sexta-feira, 21 de agosto de 2020
A Lua
quinta-feira, 20 de agosto de 2020
Alexandre e Cesária
quarta-feira, 19 de agosto de 2020
As Formigas (A Conversa)
Conto de Luiz Vilela retirado do livro Contos da Infância e da Adolescência, Série Rosa dos Ventos, 1996.
terça-feira, 18 de agosto de 2020
O moço que não tinha nome
24 de Outubro
segunda-feira, 17 de agosto de 2020
Casas Amáveis
domingo, 16 de agosto de 2020
Minhas Queridas Formigas
Se eu esticasse o braço abriria aquela janela lá em frente. Uma vez abri, vi um casal se beijando na sala. Ela é muito bonita, está sempre recebendo visitas de rapazes.Os pais não sabem de nada, porque eles entram de noite, quando todo mundo está dormindo. Eu, que não durmo nunca, vejo tudo. Um deles, uma noite, ficou no meu portão esperando ela abrir a janela. Fiquei com pena del, mandei entrar para vigiar da minha janela. Ele gostou tanto, que quase me beijou a mão. Sou assim: gosto de ajudar gente desinteressada. Ele ficou na janela, perto de mim, um tempão. Cheguei a pensar que ele bem me serviria se tivesse formigueiro novo no meu quintal. Mas não tinha, coitado. Ele não pôde ser útil para mim, embora se tivesse oferecido muito para o que precisasse dele. Como a moça estava demorando a abri a janela, estiquei o meu braço todo-poderoso e abri. Tinha outro sujeito lá, com ela. Coitado do rapaz; foi-se embora, triste, nunca mais o vi por aqui. A moça nunca soube quem abrira a janela. Quando ela ia fugir com um tipo gordo e esquisito, eu soube, porque ouvira quando eles combinavam tudo naquela sala. Na noite em que ele parou o carro, quase em frente da minha casa, eu estiquei o braço e virei o carro. Depois, toquei fogo. Todo mundo da rua correu para ver o incêndio. Gostaram muito do espetáculo. Até eu bati palmas e ri à ufa. O sujeito gordo corria de uma parte para outra, a moça chorava e os pais dela gritavam feito loucos. Tinha muita gente na casa deles naquele dia. Parece que ela tinha marcado encontro com todos os rapazes que entravam pela sua janela, pois reconheci uns dez, que todos tinham ido para assistir à sua fuga com o gordo. Foi a maior festa a que a rua assistiu. Pena é que não tenham sabido que fora eu o autor da brincadeira. Não gosto de falar dessas coisas com desconhecidos; eles começam a fazer perguntas, a rir, trocam olhares de zombaria. Conheço bem essa gente. Meus olhos enxergam longe e quando quero vejo através das paredes. Quem vai acreditar nisto? Ninguém. Mas eu vejo. É só querer, que tenho que me concentrar um pouco. Quando precisei de saber o que estavam tramando contra mim, no dia em que desapareceu um garotinho louro, muito sujo, que andava por aí, eu me concentrei e ouvi tudo o que faziam e cochichavam contra mim, na sala ao lado do meu quarto. Estavam comentando que eu era louco, que eu não sabia o que fazia e bem que poderia ter matado o garoto. Outros diziam que eu era inofensivo, mas que devia ser examinado pelo doutor Samir Helou, que é muito mais louco do que eu, porque tem mania de automóveis e de velocidade. Eu nem não tenho carro nem gosto de correr. Gosto é de ficar aqui em casa, parado, pensando nas minhas queridas formigas. O garotinho tinha entrado porque não havia nenhum formigueiro invasor no meu quintal. Aposto que o doutor Samir nem tem formigueiro dele mesmo. Diabo, nem sempre posso ter formigueiro para mudar do meu terreno, e as minhas queridas formigas andavam bem alimentadas com um galo índio que eu tinha arranjado para elas. Se eu já tivesse a geladeira, vá lá, mas ficar com um menino a se estragar dentro de casa, ah, isto não! Então mandei que ele desse o fora. Ele correu pela porta da frente mesmo e nunca mais voltou. Que é que eu podia saber dele? Foi isso o que eu disse a eles, acrescentando que ouvira e vira o que eles andaram falando e fazendo na minha sala. Eles ficaram tão impressionados que deram o fora sem nem ao menos aceitar o cafezinho que eu lhes oferecera. Felizmente, porque eu não tinha café em casa. Aliás, eu nunca tive, porque não gosto de café; só tomo chá das folhas das minhas laranjeiras. Não é muito bom a gente andar por aí, mostrando que pode fazer certas coisas, porque aguça muito a curiosidade dos outros. Depois do que disse, foi o diabo para mim. A novidade correu asinha. deu de vir gente em minha casa todo dia, que quase fiquei doido. Todos querendo que eu adivinhasse futuro, que dissesse o que outras pessoas andavam fazendo ou pensando, em outros lugares. Quando eu simpatizava com as pessoas, fazia o que me pediam. Nunca erro quando me concentro. Quando eu não simpatizava, mandava voltar de noite, para usar nas formigas. Disse para o padeiro que a mulher dele tinha outro homem e ele viu que tinha mesmo. Eu adivinho de verdade. Agora tem vindo menos gente aqui, tem dia até que nem não vem ninguém. Eu soube que foi o Padre Pereira que andou proibindo e ameaçando todo mundo, só porque eu tinha curado um menino de uma doença que os médicos não conheciam e ainda fiz uma paralítica andar. Que é que tem fazer isso? Nunca nem não disse a ninguém que era santo, isso não. Nem não gosto de santos, detesto todos eles. São feitos de barro, não prestam para espantar nem para alimentar formigas. Só gosto de quem serve para essas coisas, que um dia pode ser útil para mim. Mas faço o que quero fazer e ninguém pode me impedir. Aquele padre não devia falar certas coisas de mim, que ele não me conhece. Fiquei não gostando dele. Se ele vier aqui, eu mostro para o que ele serve. Ele vai ver quem eu sou e do que eu sou capaz. Talvez até eu use ele num formigueiro novo. Pena é que o meu quintal ande tão cheio de ossos. As formigas nem não querem mais vir para aqui. É capaz até de não ter mais nenhuma, fora as minhas mesmo, porque o pedacinho de terra delas é sagrado. Lá eu não enterro nada. Ponho a carne por fora, com cascas de laranja, que assim elas gostam mais, depois que eu as habituei a gostar de carne. Mas tem de ser carne de bicho pequeno, que gente não serve.: cheira muito mal. Gente só serve para pôr embaixo da terra, para espantar formigas invasoras. Uma ou outra, quando se cuida bem, pode ser. A maioria não. Gente espanta as formigas e ainda aduba as minhas terras. Ah, ia me esquecendo disso! Ainda aduba as minhas terras! E quem gosta disso são as minhas queridas árvores, as minhas queridas árvores!
Conto de Anatole Ramos retirado do livro Antologia do Conto Goiano I - dos anos dez aos sessenta. Organizadoras: Darcy França Denófrio e Vera Maria Tietzmann Silva, CEGRAF/UFG, 2ª Edição, 1993.
sábado, 15 de agosto de 2020
A Bênção da Alegria
Todo o Evangelho de Jesus é uma constante canção de alegria, rica de esperanças e paz.
Medita nisso, pratica-o, e a tua existência se renovará, porque alegria é saúde e é vida.
Texto retirado do livro Momentos de Alegria. Divaldo Franco pelo espírito Joanna de Ângelis, Livraria Espírita Alvorada Editora, 4ª Edição, 2014.
sexta-feira, 14 de agosto de 2020
O Goleiro do Time
quinta-feira, 13 de agosto de 2020
Parque de Diversões
Alto, louro, olhar reto sobre a cabeça da multidão, ele estava ali, ao lado da motocicleta homicida, enquanto o alto-falante anunciava numa voz dramática: CAPITÃO TONY, O MAIOR ACRÓBATA DO SÉCULO! (e a voz dramática acentuava propositalmente a proparoxítona para acentuar o valor da acrobacia). Nós, pobres mortais solidários no medo de morrer, acotovelávamo-nos para melhor vê-lo, camisa aberta ao frio, culote e botas fixando pernas de músculos de pedra, que brincavam sobre a máquina, erguendo-a de súbito sobre as rodas traseiras, como um cavalo mecânico que empinasse. O motor tonitroava, falhava, tonitroava de novo, e o Capitão Tony imperturbável. Aquilo era apenas uma amostra. O resto se passaria dentro do pavilhão, se tivéssemos a coragem para entrar e o sangue-frio para não cerrar os olhos.
Entramos. O Capitão Tony tinha a certeza do próprio fascínio. Olhava-nos do alto do seu desprezo pela morte. E nós tremíamos. O espetáculo tardava. A tensão nervosa dos espectadores atingia o grau exato de tangibilidade para o grito. Soberbo, dentro da arena de madeira em que a máquina o esperava para o suicídio, o Capitão Tony passeava, calmo, fumando aquilo que nós todos supúnhamos ser o último cigarro de sua vida. Ele nos ignorava, simplesmente nos ignorava, e só o olhar duro, esverdeado e fixo, de quando em quando fuzilava os nossos olhos, que aplaudiam tímidos. Ele nos responsabilizava pela sua morte, era isso. Mas queria que aplaudíssemos. Se perdesse, porventura, a vida nesse ato, quanto teria rendido a função do globo da morte com as moedas que a excitação do público atiraria sobre um morto performático?... Os aplausos, certamente, se ouviriam até nos confins do mundo, onde, nesse mesmo instante, algum matador estava sendo atravessado pelos punhais vingativos de um touro agonizante, enquanto o povo, de polegares abaixados, exigia: OLÉ!
A música de fora do pavilhão havia parado. A voz dramática se calara. A essa altura, a bilheteria devia estar fechada e a morte do homem não valia mais um níquel. O cigarro sofreu a derradeira tragada e foi pisoteado como cabeça de cobra que perdera o bote. O Capitão subiu na motocicleta, depois dardejou um último olhar acusativo sobre nós, que, debruçados sobre a amurada protegida esperávamos excitadamente tensos. Alguém teve a ousadia de comentar: "É simples. Apenas uma questão de força da gravidade". Mas o motor da máquina já abalava os alicerces do pavilhão de madeira. Gritos abafados, ninguém queria dar parte de fraco. Simplesmente uma questão de gravidade, mas o que acontecia era que o Capitão Tony começava a brincar com as nossas mortes. A motocicleta desenfreava. Arrancava e subia vertiginosa, o home feito uma peça de engrenagem colada sobre o selim, robô incorporado à máquina que traçava sulcos invisíveis sobre as paredes concêntricas de madeira. Na vertigem, só o olhar esverdeado continuava fixo, acusando e agredindo. A morte descrevia círculos sobre ele. Mas o olhar continuava reto. E nós morríamos. Nós é que morríamos a cada volta da motocicleta, soluçando um perdão em covardia. E perguntando se desse ritmo se fizessem os Ulisses*, se dessa pobre carne louca se gerassem os Siegfrieds*, se dessa cavalgada no vazio se nutriram os Rolands* e os Cids*. Os campeões da imortalidade mítica: não o Capitão Tony, sem outras aventuras senão aquela, realíssima, ao redor da própria morte, operário de um circo sem alegria, herói espúrio de uma civilização sem epopeias.
* Ulisses, Siegfried, Roland, Cid - Heróis famosos de poemas épicos, respectivamente, das literaturas grega, alemã, francesa e espanhola.
Crônica de Ilka Brunhilde Laurito retirada do livro Parque de Diversões, Atual Editora, 1995. Coleção Transas & Tramas.