel
then slowly turn away,
I won't beg you to stay with me
through the tears of the day,
of the years, baby baby baby.
Just call me angel of the morning, angel
just touch my cheek before you leave me , baby.


Não existirão cordas para amarrar suas mãos,
Não se meu amor não puder amarrar seu coração.
Não há necessidade de tomar uma atitude,
Porque fui eu que escolhi começar.
Eu não vejo necessidade de me levar para casa,
Sou velho o suficiente para enfrentar o amanhecer.

Apenas me chame de anjo da manhã, anjo
Apenas toque minha face antes de me deixar, menino.
Apenas me chame de anjo da manhã, anjo
Então lentamente afaste-se de mim.

Talvez a luz do sol esteja embaçada
E isso não vai importar, de qualquer modo.
Se o eco da manhã disser que nós pecamos,
Bem, era o que eu queria neste momento.
E se nós formos vítimas da noite,
Eu não serei ofuscado pela luz.

Apenas me chame de anjo da manhã, anjo
Apenas toque em minha face antes de me deixar, menino.
Apenas me chame de anjo da manhã, anjo.
Então, lentamente afaste-se...
Eu não te pedirei para ficar comigo,
Em meio às lágrimas do dia, dos anos, menino.

Apenas me chame de anjo da manhã, anjo
Apenas toque em minha face antes de me deixar, menino.
Apenas me chame de anjo da manhã, anjo
Apenas toque em minha face antes de me deixar, querido.

Apenas me chame de anjo da manhã, anjo.
Apenas toque em minha face antes de me deixar, querido.

Esta é outra canção estrangeira que fez parte da minha adolescência e que ainda hoje me é muito importante.
Busquei a letra e a tradução e confirmei a sua beleza. Bela voz a da cantora, Juice Newton. A música é de 1981.

domingo, 18 de março de 2012

Tornerai Tornerò

                      Pareti/ Vecchioni/ Wermar

La piazzetta del mercado e'ancora là,
Le magliette sono uguali a un anno fa
Mi ricordo che, la volevi tu
Quella con " ti amo " scritto su

Con gli amici passo il tempo solo un po'
E se chiedono ridendo con chi sto
Io rispondo che, amo sempre te
Che da un momento all'altro arriverai

Tornerai tornerò
Con il tempo non si può scommettere mai
E quello che succede non lo sai
Ti perdo ad ogni giorno sempre un po'

Tornerai tornerò
Ridicolo pensarci amore mio
Al primo incontro è stato già un addio
Tornerai tornerò...

Ti ricordi il prato della ferrovia
Rotolavi sporca d'erba e di allegria
Erano le sei, io ti ho chiesto; " vuoi? "
Poi cantavi nel venire via
Tornerai Tornerò...


A praça do mercado ainda está lá
As camisas ainda são as mesmas de há um ano
Eu me lembro que você queria
A única escrita " eu te amo "

Com os amigos eu passo um pouco do tempo
E se perguntar como estou indo
Eu respondo que te amo para sempre
Que a qualquer momento você vai chegar

Você vai voltar, vai voltar?
Com o tempo, você não pode apostar nunca
E você não sabe o que acontece
Te perco um pouco mais a cada dia

Você vai voltar, vai voltar?
Ridículo pensar sobre o meu amor
No primeiro encontro já foi um adeus

Você vai voltar, vai voltar?
Recordo do gramado da ferrovia
Rolamos de alegria na grama suja
Era seis e eu perguntei: você quer?
Depois saímos cantando pela rua

Acho que esta canção foi o meu primeiro contato com a música estrangeira; não me lembro como foi que a ouvi; eu não entendia nada, mas meu inconsciente já sabia de minha ascendência italiana... não sei ao certo, mas esta música deve ser de 1975 ou 1976. Um quarteto masculino chamado Homo Sapiens interpretava a canção.

sábado, 17 de março de 2012

Aula de sociologia política para crianças

- Pai, eu preciso fazer um trabalho para a escola. Posso te fazer uma pergunta?
- Claro, meu filho. Qual é a pergunta?
- O que é política, pai?
- Bem... Política envolve:
1- Povo

2- Governo

3- Poder Econômico

4- Classe Trabalhadora

5- Futuro do país

- Não entendi. Dá pra explicar?
- Bem, vou usar a nossa casa como exemplo:
- Sou eu quem traz dinheiro para casa. Então, eu sou o poder econômico.
  Sua mãe administra, gasta o dinheiro. Então ela é o governo.
  Como nós cuidamos das suas necessidades, você é o povo.
  Seu irmãozinho é o futuro do país e a Zefinha, a babá dele, é a classe trabalhadora.
- Entendeu, filho?
- Mais ou menos, pai. Vou pensar!

Naquela noite, acordado pelo choro do irmão neném, o menino foi ver o que havia de errado. Descobriu que o neném tinha sujado a fralda e estava todo emporcalhado. Foi ao quarto dos pais e sua mãe estava num sono muito pesado. Foi ao quarto da babá e viu, através da fechadura, o pai na cama transando com ela. Como os dois nem percebiam as batidas que o menino dava na porta, ele voltou para o quarto e dormiu. 
Na manhã seguinte, na hora do café, ele falou para o pai:
- Pai, agora acho que entendi o que é política.
- Ótimo, meu filho! Então me explica com suas palavras.
- Bom, pai, acho que é assim:
- Enquanto o poder econômico fode a classe trabalhadora, o governo dorme profundamente. O povo é totalmente ignorado e o futuro do país fica na merda...

Sabe o que é o amor??

" O amor não é algo que o faz sair do chão e o transporta para lugares que você nunca viu. "
O nome disso é avião. O amor é outra coisa.

" O amor não é uma coisa que você esconde dentro de si e não mostra para ninguém. "
Isso se chama vibrador tailandês de três velocidades. O amor é outra coisa.

" O amor não é uma coisa que te faz perder a respiração e a fala. "
O nome disso é bronquite asmática. O amor é  outra coisa.

" O amor não é uma coisa que chega de repente e o transforma em refém. "
Isso se chama sequestrador. O amor é outra coisa.

" O amor não é uma coisa que voa alto no céu e deixa sua marca por onde passa. "
Isso se chama pombo com caganeira. O amor é outra coisa.

" O amor não é uma coisa que você pode prender ou botar pra fora de casa quando bem entender. "
Isso se chama cachorro. O amor é outra coisa.

" O amor não é uma coisa cinza que lançou uma luz sobre ti, o levou pra ver estrelas e o trouxe de volta com algo dele dentro de você. " Isso se chama alienígena. O amor é outra coisa.

" O amor não é uma coisa que desapareceu e que, se encontrado, poderia mudar o que está diante de você. " Isso se chama controle remoto da TV. O amor é outra coisa.

O japonês bom de História

Suzuki, o garoto japonês craque em História.

No primeiro dia de aulas numa escola secundária dos EUA, a professora apresentou aos alunos um novo colega, Sakiro Suzuki, do Japão.
A aula começa e a professora:
- Vamos ver quem conhece a história americana.
- Quem disse: " Dê-me a liberdade ou a morte? "
Silêncio total na sala.
Então Suzuki levanta a mão e diz:
- Patrick Henry em 1775 em Filadélfia.
- Muito bem, Suzuki. E quem disse: " O estado é o povo, e o povo não pode afundar-se? "
Suzuki:
- Abrahan Lincoln em 1863 em Washington.
A professora olha os alunos e diz:
- Vocês não têm vergonha? Suzuki é japonês e sabe mais sobre a história americana que vocês!
Então, ouve-se uma voz baixinha, lá no fundo:
- Vai tomar no cu, japonês de merda!
Mas a professora ouviu.
- Quem foi?, grita a professora.
Suzuki levanta a mão e, sem esperar, responde:
- General McArthur em 1942 em Guadalcanal, e Lee Iacocca em 1982 na Assembleia Geral da Chrysler.
A turma fica supersilenciosa, apenas ouve-se do fundo da  sala:
- Acho que vou vomitar.
A professora grita:
- Quem foi?
E Suzuki:
- George Bush (pai) ao Primeiro-Ministro Tanaka durante um almoço, em Tókio, em 1991.
Um dos alunos grita:
- Chupa o meu pau!
E a professora irritada:
- Acabou-se! Quem foi agora?
E Suzuki, sem hesitações:
- Bill Clinton a Mônica Lewinsky, na Sala Oval da Casa Branca, em Washington, em 1997.
E outro aluno se levanta e grita:
- Suzuki é uma merda!
E Suzuki responde:
- Valentino Rossi no Grande Prêmio de Moto no Rio de Janeiro em 2002.
A turma fica histérica, a professora desmaia, a porta se abre e entra o diretor, que diz:
- Que merda é essa? Nunca vi uma confusão dessas! "
Suzuki:
- Lula para o ministro da Casa Civil, José Dirceu, após as denúncias de corrupção do assessor Waldomiro Diniz, em fevereiro de 2004, em Brasília.

"Foda-se"

                  Millor Fernandes

O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se" que  ela fala. Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"?? O "foda-se" aumenta minha autoestima, me torna uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas. Me liberta. " Não quer sair comigo? Então foda-se! ". " Vai querer decidir essa merda sozinho mesmo? Então foda-se! ". O direito ao " foda-se " deveria estar assegurado na Constituição Federal. Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo fazendo sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia. " Pra caralho ", por exemplo. Qual expressão traduz melhor a ideia de muita quantidade do que " Pra caralho "? " Pra caralho " tende ao infinito, é quase uma expressão matemática. A Via-Láctea tem estrelas pra caralho, o Sol é quente pra caralho, o universo é antigo pra caralho, eu gosto de cerveja pra caralho, entende?

No gênero do " Pra Caralho ", mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso " Nem Fodendo! ". O " Não, não é não! " é tão pouco ou nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade " Não, absolutamente não! " o substituem.
O " Nem Fodendo " é irretorquível  liquida o assunto. Te libera, com a consciência tranquila, para outras atividades de maior interesse em sua vida. Aquele filho pentelho de 17 anos te atormenta pedindo o carro pra ir surfar no litoral? Não perca sua paciência. Solte logo um definitivo " Marquinhos, presta atenção, filho querido, Nem Fodendo! " . O impertinente se manca na hora e vai pro Shopping se encontrar com a turma numa boa e você fecha os olhos e volta a curtir o CD do Lupicínio.

Por sua vez, o " Porra Nenhuma! " atendeu tão plenamente às situações onde nosso ego exigia não só a definição de uma negação, mas também o justo escárnio contra descarados blefes, que hoje é totalmente impossível imaginar que possamos viver sem ele em nosso cotidiano profissional. Como comentar a gravata daquele chefe idiota senão com um " é PHD porra nenhuma! ", ou " ele redigiu aquele relatório sozinho porra nenhuma! ".
O " porra nenhuma ", como vocês podem ver, nos prove sensações de incrível bem estar interior. É como se estivessem os fazendo a tardia e justa denúncia pública de um canalha. São dessa mesma gênese os clássicos " aspone ", " chepone ", " repone " e mais recentemente, o " prepone " - presidente de porra nenhuma.

Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um " Puta-que-pariu! ", ou seu correlato " Puta-que-o-pariu! ", falados assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba... Diante de uma notícia irritante qualquer um " puta-que-o-pariu " dito assim te coloca outra vez em seu eixo. Seus neurônios têm o devido tempo e clima para se reorganizar e sacar a atitude que lhe permitirá dar um merecido troco ou o safar de maiores dores de cabeça.

E o que dizer de nosso famoso " vai tomar no cu "? E sua maravilhosa e reforçadora " vai tomar no olho do seu cu "? Já imaginou o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta: " Chega! vai tomar no olho do seu cu ". Pronto, você retomou as rédeas de sua vida, sua autoestima. Desabotoa a camisa e sai na rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor-íntimo nos lábios.

E seria tremendamente injusto não registrar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: " Fodeu ". E sua derivação mais avassaladora ainda: " Fodeu de vez! ". Você conhece a definição mais exata, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação? Expressão, inclusive, que uma vez proferida insere seu autor em todo um providencial contexto interior de alerta e autodefesa. Algo assim como quando você está dirigindo bêbado, sem documentos do carro e sem carteira de habilitação e ouve uma sirene de polícia atrás de você mandando você parar: O que você fala? " Fodeu de vez! ".

Liberdade, Igualdade, Fraternidade e Foda-se!!!


segunda-feira, 12 de março de 2012

Trecho de Rubem Alves

As coisas do mundo humano apresentam uma curiosa propriedade. Já sabemos que elas são diferentes daquelas que constituem a natureza. A existência da água e do ar, a alternância entre o dia e a noite, a composição do ácido sulfúrico e o ponto de congelamento da água em nada dependem da vontade do homem. Ainda que ele nunca tivesse existido, a natureza estaria aí, passando muito bem, talvez melhor... Com a cultura, as coisas são diferentes. A transmissão da herança, os direitos sexuais dos homens e das mulheres, atos que constituem crimes e castigos que são aplicados, os adornos, o dinheiro, a propriedade, a linguagem, a arte culinária, tudo isto surgiu da atividade dos homens. Quando os homens desaparecerem, estas coisas desaparecerão também.

Aqui está a curiosa propriedade a que nos referimos: nós nos esquecemos de que as coisas culturais foram inventadas e que, por esta razão, elas aparecem aos nossos olhos como se fossem naturais. Na gíria filosófica-sociológica este processo recebe o nome de reificação. Seria mais fácil se falássemos em coisificação, pois é isto mesmo que a palavra quer dizer, já que ela deriva do latim res, rei, que quer dizer " coisa ". Isto acontece, em parte, porque as crianças, ao nascerem, já encontram um mundo social pronto, tão pronto e tão sólido quanto a natureza. Elas não viram este mundo saindo das mãos dos seus criadores, como se fosse cerâmica recém moldada nas mãos do oleiro. Além disto, as gerações mais velhas, interessadas em preservar o mundo frágil por elas construído com tanto cuidado, tratam de esconder dos mais novos, inconscientemente, a qualidade artificial (e precária) das coisas que estão aí. Porque, caso contrário, os jovens poderiam começar a ter ideias perigosas... De fato, se tudo o que constitui o mundo humano é artificial e convencional, então este mundo pode ser abolido e refeito de outra forma. Mas quem se atreveria a pensar pensamentos como este em relação a um mundo que tivesse a solidez das coisas naturais?

Isto se aplica de maneira peculiar aos símbolos. De tanto serem repetidos e compartilhados, de tanto serem usados, com sucesso, à guisa de receitas, nós os reificamos, passamos a a tratá-los como se fossem coisas. Todos os símbolos que são usados com sucesso experimentam esta metamorfose. Deixam de ser hipóteses da imaginação e passam a ser tratados como manifestações da realidade. Certos símbolos derivam o seu sucesso do seu poder para congregar os homens, que os usam para definir sua situação e articular um projeto comum de vida. Tal é o caso das religiões, das ideologias, das utopias. Outros se impõem como vitoriosos pelo seu poder para resolver problemas práticos, como é o caso da magia e da ciência. Os símbolos vitoriosos, e exatamente por serem vitoriosos, recebem o nome de verdade, enquanto que os símbolos derrotados são ridicularizados como superstições ou perseguidos como heresias.