14 novembro 2025

Nota do Autor (A Linguagem dos Sentimentos)

Nossos sentimentos são nosso sexto sentido, o sentido que interpreta, organiza, dirige e resume os outros cinco. Os sentimentos nos dizem se o que estamos experimentando é ameaçador, doloroso, lamentável, triste ou alegre. Os sentimentos podem ser descritos e explicados de maneiras simples e diretas. Não há nada de místico ou mágico sobre eles. Os sentimentos formam uma linguagem bem própria. Quando os sentimentos falam, somos compelidos a ouvir - e às vezes a agir - mesmo que nem sempre compreendamos o porquê. Não estar cônscio dos sentimentos de alguém, não compreendê-los ou não saber como usá-los ou expressá-los é pior do que ser cego, surdo ou paralítico. Não sentir é não viver. Mais do que qualquer outra coisa, os sentimentos nos tornam humanos. Os sentimentos nos tornam todos parentes uns dos outros.

Os sentimentos são nossa reação ao que percebemos e, por sua vez, eles colorem e definem nossa percepção do mundo. Na verdade, os sentimentos são o mundo em que vivemos. Pelo fato de tanto do que sabemos depender de nossos sentimentos, ficando à mercê das ondas, em sentimentos confusos ou indistintamente percebidos, somos esmagados por um mundo confuso.

Ao escrever este livro, meu objetivo foi o de explicar a natureza dos sentimentos - o que eles significam, como funcionam, de onde procedem, e como compreendê-los e usá-los. A interpretação que aqui ofereço deriva tanto de meu treinamento e experiência na prática, assim como deriva de minha familiaridade comigo mesmo, de minha autocompreensão, a qual malgrado incompleta, está ainda promissoramente se desenvolvendo. Desenvolvendo minha perspectiva, mais tomei consciência de minhas próprias limitações, e tentei tomar o cuidado de fazer com que elas não se intrometessem. Não pretendo ter todas as respostas. Não obstante, adquiri um certo conhecimento dos sentimentos ao longo dos anos, e tentarei registrar estes vislumbres de uma maneira tão direta e simples quanto possível.

A linguagem dos sentimentos é a maneira pela qual nos relacionamos conosco mesmos, e se não podemos nos comunicar conosco mesmos, simplesmente não podemos nos comunicar com os outros. Como afirmei, percebemos o mundo através de nossos cinco sentidos. As impressões sensoriais desta maneira a nós retransmitidas precisam ser novamente integradas por cada um de nós. A maneira pela qual cada um de nós percebe - com qualquer um dos sentidos - varia mas não varia tanto quanto a maneira pela qual o mundo faz sentido. Este processo de integrar o mundo ao nosso próprio estilo é um processo mental básico. É também o processo criativo.

Nossos sentimentos são nossa reação ao que percebemos através dos sentidos e podem modelar nossa reação ao que experimentaremos no futuro. A pessoa que carrega consigo muita raiva não apaziguada, por exemplo, provavelmente achará o mundo que encontra também raivoso e, assim, justifica e perpetua seu próprio sentimento de raiva.

Acredito que isto sugere que em grande parte o mundo é criação da gente mesmo. Na verdade, o mundo está consideravelmente mais sob nossa influência do que a maioria de nós se dá conta. Quando a pessoa assume a responsabilidade por seus sentimentos, assume também responsabilidade por seu mundo. Compreender os sentimentos é a chave para o domínio de nós mesmos, para achar a verdadeira independência, que é atingir o único poder real digno de se ter. Se bem que esta ideia implica em que cada um de nós é responsável por si mesmo, ela também significa que muito existe que cada um de nós pode fazer para endireitar as peças desconjuntadas de sua vida para harmonizá-las. Verdadeiramente, desconfio que, se cada pessoa aceitasse a responsabilidade de pôr em ordem seu próprio mundo emocional, o mundo como um todo poderia também tornar-se mais real, mais harmonioso e, quiçá, mais pacífico.

Espero que este livro ajude a desfazer alguns dos mistérios dos sentimentos, que torne mais possível às pessoas reconhecerem e compreenderem o que sentem, que mostre onde provêm seus sentimentos e para onde eles estão indo, de forma que eles, os sentimentos, possam ser aliados nossos - em vez de serem inimigos nossos - no caminho de nosso natural progresso. Não proponho nenhuma maneira fulminante ou que esteja "na onda" para conseguir isto. O método básico é a compreensão, e espero que através dela todo leitor tenha uma nova consciência de si próprio.

Provavelmente, muito existe nestas páginas em que praticamente todo mundo já pensou ou, no mínimo, já sentiu antes. Este livro tenta dar uma certa ordem a isto e, por conseguinte, tenta ser mais útil - para mostrar uma linguagem dos sentimentos e, por isso, articular uma sintaxe das emoções.

À medida que a pessoa se abre mais em relação a seus sentimentos, menos necessidade existe de se guardar das coisas ameaçadoras do mundo, porque, em vez de se ocultar dos sentimentos, a pessoa aberta usa-os como um guia que interpreta o mundo que ela está experienciando. As pessoas que se apóiam tão somente em seu intelecto para descobrirem seu caminho pelo mundo, não têm a probabilidade de estarem em harmonia como as pessoas que também usam seus sentimentos. As realizações mais elevadas do homem não estão na precisão de sua ciência, mas na perfeição de sua arte. A arte humana é o louvor de seus sentimentos em seu ponto mais coerente.

A realidade não pode ser compreendida sem levarmos em conta os sentimentos. As abstrações do intelecto e do raciocínio são importantes, mas quando perdem contato com os sentimentos, abrem passagem para atos inumanos e destrutivos. Quando perdemos contato com nossos sentimentos, perdemos contato com nossas qualidades mais humanas. Vivendo em nossos sentimentos, estamos mais em contato, mais vivo. Parafraseando Descartes, nada mais verdadeiro do que "Sinto, logo sou".

Espero neste livro construir uma estrutura contra a qual o leitor possa examinar seus próprios sentimentos e sua vida. Assim fazendo, espero também oferecer um guia que permita aos sentimentos acharem sua expressão mais natural de um modo tanto quanto possível aceitável, e que no processo esses mesmos sentimentos tenham a melhor probabilidade de resolver os conflitos e de encorajar o crescimento. Podemos administrar nossos sentimentos de modo defensivo ou criador, aquele voltando-se para dentro de si mesmo, este num expressivo fluxo para fora do indivíduo.

Acredito que tudo isso seja realmente uma determinação muito grande, e que, quando muito, pode ser apenas incompletamente atingida. Espero que o leitor pegue as ideias e os métodos aqui sugeridos e os use como os vê para resolver os enigmas, para reunir os detalhes de sua própria experiência e, a partir daí, criar sua própria vida melhor, por si mesmo e para si mesmo.


Retirado do livro A Linguagem dos Sentimentos, de David Viscott, Summus Editorial, 16ª Edição, São Paulo, 1982.

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