segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

21. A Língua Portuguesa é machista

Sobre as relações entre Língua e sociedade, especialistas asseveram que as Línguas são o espelho, o reflexo, espécie de extensão, das estruturas sociais e culturais. Assim, se a sociedade é marcadamente machista também a Língua o seria. Isso explicaria o fato de a maioria dos palavrões da nossa Língua ter nomes femininos: filho de uma égua; filho da puta; vaca; galinha, etc. Defender a existência de uma linguagem sexista nas regras de concordância, em textos ou dicionários, revela o equívoco de confundir gênero gramatical com aspectos ou opções sexuais dos indivíduos. Todos os nomes da Língua (substantivos, adjetivos) possuem gênero gramatical, mas só alguns significam seres que têm gênero sexual.

O que falar então de um enunciado como "O batente e a porta são produzidos com a mesma madeira de reflorestamento'? O fato de o particípio ser grafado "produzidos", e não "produzidas", indicaria machismo? A resposta positiva implicaria que estamos considerando que o batente, além de ser do gênero gramatical masculino, é tomado como se fosse o macho da porta. O que é um absurdo.


Texto de Roberto Leiser Baronas. Ele é doutor em Linguística e Língua Portuguesa. Professor-adjunto do Departamento de Letras e do Programa de Pós-Graduação em Linguística da UFSCar.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

20. Se mudarmos as palavras, muda a sociedade.

Esse mito sustenta as iniciativas politicamente corretas de limpeza da linguagem de toda ordem de preconceitos sociais. A substituição de palavras marcadas por não marcadas ideologicamente acabaria com os preconceitos.

A correção política depende do tipo de conversação que uma sociedade acredita caber em seu meio. Na vida urbana impessoal, as relações tendem, a ser pautadas não tanto pelos contatos familiares e estreitos, em que a rede de recriminações é tão densa quanto mediada pelos afetos das relações diretas.

Os contatos são marcados por graus de separação, em que o sujeito ao lado é um desconhecido a que somos indiferentes, ante o qual nos sentimos constrangidos, quando não ameaçados, e contra o qual devemos reagir de forma cirúrgica e preventiva. Ante o outro, o rigor da lei, não o desafio do contato. Sendo obrigação ditada de fora, há quem duvide que a correção política vire uma conduta ética sincera. Formas sutis ou rasteiras de discriminação, no entanto, independem da assepsia das palavras. O máximo que farão é colocar em dúvida a nossa capacidade social para o debate.


Mitos Ideológicos, 100 Mitos, texto de Luiz Costa Pereira Júnior retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

sábado, 28 de dezembro de 2024

Servir e Marchar (52)

 "Portanto, tornai a levantar as mãos cansadas e os joelhos desconjuntados." - Paulo. (HEBREUS, 12:12.)


Se é difícil a produção de fruto sadio na lavoura comum, para que não falte o pão do corpo aos celeiros do mundo, é quase sacrificial o serviço de aquisição dos valores espirituais que significam o alimento vivo e imperecível da alma.

Planta-se a semente da boa-vontade, mas obstáculos mil lhe prejudicam a germinação e o crescimento.

É a aluvião de futilidades da vida inferior.

A invasão de vermes simbolizados nos aborrecimentos de toda sorte.

A lama da inveja e do despeito.

As trovoadas da incompreensão.

Os granizos da maldade.

Os detritos da calúnia.

A canícula da responsabilidade.

O frio da indiferença.

A secura do desentendimento.

O escalracho da ignorância.

As nuvens de preocupações.

A poeira do desencanto.

Todas as forças imponderáveis da experiência humana como que se conjugam contra aquele que deseja avançar no roteiro do bem.

Enquanto não alcançarmos a herança divina a que somos destinados, qualquer descida é sempre fácil...

A elevação, porém, é obra de suor, persistência e sacrifício.

Não recues diante da luta, se realmente já podes interessar o coração nos climas superiores da vida.

Não obstante defrontado por toda a espécie de dificuldades, segue para a frente, oferecendo ao serviço da perfeição quanto possuas de nobre, belo e útil.

Recorda o conselho de Paulo e não te  imobilizes.

Movimenta as mãos cansadas para o trabalho e ergue os joelhos desconjuntados, na certeza de que para a obtenção da melhor parte da vida é preciso servir e marchar, incessantemente.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.

sábado, 21 de dezembro de 2024

Sepulcros Abertos (51)

 "A sua garganta é um sepulcro aberto." - Paulo. (ROMANOS, 3:13.)


Reportando-se aos espíritos transviados da luz, asseverou Paulo que têm a garganta semelhante a sepulcro aberto e, nessa imagem, podemos emoldurar muitos companheiros, quando se afastam da Estrada Real do Evangelho para os trilhos escabrosos do personalismo delinquente.

Logo instalam no império escuro do "eu", olvidando as obrigações que nos situam no Reino Divino da Universalidade, transfigura-se-lhes a garganta em verdadeiro túmulo descerrado. Deixam escapar todo o fel envenenado que lhes transborda do íntimo, à maneira dum vaso de lodo, e passam a sintonizar, exclusivamente, com os males que ainda apoquentam vizinhos, amigos e companheiros.

Enxergam apenas os defeitos, os pontos frágeis e as zonas enfermiças das pessoas de boa-vontade que lhes partilham a marcha.

Tecem longos comentários no exame de úlceras alheias, ao invés de curá-las.

Eliminam precioso tempo em palestras compridas e ferinas, enegrecendo as intenções dos outros.

Sobrecarregam a imaginação de quadros deprimentes, nos domínios da suspeita e da intemperança mental.

Sobretudo, queixam-se de tudo e de todos.

Projetam emanações entorpecentes de má-fé, estendendo e desânimo e a desconfiança contra a prosperidade da santificação, por onde passam, crestando as flores da esperança e aniquilando os frutos imaturos da caridade.

Semelhantes aprendizes, profundamente desventurados pela conduta a que se acolhem, afiguram-se-nos, de fato, sepulcros abertos...

Exalam ruínas e tóxicos de morte.

Quando te desviares, pois, para o resvaladiço terreno das lamentações e das acusações, quase sempre indébitas, reconsidera os teus passos espirituais e recorda que a nossa garganta deve ser consagrada ao bem, pois só assim se expressará, por ela, o verbo sublime do Senhor.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.


domingo, 15 de dezembro de 2024

A História de Adônis

A história do senhor e amado da grande Deusa do Amor estava ligada - entre nós, e presumivelmente também nos países orientais, onde foi adotada, na Síria, em Chipre e na Ásia Menor - à história de uma árvore, aquele arbusto árabe cuja goma extremamente fragrante os povos da Antiguidade prezavam acima de todas as suas seivas solidificadas. À goma dava-se o nome de "mirra" ou "esmirra".

A história continua dizendo que Mirra (ou Esmirra) era filha de um rei; filha do rei do Líbano, ou do rei Cíniras de Chipre, fundador de Pafo - ou, variamente, filha de outros reis. Mirra apaixonou-se mortalmente pelo pai. ) Várias razões foram aventadas para isso: a cólera do deus-sol, ou a cólera de Afrodite. Supõe-se que Mirra achava seus cabelos mais bonitos que os da deusa; e existem outras histórias semelhantes.) A filha conseguiu enganar o pai, ou embebedá-lo - ocorrência também encontrada numa história bíblica. Dormiu com ele, como uma rapariga desconhecida, por doze noites, ou menos. Afinal, o pai descobriu, mercê de uma lâmpada escondida, quem era sua companheira de cama e saiu em perseguição dela com a espada desembainhada. Mirra já concebera um filho desse amor proibido e estava cheia de vergonha. Suplicou aos deuses que não a deixassem estar em parte nenhuma, nem entre os vivos nem entre os mortos. Alguma divindade, possivelmente Zeus e Afrodite, compadeceu-se e ela foi transformada na árvore que chora o seu fruto em goma picante, o fruto da madeira: Adônis. Pois ele, o futuro amante de Afrodite, nasceu da casca rachada da árvore da mirra.

Adônis era tão belo, tão belo que, logo que nasceu, Afrodite escondeu a criança numa arca e deu-a a Perséfone para guardá-la em lugar seguro. A rainha do Mundo Subterrâneo abriu a arca, viu o menino e nunca mais quis devolvê-lo. A disputa entre as duas deusas foi levada à presença de Zeus. O rei dos deuses dividiu a posso de Adônis da seguinte maneira: durante uma terça parte do ano ele moraria sozinho; durante uma terça parte, com Perséfone; e durante uma terça parte, com Afrodite. Sobre a morte de Adônis, que todos os anos o levava para Perséfone, no Mundo Subterrâneo, dizia-se comumente que ele fora ferido por um javali enquanto caçava. Correu-lhe o sangue, e o riacho Adônis, no Líbano, passou a fluir vermelho. Imagina-se que Ártemis ou Ares mandou o javali contra o mancebo. Afrodite viu-se assim obrigada a prantear Adônis antes de poder realmente possuí-lo. Os festivais em que o seu deplorável amor era celebrado foram realizados em comemoração ao dia em que a deusa do amor se separou do seu jovem senhor. Ele jazia ali mortalmente ferido, amado e pranteado por Afrodite. Debalde tentou ela retê-lo. No dia seguinte, ele librou-se para longe no mar e no ar. Costumava dizer, todavia, que ele ainda estava vivo. As mulheres lhe trouxeram pequenos "jardins" - expressão simbólica e pitoresca, comum em nossa Língua, como em outras, para indicar-lhes a  própria feminilidade. Nos santuários orientais, entregavam-se a estrangeiros. Quem não fizesse teria, pelo menos, de sacrificar os cabelos a Adônis.


Texto de Karl Kerényi retirado do livro Os Deuses Gregos, Editora Cultrix, São Paulo, 1998.

sábado, 14 de dezembro de 2024

Avancemos (50)

 "Irmãos, quanto a mim, não julgo que haja alcançado a perfeição, mas uma coisa faço, e é que,  esquecendo-me das coisas que atrás ficam, avanço para as que se encontram diante de mim." - Paulo. (FILIPENSES, 3:13 e 14.)


Na estrada cristã, somos defrontados sempre por grande número de irmãos que se aquietam à sombra da improdutividade, declarando-se acidentados por desastres espirituais.

É alguém que chora a perda de um parente querido, chamado à transformação do túmulo.

É o trabalhador que se viu dilacerado pela incompreensão de um amigo.

É o missionário que se imobilizou à face da calúnia.

É alguém que lastima a deserção de um consórcio da boa luta.

É o operário do bem que clama indefinidamente contra a fuga da companheira que lhe não percebeu a dedicação afetiva.

É o idealista que espera uma fortuna material para dar início às realizações que lhe competem.

É o cooperador que permanece na expectativa do emprego ricamente remunerado para consagrar-se às boas obras.

É a mulher a que se enrola no cipoal da queixa contra os familiares incompreensivos.

É o colaborador que se escandaliza com os defeitos do próximo, congelando as possibilidades de servir.

É alguém que deplora um erro cometido, menosprezando as bênçãos do tempo em remorso destrutivo.

O passado, porém, se guarda as virtudes da experiência, nem sempre é o melhor condutor da vida para o futuro.

É imprescindível exumar o coração de todos os envoltórios entorpecentes que, por vezes, nos amortalham a alma.

A contrição, a saudade, a esperança e o escrúpulo são sagrados, mas não devem representar impedimento ao acesso de nosso espírito à Esfera Superior.

Paulo de Tarso, que conhecera terríveis aspectos do combate humano, na intimidade do próprio coração, e que subiu às culminâncias do apostolado com o Cristo, nos oferece roteiro seguro ao aprimoramento.

"Esqueçamos todas as expressões inferiores do dia de ontem e avancemos para os dias iluminados que nos esperam" - eis a essência de seu aviso fraternal à comunidade de Filipos.

Centralizemos nossas energias em Jesus e caminhemos para diante.

Ninguém progride sem renovar-se.


Texto retirado do livro Fonte VivaFrancisco Cândido Xavier pelo Espírito Emmanuel, FEB, Brasília, 1987.

domingo, 8 de dezembro de 2024

19. Os jovens leem menos do que antigamente

O mito de uma Idade de Ouro da linguagem acompanha cada geração. A ideia geral é a de que os jovens já não possuem mais tanto apego aos livros quanto em outras épocas. Educadores praguejam contra a relutância juvenil em encarar obras literárias mais densas.

Embora não haja uma pesquisa comparativa entre índices de leitura em épocas diferentes, ferramentas da internet e sucessos editoriais como Harry Potter - com volumes de até 700 páginas - desmentem o mito geracional. A forma de comunicação usada na era digital se baseia na palavra escrita mais do que na falada, e, apesar de a imagem e o vídeo serem grande parte dessas novas mídias, a sua força se encontra na escrita.

Estudiosos duvidam que haja indício de "perda" de interesse geracional por obras literárias de fôlego. E se as gerações anteriores tinham maior capacidade de realizar uma leitura em profundidade, as novas gerações "compensam" o processo com uma capacidade maior de absorção de dados de leitura simultâneos e em menor tempo.


Texto de Evanildo Bechara. Gramático e imortal da ABL.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.

18. Gírias e linguagem tribal são formas de exclusão

Há grupos que, por meio de gírias e linguagem tribal, parecem dispensar a intenção corrente da sociedade. Especialistas acreditam, no entanto, que ao serem absorvidos pelo mercado de trabalho, esses grupos voltam a ela, pois são obrigados a interagir num campo em que suas formas de falar e interagir são desconhecidas ou não se aplicam. Ao mesmo tempo, a linguagem desses grupos tem "rejuvenescido" os ambientes de trabalho e demais espaços de interação da sociedade.


Texto de Evanildo Bechara. Gramático e imortal da ABL.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.



17. A geração atual não sabe falar e escrever direito

A ideia de que os jovens não sabem falar nem escrever de forma correta se intensificou com o receio disseminado pela propagação da internet. Mas não há constatação científica de que as crianças e os jovens não sejam tão bons em escrever comparados às gerações anteriores. Na verdade, é um equívoco confundir a transformação da Língua com "não saber escrever bem".


Texto de Evanildo Bechara. Gramático e imortal da ABL.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.


Mitos Culturais - 16. As mulheres falam demais

Ante a sugestão de que as mulheres falariam mais que os homens, as pesquisadoras canadenses Deborah James e Janice Drakich analisaram 63 estudos sobre a relação sexo-verborragia em diferentes contextos, nas últimas três décadas. As mulheres falaram mais do que os homens em apenas 2 levantamentos. Na Nova Zelândia, os homens dominam o tempo de discussão em rodas mistas de conversas. Cientistas da Universidade de Maryland (EUA), no entanto, encontraram no cérebro feminino uma proteína, FOXP2, responsável pela verborragia: uma mulher usa 20 mil palavras ao dia (na Língua Inglesa, claro); um homem, 7 mil. Outro estudo, da Universidade do Texas, sugere que a cota de palavras diárias dos dois sexos é a mesma, 16 mil palavras.


Texto de Evanildo Bechara. Gramático e imortal da ABL.

Mitos Ideológicos, 100 Mitos retirado da revista Língua Portuguesa, Ano 9, número 100, Fevereiro de 2014, Editora Segmento, São Paulo.